sábado, 14 de junho de 2014

Entendimento do STJ diz que ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado o direito real de habitação

Íntegra do acórdão:
Acórdão: Recurso Especial n. 826.838- RJ.
Relator: Min. Castro Filho.
Data da decisão: 25.09.2006.
RECURSO ESPECIAL Nº 826.838 - RJ (2006⁄0047945-7)
RELATOR : MINISTRO CASTRO FILHO
RECORRENTE : ALEX CAETANO MOUSSE
ADVOGADO : MARILENA FEIJO DA FONSECA E OUTROS
RECORRIDO : MARISA ROSADO MOUSSE
ADVOGADO : MARIA LÚCIA RANGEL JANINI MONTENEGRO E OUTROS
EMENTA: RECURSO ESPECIAL. CIVIL. DIREITO REAL DE HABITAÇÃO. CÔNJUGE SOBREVIVENTE. CODIFICAÇÃO ATUAL. REGIME NUPCIAL. IRRELEVÂNCIA. RESIDÊNCIA DO CASAL. Segundo o artigo 1.831 do Código Civil de 2002, o cônjuge sobrevivente tem direito real de habitação sobre o imóvel em que residia o casal, desde que seja o único dessa natureza que integre o patrimônio comum ou particular do cônjuge falecido. Recurso não conhecido, com ressalva quanto à terminologia.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Humberto Gomes de Barros, Ari Pargendler, Carlos Alberto Menezes Direito e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 25 de setembro de 2006(Data do Julgamento)
MINISTRO CASTRO FILHO
Presidente e Relator
RECURSO ESPECIAL Nº 826.838 - RJ (2006⁄0047945-7)
RECORRENTE : ALEX CAETANO MOUSSE
ADVOGADO : MARILENA FEIJO DA FONSECA E OUTROS
RECORRIDO : MARISA ROSADO MOUSSE
ADVOGADO : MARIA LÚCIA RANGEL JANINI MONTENEGRO E OUTROS
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO FILHO: Trata-se de recurso especial interposto por ALEX CAETANO MOUSSE, com fundamento na alínea "a" do permissivo constitucional, em face do acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, assim ementado:
"Agravo de Instrumento - Matéria Sucessória - Comoriência - Usufruto - Direito Real Provisório.
- Tem, a viúva do falecido, o direito real sucessório provisório de usufruto no imóvel onde residia o casal.
Decisão confirmada."
Alegou o recorrente violação aos artigos 269, inciso I, e 1.676 do Código Civil de 1916; 8º, 1.228, caput, 1.659, inciso I, 1.784, 1.829, inciso I e 1.831 do Código atual, sustentando que a viúva não faz jus ao direito real de habitação, porquanto o imóvel de residência não integrava o patrimônio comum. Diz, ainda, que, por força do falecimento do cônjuge da recorrida, esta passou a ser proprietária de 95% (noventa e cinco por cento) do capital social de uma empresa e de terreno na cidade de Macaé, não estando desprovida dos meios de subsistência.
Contra-arrazoado, inadmitiu-se o recurso na origem, ascendendo os autos a esta Corte por força de agravo de instrumento.
É o relatório.
RECURSO ESPECIAL Nº 826.838 - RJ (2006⁄0047945-7)
RELATOR : MINISTRO CASTRO FILHO
RECORRENTE : ALEX CAETANO MOUSSE
ADVOGADO : MARILENA FEIJO DA FONSECA E OUTROS
RECORRIDO : MARISA ROSADO MOUSSE
ADVOGADO : MARIA LÚCIA RANGEL JANINI MONTENEGRO E OUTROS
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO FILHO: É de se observar, de início, que a decisão de primeiro grau afirmou que o objeto da presente demanda era "o único bem imóvel, destinado a residência do extinto casal." Por outro lado, o acórdão recorrido nada disse acerca da existência de outros bens ficados à recorrida, em decorrência do falecimento do seu cônjuge. Não houve oposição de embargos de declaração para que se esclarecesse a questão, cuja análise é inviável no âmbito do recurso especial, por força da Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça.
A controvérsia pode ser assim resumida: Colbert de Mello Mousse e Sônia Maria Caetano Mousse doaram apartamento a seu filho Colbert de Mello Mousse Júnior, casado em regime de comunhão parcial de bens com Marisa Rosado Mousse. Em trágico roubo, pais e filho foram assassinados. Caracterizada a comoriência e, diante do fato de que a doação fora feita com cláusulas de inalienabilidade e incomunicabilidade, concluiu o juízo de primeiro grau que o bem passou a integrar o patrimônio de Alex Caetano Mousse, único irmão de Colbert de Mello Mousse Júnior, afastando a sucessão da viúva quanto a ele, mas garantindo-se-lhe "o direito real sucessório provisório de usufruto no imóvel onde reside, enquanto perdurar a vida da beneficiária, deixando de existir no momento em que a sobrevivente passar a manter vida em comum com outra pessoa ou contrair matrimônio."
