sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Segunda Seção do STJ definirá em recurso repetitivo quem tem legitimidade para responder por dívidas condominiais



O ministro Luis Felipe Salomão decidiu submeter à Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) recurso especial que discute quem tem legitimidade – vendedor ou adquirente – para responder por dívidas condominiais na hipótese de alienação da unidade, notadamente quando se tratar de compromisso de compra e venda não levado a registro.

O recurso foi submetido a julgamento do colegiado nos termos do artigo 543-C do Código de Processo Civil (recursos representativos de controvérsia repetitiva). Assim, todos os recursos que tratam da mesma questão jurídica ficam sobrestados no STJ, nos Tribunais de Justiça dos estados e nos Tribunais Regionais Federais até o julgamento do processo escolhido como representativo da controvérsia.

Após a definição do STJ no recurso repetitivo, não serão admitidos para julgamento na corte superior recursos que sustentem tese contrária.

Impenhorabilidade

No caso, o adquirente do imóvel recorre de decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), que, ao julgar seus embargos, entendeu que, com relação às cotas condominiais, quem responde é o imóvel, independentemente da demanda ser promovida contra o proprietário ou o adquirente.

O adquirente sustenta sua ilegitimidade passiva para responder pelas dívidas condominiais referentes à unidade onde reside, uma vez que, muito embora tenha sido objeto de instrumento de promessa não registrado, a ação de conhecimento foi ajuizada contra o promitente vendedor.

Dessa forma, o adquirente alega que o imóvel não poderia, somente em execução, sofrer penhora para solvência de débito reconhecido em ação da qual não foi parte.

O ministro Luis Felipe Salomão, ao submeter o julgamento do caso à Seção, ressaltou que há muitos recursos que chegam ao STJ sobre o tema em questão.

A notícia refere-se ao seguinte processo: REsp 1345331.

Fonte: STJ | 10/10/2014.

Não é possível o registro de contrato de locação com cláusula de vigência superior a um ano, em imóvel gravado com alienação fiduciária, sem a anuência do credor fiduciário.

O Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (CSM/SP) julgou a Apelação Cível nº 0065836-57.2013.8.26.0100, onde se decidiu ser impossível o registro de contrato de locação com cláusula de vigência superior a um ano, em imóvel gravado com alienação fiduciária, sem a anuência do credor fiduciário. O acórdão teve como Relator o Desembargador Hamilton Elliot Akel e o recurso foi, por maioria de votos, julgado improvido.

O apelante recorreu em face de sentença que julgou procedente a dúvida suscitada pelo Oficial Registrador, mantendo a recusa ao registro do mencionado contrato tendo em vista a falta de anuência expressa do credor fiduciário, prevista no art. 37-B da Lei nº 9.514/97. Em suas razões, o apelante sustentou, em síntese, que do instrumento de confissão de dívida e alienação fiduciária constou expressamente a descrição do imóvel, evidenciando a ciência do credor fiduciário quanto à alienação fiduciária. Afirmou, também, que a locação é anterior à alienação fiduciária e que seria impossível a obtenção da referida anuência, uma vez que, a fiduciante estaria em processo de decretação de falência, podendo o contrato ser abruptamente rescindido, caso não se consiga a anuência do credor fiduciário.

Ao analisar o recurso, o Relator entendeu que o registro do contrato de locação não pode ser admitido, sendo necessária a apresentação da anuência expressa do credor fiduciário. Ademais, mencionou que tal anuência não pode ser presumida pelo fato de o contrato de locação ser anterior à alienação fiduciária, mesmo porque, o contrato de locação sequer estava registrado ao tempo da constituição da garantia. Por fim, observou que o art. 37-B da Lei nº 9.514/97 é expresso ao considerar ineficaz e sem qualquer efeito, perante o fiduciário ou seus sucessores, a contratação ou a prorrogação de locação de imóvel alienado fiduciariamente por prazo superior a um ano, sem a concordância do credor fiduciário. No mesmo sentido, se manifestou o Desembargador Artur Marques da Silva Filho em declaração de Voto Convergente.

Em declaração de Voto Divergente, o Desembargador Ricardo Anafe entendeu que o recurso deve ser provido. Em seu voto, declarou que a anuência do credor fiduciário, prevista no citado art. 37-B, não é elemento de existência nem requisito de validade do contrato de locação, o qual existe, é válido e eficaz entre o locador e o locatário. Argumentou, ainda, que, feito o registro do contrato, este será eficaz, também, em relação a terceiros, com exceção do credor fiduciário e de seus sucessores, por não haver anuência expressa deste. Por fim, afirmou que, havendo a consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário, a extinção do contrato será inexorável, não obstante a cláusula de vigência. Assim, de acordo com o Desembargador, a anuência do credor fiduciário não interfere nos planos da existência, validade e eficácia do contrato entre locador e locatário, sendo o caso de se deferir o registro do contrato de locação nos moldes pleiteados.

Diante do exposto, por maioria de votos, negaram provimento ao recurso.

Fonte: IRIB.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Em ação que busque a rescisão de contrato de compra e venda de imóvel urbano, antes de afastar a indenização pelas benfeitorias ou acessões realizadas sem a obtenção de licença da prefeitura municipal (art. 34, parágrafo único, da Lei 6.766/1979), é necessário apurar se a irregularidade é insanável

Em ação que busque a rescisão de contrato de compra e venda de imóvel urbano, antes de afastar a indenização pelas benfeitorias ou acessões realizadas sem a obtenção de licença da prefeitura municipal (art. 34, parágrafo único, da Lei 6.766/1979), é necessário apurar se a irregularidade é insanável

De fato, o art. 34 da Lei 6.766/1979 (Lei Lehmann) disciplina em seu caput que "Em qualquer caso de rescisão por inadimplemento do adquirente, as benfeitorias necessárias ou úteis por ele levadas a efeito no imóvel deverão ser indenizadas, sendo de nenhum efeito qualquer disposição contratual em contrário", e seu parágrafo único ressalva que "Não serão indenizadas as benfeitorias feitas em desconformidade com o contrato ou com a lei".

Nesse mesmo sentido, o Código Civil prevê que o possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis (art. 1.219 do CC/2002 e art. 516 do CC/1916).

O âmago dos dispositivos citados é evitar o enriquecimento ilícito de quaisquer das partes, promovendo a restituição à situação originária.

Embora o art. 34 da Lei Lehmann faça menção apenas a benfeitorias, parece claro que o dispositivo abarca tanto benfeitorias como acessões.

Entretanto, ainda que a licença para construir seja requisito imprescindível a qualquer obra realizada em terreno urbano, seria temerário reconhecer de forma categórica que a ausência de licença para construir não constitui irregularidade apta a obstar eventual condenação à indenização por benfeitorias/acessões realizadas no lote objeto do contrato.

Isso porque a ausência de licença para construir emitida pela prefeitura municipal é irregularidade que pode ser ou não sanável, a depender do caso concreto.

Assim, caso seja mantida a condenação à indenização e a construção realizada seja considerada precária e não passível de regularização pela municipalidade, havendo necessidade de demolição, o vendedor arcaria com demasiado ônus.

Por outro lado, caso o STJ afaste a condenação à indenização, e a municipalidade entenda que a irregularidade é sanável, esta Corte estaria ferindo de morte o escopo maior do ordenamento jurídico específico, qual seja, o retorno ao status quo ante e a vedação ao enriquecimento sem causa.

Ressalte-se que, conforme a doutrina, construções realizadas sem licença da municipalidade estão em desacordo com a lei e, assim, sujeitas a sanções administrativas, as quais não podem ser imputadas ao promitente vendedor, porquanto a posse e o direito de construir haviam sido transmitidos ao promitente comprador.

Dessa forma, antes de decidir sobre a obrigação de indenização por benfeitorias, faz-se necessário apurar as multas pela construção sem o alvará da prefeitura e eventual necessidade de demolição da obra.

Isso porque é imprescindível a verificação quanto à possibilidade de ser sanada ou não a irregularidade – consistente na ausência de licença da prefeitura para construir –, de modo a realizar a restituição das partes à situação anterior e evitar enriquecimento ilícito de qualquer dos litigantes.

REsp 1.191.862-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 16/5/2014.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

É possível a abertura de matrícula e o registro da escritura pública de compra e venda, ainda que o imóvel esteja descrito precariamente, desde que haja identidade entre a descrição do título e a transcrição anterior

O Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo (CSM/SP) julgou a Apelação Cível nº 0015003-54.2011.8.26.0278, onde se decidiu ser possível a abertura de matrícula e o registro da escritura pública de compra e venda, ainda que o imóvel esteja descrito precariamente, desde que haja identidade entre a descrição do título e a transcrição anterior. O acórdão teve como Relator o Desembargador Hamilton Elliot Akel e declarações de votos convergentes dos Desembargadores Artur Marques da Silva Filho e Ricardo Mair Anafe, sendo o recurso julgado provido por unanimidade.

No caso em tela, o apelante interpôs recurso em face de sentença que manteve a recusa do registro da escritura pública de compra e venda, considerando a precariedade na descrição do imóvel. De acordo com a sentença, o controle da especialidade tornou-se inviável, sendo necessário procedimento para correção dos pontos essenciais à sua correta individualização. O apelante, em suas razões, alegou que, de acordo com a atual orientação do CSM/SP é possível o registro pretendido quando há identidade entre a descrição do título e da transcrição anterior. Em sua manifestação, a Procuradoria de Justiça opinou pelo provimento do recurso, com a observação, no entanto, de que a matrícula deveria ser bloqueada, de ofício.

Diante do exposto no recurso, o Relator decidiu pelo provimento do recurso, sendo possível o registro pretendido e observou que a negativa do Oficial Registrador à prática do ato baseou-se em entendimento pretérito do CSM/SP. O Relator ainda afirmou que a orientação atual é no sentido de que, havendo identidade entre a descrição do título e a descrição contida na matrícula ou na transcrição, o registro é possível. Afirmou, também, que “tem-se admitido a mitigação da especialidade a fim de não obstar o tráfego de transações envolvendo imóveis, permitindo-se a manutenção de descrições imprecisas, constantes de antigas transcrições, quando da abertura da matrícula, desde que haja elementos mínimos para se determinar a situação do imóvel, e que ele seja transmitido ou onerado por inteiro, ou seja, desde que a nova matriz a ser aberta o abranja por inteiro.”

Quanto ao bloqueio matricial, o Relator entendeu não ser conveniente sua determinação, tendo em vista que a abertura de matrícula e o registro perseguido são atos registrários válidos e eficazes, uma vez que sobre eles não existe nulidade de pleno direito que justifique impedir novas inscrições, para que não haja danos de difícil reparação.

Em Declaração de Voto Convergente, o Desembargador Artur Marques da Silva Filho considerou que a imperfeição não impede a identificação do imóvel e que o título causal diz respeito ao imóvel como um todo, ou seja, a descrição contida no título coincide com aquela que consta na matrícula. Nestas condições, o Desembargador entendeu ser possível a abertura da matrícula e o registro do título, não sendo necessária a prévia retificação exigida pelo Oficial Registrador, tampouco o bloqueio matricial. No mesmo sentido, o Desembargador Ricardo Mair Anafe, em síntese, afirmou que, “havendo descrição suficiente do imóvel, apta a identifica-lo e coincidente com a transcrição anterior, possível o registro sem necessidade de bloqueio da matrícula, nos termos do disposto nos artigos 214 e 225 da Lei de Registros Públicos.”

Diante do exposto, os Desembargadores votaram pelo provimento do recurso.

TJ/SP DETERMINA LIBERAÇÃO DE IMÓVEL VENDIDO DURANTE PROCESSO




A 14ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo determinou, em decisão proferida no último dia 10 de outubro, a liberação de imóvel penhorado para garantir execução em ação monitória proposta anteriormente.  

Consta dos autos que o bem objeto do litígio foi vendido em 2006, um ano antes do início da fase de execução do processo, fato que levou o credor a opor embargos de terceiro, sob a alegação de que o negócio teria ocorrido mediante fraude à execução. Na sentença, o magistrado reconheceu a negociação fraudulenta e determinou a constrição do bem.  

Ao julgar a apelação, o desembargador Carlos Henrique Abrão afirmou que não houve má-fé por parte dos contratantes e determinou a liberação do imóvel. “Evidenciada a boa-fé, ao menos aparente, dos adquirentes e, não havendo por certo, insolvência presumida ou fraude à execução antecipada, o resultado ao qual se chega é no sentido de chancelar o ato jurídico e cancelar a constrição, acolhendo-se a pretensão dos autores.”  

Do julgamento, que teve votação por maioria, participaram os desembargadores Lígia Araújo Bisogni e Maurício Pessoa.

A notícia refere-se a seguinte apelação: 0105195-82.2011.8.26.0100.

Fonte: TJ/SP | 30/09/2014.