A sucessão foi aberta na vigência do atual Código Civil.
É necessário, ainda, destacar que não se está a discutir a condição de herdeira do cônjuge supérstite em relação ao imóvel de residência ou a sua meação, porquanto aspectos irrecorridos da decisão de primeiro grau, mas, apenas, a existência de direito real de habitação.
O referido instituto está previsto no artigo 1.831 do Código Civil:
"Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar."
A norma tem conteúdo social e visa resguardar a moradia do cônjuge supérstite, nos casos em que outros herdeiros passarão a ter a propriedade do imóvel de residência do casal, seja de forma integral ou parcial.
Ao contrário do que previa o artigo 1.611, § 1º, do Código Civil de 1916, que exigia o casamento em comunhão universal de bens, a codificação atual prevê o direito em qualquer regime nupcial. Sendo assim, conclui-se que não é mais condição para sua constituição integrar o bem o patrimônio comum do casal.
Dessa maneira, o dispositivo acima deve ser lido da seguinte forma: o cônjuge sobrevivente tem direito real de habitação sobre o imóvel em que residia o casal, desde que seja o único dessa natureza que integrasse o patrimônio comum ou o particular de cada cônjuge.
Ao ressaltar que a habitação se constitui "sem prejuízo da participação na herança", o legislador visou resguardar o direito na hipótese em que o cônjuge, por sucessão ou meação, se tornasse proprietário apenas de parte do imóvel, mesmo porque, se herdasse todo o bem, assumindo a propriedade plena, não haveria porque falar em constituição de direito real de habitação.
Outrossim, não se pode interpretar a norma no sentido de que, não tendo o cônjuge direito à meação ou à sucessão em relação ao imóvel, não fará jus à habitação, sob pena de se esvaziar a ratio essendi da norma.
A esse respeito:
"O direito de habitação concedido pelo novo sistema ao cônjuge sobrevivente é mais abrangente do que a hipótese do CC⁄1916 1.611, §2º. Não importa o regime de bens. Se na partilha não couber ao cônjuge, por inteiro ou por parte, o único bem a inventariar, de natureza residencial, onde possa habitar, esse direito lhe está garantido por este artigo."
(NERY JUNIOR, Nelson e Rosa Maria de Andrade Nery, Código Civil Comentado e legislação extravagante. 3ª edição. Ed. Revista dos Tribunais: São Paulo, 2005, p. 845).
No caso, o imóvel doado, embora não tenha integrado a comunhão parcial, efetivamente fazia parte do acervo particular de Colbert de Mello Mousse Júnior e era utilizado pelo casal para sua moradia, sendo o único bem dessa espécie.
A doutrina, por sua vez, com críticas, afirma que o artigo 1.831 do Código Civil não mais institui como causa de extinção do referido direito a união estável ou casamento do cônjuge, inclusive mencionando que há projeto de lei visando à modificação do dispositivo. No caso, entretanto, essa limitação foi imposta pelas instâncias ordinárias, sem que a recorrida interpusesse recurso, razão pela qual deve ser mantida, sob pena de reformatio in pejus.
Sendo assim, deve ser reconhecido o direito real de habitação à recorrida, nos termos deferidos pelas instâncias ordinárias.
Pelo exposto, não conheço do recurso especial, com ressalva quanto à terminologia.
É o voto.
MINISTRO CASTRO FILHO
Relator
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA
Número Registro: 2006⁄0047945-7 REsp 826838 ⁄ RJ
Números Origem: 20030011092020 200400214016 200513500154
PAUTA: 20⁄06⁄2006 JULGADO: 25⁄09⁄2006
Relator
Exmo. Sr. Ministro CASTRO FILHO
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro CASTRO FILHO
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. BRASILINO PEREIRA DOS SANTOS
Secretária
Bela. SOLANGE ROSA DOS SANTOS VELOSO
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : ALEX CAETANO MOUSSE
ADVOGADO : MARILENA FEIJO DA FONSECA E OUTROS
RECORRIDO : MARISA ROSADO MOUSSE
ADVOGADO : MARIA LÚCIA RANGEL JANINI MONTENEGRO E OUTROS
ASSUNTO: Civil - Sucessão - Inventário
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Humberto Gomes de Barros, Ari Pargendler, Carlos Alberto Menezes Direito e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 25 de setembro de 2006
SOLANGE ROSA DOS SANTOS VELOSO
Secretária

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