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Imóvel sem matrícula própria não pode ser reivindicado por adjudicação compulsória



A adjudicação compulsória é uma ação judicial destinada a promover o registro imobiliário necessário à transmissão da propriedade quando não há a escritura definitiva em solução de uma promessa e compra e venda de imóvel.

A relatora do processo, ministra Isabel Gallotti, destacou que “apesar de se tratar de um pedido de adjudicação de imóvel rural e não de imóvel em área urbana, é indiscutível que os lotes não possuíam matrícula específica, que caracterizaria o desmembramento jurídico das terras rurais reivindicadas”.

Promessa de compra e venda

O recurso negado pela Turma é do comprador de 23 lotes rurais localizados no Distrito Federal, com o total de 326 mil metros quadrados, que formam o Sítio Mirante do Vale. Os lotes integram uma área maior, denominada Fazenda Rajadinha. Há comprovação de que os lotes foram quitados.

Em razão da omissão dos herdeiros do vendedor em emitir a declaração de vontade para averbação dos contratos no registro imobiliário, ele entrou com a ação de adjudicação compulsória. O processo foi extinto sem resolução de mérito sob o fundamento de impossibilidade jurídica do pedido, pois os lotes não têm matrícula individualizada, conforme exige a legislação.

No recurso ao STJ, o autor da ação apontou violação a diversos artigos do Código de Processo Civil (CPC). Acrescentou que foram observadas as regras do artigo 83 da Lei Complementar 803/09, que aprovou a revisão do Plano Diretor de Ordenamento Territorial do Distrito Federal (PDOT), permitindo o desmembramento de terras rurais, observada a área mínima de dois hectares. Disse ainda que houve averbação de vendas anteriores de partes da mesma fazenda.

Matrícula indispensável

A ministra Isabel Gallotti afirmou no voto que lotes dentro de um todo maior, sem matrícula própria no registro de imóveis, não podem ser objeto de adjudicação compulsória. Para a relatora, “a simples intervenção jurisdicional para determinar, por via transversa, a titulação de domínio sobre terra não parcelada frustraria todo o ordenamento jurídico e a política agrária de parcelamento ordenado do solo rural”.

Isabel Gallotti disse ainda que os contratantes, antes de celebrar o negócio, deixaram de observar atos obrigatórios, o que tornou impossível o registro dos imóveis, além de não cumprirem as regras de parcelamento de gleba rural instituídas pelo Incra.

Na conclusão do voto, a relatora explicou que mesmo não havendo resistência ao pedido por parte do espólio do vendedor, que reconhece a promessa de compra e venda e o pagamento, não há como conceder a escritura das parcelas enquanto o processo de regularização perante o governo do Distrito Federal não for concluído.

A notícia refere-se ao seguinte processo: REsp 1297784.

Fonte: STJ | 26/09/2014.

Decisão do TST sobre arrematação nula de imóvel preserva direitos de compradores de boa-fé

A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho declarou a nulidade da arrematação de um imóvel penhorado em ação trabalhista por falta da regular citação do proprietário e anulou todos os atos judiciais que resultaram na arrematação. No entanto, como o imóvel já tinha sido vendido, a titularidade só será transferida de volta ao proprietário original depois que o arrematante devolver os valores pagos pelos compradores.

Para o ministro Caputo Bastos, relator do processo, a decisão "implica necessariamente a invalidade da arrematação", mas como o bem arrematado foi vendido antes da declaração de nulidade dos atos executórios, "devem ser respeitados os direitos dos adquirentes de boa-fé".

Arrematação nula x terceiros de boa-fé

O imóvel, um apartamento em Curitiba (PR), foi penhorado e leiloado para pagamento de dívida trabalhista em ação movida contra as empresas FAG Telecomunicações e F43 Telecomunicações Ltda. Após a arrematação, o responsável pela empresa que teve seu imóvel penhorado questionou a execução porque ele não havia sido intimado regularmente da penhora.

Durante o trâmite da ação, o imóvel foi vendido pelo arrematante para um casal, que o financiou pela Caixa Econômica Federal. Um ano e oito meses depois, o casal foi surpreendido com a intimação da existência da ação para desconstituir a arrematação e a contestou para comprovar que comprou o bem de forma regular, afirmando que durante a negociação e o financiamento não havia qualquer registro, bloqueio ou restrição junto ao cartório de registro de imóveis que impedisse a transação. Ressaltaram ainda que não tinham nem conhecimento de que o imóvel seria fruto de uma arrematação judicial.

A ação movida pelo casal foi acolhida pelo juízo de primeiro grau e confirmada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR), que reconheceram a validade e eficácia do negócio celebrado entre eles e o arrematante.

O primeiro proprietário do bem recorreu ao TST reiterando a alegação de nulidade da arrematação por ausência de citação válida, e teve seu recurso acolhido pela Quinta Turma. "A arrematação, mesmo depois de perfeita e acabada e irretratável, pode ser declarada nula quando presentes os motivos previstos no parágrafo 1º do artigo 694 do Código de Processo Civil, entre eles o vício de nulidade", explicou o ministro Caputo Bastos. No entanto, o imóvel somente será transferido após a restituição integral do preço pago pelo casal, devidamente corrigido, e a indenização das benfeitorias e demais despesas comprovadas, conforme os artigos 447 e 457 do Código Civil.

A notícia refere-se ao seguinte processo: RR-1376-74.2010.5.09.0008.

Fonte: TST | 30/09/2014.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Mandado de Penhora expedido pela Justiça do Trabalho. Ofensa ao princípio da continuidade (foi determinada a penhora de parte ideal não pertencente ao devedor). Considerando que o STJ entende ser o juízo do Trabalho o único competente para rever suas decisões, incumbindo-lhe zelar pelo fiel cumprimento da Lei dos Registros Públicos, o registro deve ser mantido. Ementa não oficia


0029270-46.2012 Pedido de Providências 12º Registro de Imóveis da Capital – Vistos. Cuida-se de representação formulada pelo 12º Oficial Registro de Imóveis, que informa ter registrado, por determinação do MM. Juízo da 67ª Vara do Trabalho 2ª Região, a penhora de 2/3 do imóvel matriculado sob nº 115.423. Relata que foi determinada a penhora de 1/3 do imóvel pertencente a Walter José Saldanha Pinto e 1/3 pertencente a Miguel Ângelo Saldanha Silva. Todavia, pelo falecimento da ex cônjuge de Miguel (Maria de Fátima Rodrigues Silva), a terça parte do imóvel foi atribuída aos filhos Thiago Saldanha Silva e Juliana Saldanha Silva (R.5 matrícula 115.423), logo, verifica ser incabível a penhora sobre essa terça parte, que fere o princípio da continuidade registrária. Juntou documentos às fls. 03/06. O Ministério Público manifestou-se no sentido de que somente o E Supremo Tribunal de Justiça poderá invalidar a determinação proferida pelo Juízo do Trabalho, pois cabe também ao juiz trabalhista arcar com as incumbências de zelar pelo fiel cumprimento da Lei de Registros Públicos (fls.08 e 56). É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir. Preliminarmente, cumpre destacar que os títulos judiciais não estão isentos de qualificação (positiva ou negativa), para ingresso no fólio real. O Egrégio Conselho Superior da Magistratura já decidiu que a qualificação negativa do título judicial não caracteriza desobediência ou descumprimento de decisão judicial (Apelação Cível n. 413-6/7). Nessa linha, também o E. Supremo Tribunal Federal já decidiu que: “REGISTRO PÚBLICO – ATUAÇÃO DO TITULAR – CARTA DE ADJUDICAÇÃO – DÚVIDA LEVANTADA – CRIME DE DESOBEDIÊNCIA – IMPROPRIEDADE MANIFESTA. O cumprimento do dever imposto pela Lei de Registros Públicos, cogitando-se de deficiência de carta de adjudicação e levantando-se dúvida perante o juízo de direito da vara competente, longe fica de configurar ato passível de enquadramento no artigo 330 do Código Penal – crime de desobediência – pouco importando o acolhimento, sob o ângulo judicial, do que suscitado” (HC 85911 / MG – MINAS GERAIS, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, j. 25/10/2005, Primeira Turma). Assim, não basta a existência de título proveniente de órgão judicial para autorizar automaticamente o ingresso no registro tabular. Quanto ao mais, a exigência do Oficial está correta. Conforme verifica-se do documento juntado às fls. 03/06, foi averbada a penhora de 2/3 do imóvel (AV. 09/115.423), conforme determinação do MM. Juízo da 67ª Vara do Trabalho de São Paulo. Todavia, conforme bem observou o Oficial Registrador, tal fato feriu o princípio da continuidade, segundo o qual uma inscrição (lato sensu) subsequente só transfere um direito se o direito por transferir efetivamente estiver compreendido, objetiva e subjetivamente, na inscrição (lato sensu) antecedente que lhe dá fundamento, ou seja, para que se faça a inscrição subsequente, é necessário que o disponente possa, objetiva e subjetivamente, dispor do direito, o que só se pode concluir pela própria inscrição antecedente. Afrânio de Carvalho, a propósito, explica que: O princípio da continuidade, que se apóia no de especialidade, quer dizer que, em relação a cada imóvel, adequadamente individuado, deve existir um cadeia de titularidade à vista da qual só se fará a inscrição de um direito se o outorgante dele aparecer no registro como seu titular. Assim, as sucessivas transmissões, que derivam umas das outras, asseguram a preexistência do imóvel no patrimônio do transferente (Registro de Imóveis, Editora Forense, 4ª Ed., p. 254). Na presente hipótese verifica-se que a penhora foi efetivada sobre 1/3 do imóvel pertencente à Miguel Ângelo Saldanha Silva, casado sob o regime da comunhão universal de bens com Maria de Fátima Rodrigues Silva, a qual faleceu em 13.04.1999. Todavia, pelo Registro nº05/15.423 (fl.04vº e 05), tem-se que pela partilha dos bens deixados por Maria de Fátima, homologada por sentença em 31.06.226, a terça parte foi atribuída a seus dois filhos Thiago Saldanha Silva e Juliana Saldanha Silva, cabendo a cada um a proporção de 1/6 da parte ideal, logo, seria incabível a penhora efetuada pois além de violar o princípio da continuidade, prejudicou o direito dos legítimos herdeiros. Porém, a despeito do acerto do Oficial e de sua louvável cautela, que deve ser mantida em casos análogos para que sobre si não recaia qualquer tipo de responsabilidade, recentemente o E. Superior Tribunal de Justiça, no conflito de competência nº 106.446, que teve por relator o Min. Sidnei Beneti, entendeu ser o juízo do Trabalho o único competente para rever suas decisões, incumbindo-lhe zelar pelo fiel cumprimento da Lei dos Registros Públicos. Diante desta nova orientação, malgrado o posicionamento deste juízo, que vinha sistematicamente cancelando os registros eivados de nulidade de pleno direito como o presente, o registro não pode ser cancelado. Por fim, entendo que por ter sido ofendido o direito dos herdeiros Thiago e Juliana faz-se necessária a cientificação deles, para, querendo, ingressar com as medidas cabíveis. Posto isso, indefiro a representação formulada pelo 12º Oficial de Registro de Imóveis. Com cópia desta e do parecer do Ministério Público, oficie-se ao MMº. Juízo da 67ª Vara do Trabalho da Capital, bem como cientifiquemse os herdeiros Thiago Saldanha Silva e Juliano Saldanha Silva, no endereço indicado às fls.04vº e 05, acerca desta decisão, para as providências que entenderem necessárias. Sem custas, despesas ou honorários decorrentes deste procedimento. Oportunamente, ao arquivo. P.R.I.C. São Paulo, 19 de setembro de 2014. Tania Mara Ahualli Juíza de Direito (CP 229)

Fonte: DJE/SP | 10/10/2014.

domingo, 30 de novembro de 2014

Os bens adquiridos na constância do casamento, segundo a Súmula 377 da Suprema Corte, comunicam-se, mesmo no regime da separação parcial de bens.

Processo 1045513-77.2014.8.26.0100 - Dúvida – REGISTROS PÚBLICOS – 14º Oficial de Registro de Imoveis da Capital – JAYME BORGES GAMBOA FILHO – Pedido de providências – averbação de divórcio – comunicação dos bens na constância do casamento – aquisição a título oneroso – improcedência . Vistos. Primeiramente, anoto que o procedimento adequado para o feito é de providências. O 14º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo formulou pedido de providências, a requerimento de JAYME BORGES GAMBOA FILHO, em razão da negativa de averbação do divórcio na matrícula do imóvel de sua titularidade. Em síntese, o interessado alega que adquiriu, a título oneroso, a nua propriedade do imóvel matriculado sob nº 100.933 e que seus pais adquiriram, também a título oneroso, o usufruto sobre o mesmo imóvel. Defende que não foi realizada partilha e que a nua-propriedade do imóvel lhe pertence integralmente. Por fim, aduz que não há comunicabilidade dos bens entre os cônjuges. Segundo narrado pelo Oficial, a qualificação negativa decorreu da falta da apresentação da Carta de Sentença com a partilha dos bens, envolvendo o imóvel matriculado sob nº 100.933, por entender que há comunicabilidade na hipótese. Houve impugnação. O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida, mantendo-se o óbice levantado pelo Registrador. É o relatório. DECIDO. Com razão o Oficial e o Ministério Público. O interessado pretende averbação do divórcio, todavia não trouxe aos autos a Carta de Sentença com o Formal de Partilha dos bens do casal. JAYME BORGES GAMBOA FILHO casado sob o regime da comunhão parcial dos bens com GIZELDA BARRETO GAMBOA, comprou, em 1989, a nua propriedade do imóvel matriculado sob nº 100.993, conforme R-1, e seus pais adquiriram, conforme R-2, o usufruto sobre ele. O negócio jurídico decorreu regularmente, e os títulos tiveram ingresso observando a estrita legalidade dos princípios que norteiam o Direito Registral. Após vários anos dos referidos registos, foram apresentados à qualificação do Oficial, o requerimento para se averbar o cancelamento do usufruto, por morte dos usufrutuários e o divórcio de Jayme e Gizelda, motivo do óbice imposto, porque não foi apresentado ao registro a Carta de Sentença do divórcio. Tal exigência se fundamenta pelo fato do imóvel ter sido adquirido a título oneroso durante o matrimônio, havendo comunicação com o patrimônio de sua ex-esposa. Os bens adquiridos na constância do casamento, segundo a Súmula 377 da Suprema Corte, comunicam-se, mesmo no regime da separação parcial de bens, assim a esposa tornou-se comunheira da nua-propriedade comprada por ambos. Em outras palavras, se entre cônjuges vigorava o regime da separação parcial de bens e se houve aquisição onerosa de bens durante a sociedade conjugal, o aquesto presume-se decorrente pelo esforço comum de ambos e, portanto, comunica-se, nos termos da Súmula n. 377 do Supremo Tribunal Federal. Em tal caso, é necessário que se demonstre que comunicação não houve ou que, por outra causa, na partilha ou adjudicação o aquesto coube todo ao varão, o que só poderia ser resolvido a partir da apresentação do formal de partilha. Ante o exposto, INDEFIRO o pedido de providências e mantenho o óbice imposto pelo 14º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo. Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. Oportunamente, arquivem-se os autos. P.R.I.C – ADV: EDSON LUIS DOS SANTOS (OAB 222277/SP)

Fonte: DJE/SP | 09/10/2014.

Cabe ao devedor, após quitação da dívida, providenciar o cancelamento do protesto

Para fins do art. 543-C do Código de Processo Civil: "No regime próprio da Lei n. 9.492⁄1997, legitimamente protestado o título de crédito ou outro documento de dívida, salvo inequívoca pactuação em sentido contrário, incumbe ao devedor, após a quitação da dívida, providenciar o cancelamento do protesto.

Íntegra do acórdão:

RECURSO ESPECIAL Nº 1.339.436 - SP (2012⁄0172838-0)
RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
RECORRENTE : GETULIO FONSECA CARVALHO
ADVOGADO : LUÍS ROBERTO OLÍMPIO E OUTRO(S)
RECORRIDO : VAREJÃO CASA DA MAÇÃ LTDA - MICROEMPRESA
ADVOGADO : CARLOS A DEZOTTI E OUTRO(S)
INTERES. : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO - "AMICUS CURIAE"
ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
INTERES. : CONFEDERACAO NACIONAL DO COMERCIO DE BENS, SERVICOS E TURISMO - CNC - "AMICUS CURIAE"
ADVOGADO : CÁCITO AUGUSTO FREITAS ESTEVES E OUTRO(S)
INTERES. : ANDRÉ APPOLARI
INTERES. : ANFAC - ASSOCIAÇÃO NACIONAL DAS SOCIEDADES DE FOMENTO MERCANTIL - FACTORING - "AMICUS CURIAE"
ADVOGADOS : JOSÉ LUÍS DIAS DA SILVA E OUTRO(S)
LUIZ LEMOS LEITE
INTERES. : FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE BANCOS FEBRABAN - "AMICUS CURIAE"
ADVOGADOS : LUIZ CARLOS STURZENEGGER E OUTRO(S)
LUCIANO CORREA GOMES
THIAGO LUIZ BLUNDI STURZENEGGER
EMENTA
CANCELAMENTO DE PROTESTO EXTRAJUDICIAL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. ÔNUS DO CANCELAMENTO DO PROTESTO LEGITIMAMENTE EFETUADO. DEVEDOR. CONFORME DISPÕE O ART. 2º DA LEI N. 9.492⁄1997, OS SERVIÇOS CONCERNENTES AO PROTESTO FICAM SUJEITOS AO REGIME ESTABELECIDO NESTA LEI. ALEGAÇÃO DE O DÉBITO TER SIDO CONTRAÍDO EM RELAÇÃO DE CONSUMO. IRRELEVÂNCIA, POR SE TRATAR DE PROCEDIMENTO SUBMETIDO A REGRAMENTO ESPECÍFICO.
1. Para fins do art. 543-C do Código de Processo Civil: "No regime próprio da Lei n. 9.492⁄1997, legitimamente protestado o título de crédito ou outro documento de dívida, salvo inequívoca pactuação em sentido contrário, incumbe ao devedor, após a quitação da dívida, providenciar o cancelamento do protesto.
2. Recurso especial não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEGUNDA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Para os efeitos do artigo 543-C, do Código de Processo Civil, foi aprovada a seguinte tese: "No regime próprio da Lei nº 9.492⁄1997, legitimamente protestado o título de crédito ou outro documento de dívida, salvo inequívoca pactuação em sentido contrário, incumbe ao devedor, após a quitação da dívida, providenciar o cancelamento do protesto". Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Buzzi, Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro e João Otávio de Noronha votaram com o Sr. Ministro Relator.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Raul Araújo.
Brasília, 10 de setembro de 2014 (data do julgamento).
MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
Relator
RECURSO ESPECIAL Nº 1.339.436 - SP (2012⁄0172838-0)
RECORRENTE : GETULIO FONSECA CARVALHO
ADVOGADO : LUÍS ROBERTO OLÍMPIO E OUTRO(S)
RECORRIDO : VAREJÃO CASA DA MAÇÃ LTDA - MICROEMPRESA
ADVOGADO : CARLOS A DEZOTTI E OUTRO(S)
INTERES. : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO - "AMICUS CURIAE"
ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
INTERES. : CONFEDERACAO NACIONAL DO COMERCIO DE BENS, SERVICOS E TURISMO - CNC - "AMICUS CURIAE"
ADVOGADO : CÁCITO AUGUSTO FREITAS ESTEVES E OUTRO(S)
INTERES. : ANDRÉ APPOLARI
INTERES. : ANFAC - ASSOCIAÇÃO NACIONAL DAS SOCIEDADES DE FOMENTO MERCANTIL - FACTORING - "AMICUS CURIAE"
ADVOGADOS : JOSÉ LUÍS DIAS DA SILVA E OUTRO(S)
LUIZ LEMOS LEITE
INTERES. : FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE BANCOS FEBRABAN - "AMICUS CURIAE"
ADVOGADOS : LUIZ CARLOS STURZENEGGER E OUTRO(S)
LUCIANO CORREA GOMES
THIAGO LUIZ BLUNDI STURZENEGGER
RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):
1. Getúlio Fonseca Carvalho ajuizou "ação de indenização por danos materiais e morais" em face de Varejão Casa da Maçã Ltda - ME. Afirma que emitiu cheque para pagamento de mercadoria adquirida no estabelecimento do réu, todavia, por estar desempregado, não pôde honrar o pagamento, tendo a cártula vindo a ser levada a protesto. Argumenta que, com a obtenção de novo emprego, quitou a dívida contraída na relação de consumo.
Assevera que caberia ao réu "pedir a baixa do protesto do título, considerando-se o pagamento completo da dívida".
Expõe que, como possuía uma pequena propriedade rural, tentou obter financiamento para recuperação de pastagens, cercas e aquisição de 20 novilhas para iniciar atividades rurais, todavia, "quando o financiamento estava por ser liberado constatou-se o protesto do cheque que já havia sido pago" há muito tempo, sem que tenha sido promovido o cancelamento.
Pondera que teve gastos com despesas de viagens para consecução do financiamento e que teve dano moral, por ser apontado como "devedor de dívida já paga e de ter frustrado o sonho" de ser empreendedor no município onde nasceu.
O Juízo da 3ª Vara da Comarca de Araras julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial.
Interpôs o autor apelação para o Tribunal de Justiça de São Paulo, que negou provimento ao recurso.
A decisão tem a seguinte ementa:
BEM MÓVEL⁄SEMOVENTE - CERCEAMENTO DE DEFESA - OCORRÊNCIA - AUSÊNCIA DE PREJUÍZO - NULIDADE DA SENTENÇA AFASTADA - REVELIA - INOCORRÊNCIA - CONTESTAÇÃO EM NOME DO SÓCIO - IRREGULARIDADE SANÁVEL - RESPONSABILIDADE CIVIL - PROTESTO DE TÍTULO - PAGAMENTO POSTERIOR AO VENCIMENTO - ÔNUS DO CANCELAMENTO - DEVEDOR - PARTE INTERESSADA - INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 26, DA LEI N" 9.492⁄97 EM CONSONÂNCIA COM A LEI ESTADUAL N. 11.331⁄02 - PRELIMINARES REJEITADAS - RECURSO NÃO PROVIDO.
Ocorrendo de forma licita a negativação do nome do devedor junto aos órgãos de proteção ao crédito, compete a ele o cancelamento após regular quitação.
Opostos embargos de declaração, foram rejeitados.
Sobreveio recurso especial do autor, com fundamento no artigo 105, inciso III, alíneas "a" e "c", da Constituição Federal, sustentando divergência jurisprudencial, omissão e violação aos arts. 6º, 7º, 14, 39, 43 e 73 do CDC; 3º, 273, 297, 303, 319, 320, 324, 332, 333, 348, 401,402 e 535 do CPC e 186, 187, 927, 932 e 933 do CC.
Afirma que o recorrido, "se aproveitando da simplicidade desse homem pobre, humilde e sem leitura e fugindo completamente de suas obrigações contratuais, não cuidou de dar baixa no título junto ao 2º Cartório de Protestos de Araras, bem como não emitiu a carta de anuência indispensável ao ato, mantendo seu nome injustamente no 'Rol dos Devedores', alijando-o completamente do mercado de consumo".
Pondera que o representante legal do recorrido - que recebeu o valor integral da dívida -, apesar de não ser parte no processo, contestou a ação, contudo, única e exclusivamente a questão dos danos morais, confessando, inclusive, o superveniente pagamento da dívida vencida - embora não tenha dito a verdade quando afirmou ter devolvido o título protestado e entregue a carta de anuência.
Argumenta que o acórdão recorrido diverge da jurisprudência do STJ, que perfilha o entendimento de que "não compete ao devedor dar a baixa no protesto e sim ao credor, a jurisprudência já pacificou essa questão, competindo ao credor esse encargo".
Não houve oferecimento de contrarrazões.
Dei provimento ao Agravo de Instrumento 1.383.403⁄SP para determinar a subida do presente recurso especial.
Verificando a multiplicidade de recursos a versarem sobre a mesma controvérsia, submeti o feito à apreciação da egrégia Segunda Seção, na forma do que preceitua o artigo 543-C do CPC. Com isso determinei a ciência e facultei a manifestação no prazo de 15 (quinze) dias (art. 3º, I, da Resolução n. 8⁄2008) ao Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor - Idec, à Federação Brasileira de Bancos - Febraban, à Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo - CNC, à Associação Nacional das Sociedades de Fomento Mercantil - Anfac, à Anoreg-Brasil e à Defensoria Pública da União.
A Defensoria Pública da União, como amicus curiae, opina no seguinte sentido, in verbis:
Dispõe o art. 26 da Lei nº 9.492⁄97 que "O cancelamento do registro do protesto será solicitado diretamente no Tabelionato de Protesto de Títulos, por qualquer interessado, mediante apresentação do documento protestado, cuja cópia ficará arquivada" .
Em análise objetiva e direta, ou seja, pela literalidade do dispositivo, pode-se raciocinar que o cancelamento do protesto fica a cargo de qualquer das partes, ou seja, pode ser realizado tanto pelo credor, quanto pelo devedor, irrestritamente.
Contudo, a lógica, objetividade e facilidade de entendimento param por aí. É que o devedor somente terá condições de realizar o cancelamento do protesto quando:
(i) Apresentar o título protestado;
(ii) Na falta desse, apresentar declaração de anuência, com identificação e firma reconhecida, daquele que figurou no registro de protesto como credor originário ou por endosso translativo.
Vê-se, pois, que a possibilidade de o próprio devedor requerer o cancelamento do protesto depende necessariamente de ato do credor, sem o qual não lhe caberá o ônus de postular o cancelamento diretamente na medida em que lhe faltará o instrumento indispensável para a realização do ato.
Vale lembrar, por outro lado, que o devedor nem sempre estará diante de cartório que lhe seja próximo. Ou seja, a serventia pode mesmo ser em outra unidade da federação, em local bem longínquo daquele que reside o devedor, daí se estaria impondo ônus a mais ao consumidor-devedor, já vulnerável diante da pessoa jurídica que, certamente, tem aporte de técnico, financeiro e administrativo maior do que o hipossuficiente.
De certo que se poderá dizer que atualmente o sistema funciona inclusive por meio eletrônico, pela internet, ou até mesmo por telefone. Ora, de toda sorte, estar-se-ia imputando maior ônus ao devedor, reduzindo até mesmo a perspectiva de negociação de eventuais dívidas, quando se tiver em mente que será muito mais trabalhoso localizar o órgão de protesto e efetuar a baixa.
A obrigação deve, por isso, permanecer com o credor.
Nesse sentido, inclusive, embora se tratasse do SERASA⁄SPC, esse colendo Superior Tribunal de Justiça, por meio das duas Turmas que compõem essa Eg. Seção, já havia firmando o entendimento de que o ônus pelo cancelamento de inscrição em registro deve recair sobre o credor.
[...]
Portanto, o razoável é que o próprio credor realize o cancelamento do protesto, não impedindo, por óbvio, que o devedor possa fazê-lo diante da omissão do credor, que, por isso, deverá ser responsabilizado nas esferas correspondentes.
Entende, assim, a Defensoria Pública da União que o ônus de requerer o cancelamento do protesto, após o pagamento da dívida, é do credor.
A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo - CNC, como amicus curiae, opina no seguinte sentido, in verbis:
A controvérsia exposta nos autos do presente recurso especial, qual seja, a responsabilidade pelo cancelamento junto aos cartórios de protesto de títulos e demais órgãos de proteção ao crédito, em nosso modesto entender, com a devida venia, não deveria existir diante da clareza do artigo 26 da Lei nº 9.492⁄97, comando normativo em que se baseou a sentença a quo ora recorrida.
Isto porque o referido dispositivo normativo é claro em atribuir a qualquer "interessado" o cancelamento do registro de protesto, de forma que possuir "interesse", que no Conceito de Carnelutti é a "posição favorável à satisfação de uma necessidade", é requisito ex vi lege para ter legitimidade de agir.
Ocorre que os credores, após o recebimento de seus créditos, não possuem qualquer interesse, seja jurídico ou econômico no cancelamento do registro de protesto realizado, ato cuja eficácia para o credores se exauriu com o pagamento do crédito,e como tal, não lhes traz qualquer efeito jurídico.
Assim, nos parece restar claro que para o credores há interesse jurídico e econômico na efetivação do registro de protesto, instrumento hábil para a cobrança de seus créditos, mas não há qualquer interesse no respectivo cancelamento, ato cujos efeitos jurídicos só interessam aos devedores ou a terceiros eventualmente interessados, tais como seus herdeiros, cônjuges, sócios e etc., que são os legitimados a que se refere o caput do artigo 26 da lei nº 9.492⁄97.
[...]
Assim, diante do exposto, espera a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo ter contribuído para as discussões jurídicas acerca do objeto da controvérsia existente nos autos do presente Recurso Especial, confiando que ao final seja firmado por esta ínclita Corte o entendimento de que o cancelamento do registro do protesto de que trata o artigo 26 da Lei nº 9.492⁄97 não pode ser atribuído ao credor, tendo em vista a inequívoca inexistência de interesse deste na realização do ato, que é exigência de legitimação legalmente prevista, por ser medida da mais escorreita justiça.
A Associação Nacional das Sociedades de Fomento Mercantil - Anfac, como amicus curiae, opina no seguinte sentido, in verbis:
4 - Para que se proceda ao cancelamento do protesto de qualquer título, incumbe ao interessado o pagamento de despesas.
5 – A existência de tais despesas, decorrente do protesto e seu consequente cancelamento, está expressamente prevista na Lei n° 9492⁄97, em seu Artigo 26, parágrafo 3º.
6 – O Art. 325 do Código Civil prevê a responsabilidade do devedor pelo pagamento, "in verbis": "Presumem-se a cargo do devedor as despesas com o pagamento e a quitação;....." G.n.
7 – Resta claro que, por tal enfoque, diante da existência de despesas para o cancelamento do protesto, cuja responsabilidade é atribuída ao devedor, a ele devedor então cabe o ônus de promover o cancelamento e não ao credor.
II – DO PRECEDENTE CONTIDO NA LEI FEDERAL 6.690⁄79
8 – A Lei Federal nº 6.690⁄79, de 25⁄09⁄79, disciplina o cancelamento do protesto de títulos cambiais e expressamente atribui a responsabilidade por tal cancelamento ao devedor.
9 – Com efeito, o art. 2º. do mencionado diploma legal afirma:
"Art 2º Será cancelado o protesto de títulos cambiais posteriormente pagos mediante a exibição e a entrega, pelo devedor ou procurador com poderes especiais, dos títulos protestados, devidamente quitados, que serão arquivados em cartório." G.n.
10 – Não nos resta dúvida de que, sendo o devedor o maior interessado no cancelamento do protesto, cabe a ele e somente a ele a responsabilidade pelo cancelamento do protesto.
V - CONCLUSÃO
Diante do previsto na Lei Federal nº 9492⁄97, que prevê o pagamento de despesas para o cancelamento, combinado com o estabelecido no Art. 395 do Código Civil, que imputa ao Devedor tal responsabilidade, conclui-se que incumbem ao Devedor, maior interessado, as providências de cancelamento do protesto.
A corroborar tal entendimento, mister se faz ainda observar o que prevê a Lei Federal nº 6690⁄79, que disciplina o cancelamento do protesto de títulos cambiais, onde está expressamente previsto em seu artigo 2º, que cabem ao devedor as providências relativas ao cancelamento do protesto.
A ANFAC – Associação Nacional de Fomento Comercial honrada manifesta-se no sentido de, para a solução da controvérsia, seja reconhecida a responsabilidade do devedor quanto às providências ao cancelamento de protesto tirado de forma regular, esperando que os argumentos contidos na presente possam contribuir para uma melhor análise da matéria por essa Colenda Corte.
A Federação Brasileira de Bancos - Febraban, como amicus curiae, opina no seguinte sentido, in verbis:
4. Trata-se, na origem, de ação indenizatória em que Getúlio Fonseca Carvalho pleiteia a condenação de Varejão Casa da Maçã Ltda. em decorrência da manutenção de protesto de título (protesto cuja regularidade não está em dúvida) após o pagamento da dívida. Entende o autor que Varejão deveria ter procedido ao cancelamento do protesto, uma vez sanada a mora.
5. O Tribunal de Justiça estadual entendeu que cabia ao devedor, após o pagamento da dívida, o cancelamento do protesto, nos termos do art. 26 da Lei nº 9.492, de 10 de setembro de 1997. O acórdão restou assim ementado:
[...]
7. São esses os fatos considerados relevantes para o julgamento do recurso especial, no que respeita à matéria afetada com o objetivo de fixação de paradigma para aplicação a recursos repetitivos.
II. DA RESPONSABILIDADE PELO CANCELAMENTO DE PROTESTO REGULARMENTE EFETUADO, APÓS A QUITAÇÃO DA DÍVIDA
8. A Lei nº 9.492, de 1997, define as competências e regulamenta os serviços relativos ao protesto de títulos e outros documentos representativos de dívidas. O art. 1º define o protesto como "o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida".
9. Em seu art. 26, caput, a referida lei estabelece que "o cancelamento do registro do protesto será solicitado diretamente no Tabelionato de Protesto de Títulos, por qualquer interessado, mediando apresentação do documento protestado" (sem grifo no original).
10. A lei não dá espaço a diferentes interpretações. Vale dizer, sob o regime da referida lei, o cancelamento do protesto decorre de pedido formulado por qualquer interessado. O ponto relevante para a presente discussão na leitura da lei é o de que ela não impõe a ninguém a obrigação de providenciar o cancelamento. O que a lei faz é tão-somente dar a qualquer interessado a legitimidade para requerê-lo, sendo fácil identificar o interesse do devedor em tal medida.
11. Alguém poderia imaginar conflito entre o texto da lei e o do art. 43 e § 1º do Código de Defesa do Consumidor, que estabelecem:
[...]
12. Tal conflito, claramente se vê, inexiste. A Lei nº 9.492⁄97 trata de algo distinto do que foi regulado pelo CDC. Chamou-se atenção acima para a definição legal do protesto exatamente por isso: ele não se confunde com anotações feitas em cadastros de consumidores.
O protesto é ato formal, solene, e meio de prova de inadimplência. Os cadastros de consumidores (seja para proteção de crédito ou qualquer outra finalidade) não são mais do que simples cadastros.
13. Em outras palavras, a norma geral do CDC não tem aplicação no campo do protesto de títulos. Enquanto o CDC foca na relação privada entre consumidores e fornecedores de produtos e prestadores de serviços, a Lei nº 9.492⁄97, específica e posterior ao CDC, dá atenção aos efeitos que determinados eventos ocorridos nessa relação privada possam ter sobre toda a comunidade, por isso a relevância do protesto como ato formal e solene.
14. Além disso, uma interpretação sistêmica de nosso direito, no que tange ao problema aqui tratado, leva ao disposto no art. 395 do Código Civil, segundo o qual "responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa". Uma vez ocorrida a mora, os custos decorrentes da cobrança da dívida (e o protesto é necessário para a cobrança) devem ficar a cargo do devedor. Assim, não faz sentido, dentro do sistema jurídico brasileiro, que o credor seja obrigado a arcar com os custos relacionados à cobrança da dívida.
15. A jurisprudência dessa egrégia Corte é pacífica sobre o tema, tendo já as duas Turmas que compõem a Segunda Seção tido a oportunidade de examinar a questão e declarar o entendimento aqui defendido, assim como cada um dos Ministros que atualmente as integram. São exemplos dessa jurisprudência:
Da Terceira Turma: Ministra Nancy Andrighi: AgRg no Ag nº 768.161; AgRg no Ag 883.202; REsp 1.346.428; Ministro Sidnei Beneti: AgRg no Ag 768.161; AgRg no Ag 883.202; REsp 1.346.428; Ministro Paulo de Tarso Sanseverino: AgRg no Ag 883.202; REsp 1.346.428; Ministro Villas Bôas Cueva: REsp 1.346.428; Ministro João Otávio de Noronha: REsp 1.346.428; AgRg no REsp nº 1.140.350; Da Quarta Turma: Ministro Luis Felipe Salomão: AgRg no REsp nº 1.140.350; AgRg no AREsp nº 217.161; AgRg no REsp nº 906.875; Ministro Raul Araújo: AgRg no REsp nº 1.140.350; AgRg no AREsp nº 217.161; AgRg no REsp nº 906.875; Ministra Maria Isabel Gallotti: AgRg no REsp nº 1.140.350; AgRg no AREsp nº 217.161; AgRg no REsp nº 906.875; Ministro Antônio Carlos Ferreira: AgRg no AREsp nº 217.161; AgRg no REsp nº 906.875; Ministro Marco Buzzi: AgRg no AREsp nº 217.161; AgRg no REsp nº 906.875.
[...]
17. De todo o exposto, manifesta-se a FEBRABAN em absoluta sintonia com a jurisprudência dessa egrégia Corte ao interpretar o art. 26 da Lei nº 9.492, de 1997, que não impõe ao credor a obrigação de requerer o cancelamento de regular protesto de título, após o pagamento da dívida.
18. Por isso, pede e espera a FEBRABAN que a Segunda Seção firme orientação, para fins do regime de recursos repetitivos, no sentido de declarar que o cancelamento de protesto feito de forma regular, após o pagamento da dívida, não constitui obrigação do credor, representando, antes, responsabilidade do devedor e de qualquer outro interessado.
19. Essas as razões que pareceram próprias à formação do convencimento de Vossa Excelência quanto à matéria objeto de apreciação por essa Corte, com o registro do reconhecimento da relevância da iniciativa, indiscutivelmente útil a conferir ao tema a necessária segurança e previsibilidade.
O Ministério Público Federal opina no sentido de que "o presente recurso há de ser parcialmente conhecido e, no quanto conhecido, deve ser desprovido, prevalecendo, para os efeitos do artigo 543- C, do Código de Processo Civil, a tese de que após o pagamento do débito, o ônus de providenciar o cancelamento do protesto extrajudicial regularmente efetuado, à luz da Lei n. 9.492⁄1997, incumbe ao credor, não ficando, porém, o devedor, impedido de providenciá-lo".
É o relatório.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.339.436 - SP (2012⁄0172838-0)
RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
RECORRENTE : GETULIO FONSECA CARVALHO
ADVOGADO : LUÍS ROBERTO OLÍMPIO E OUTRO(S)
RECORRIDO : VAREJÃO CASA DA MAÇÃ LTDA - MICROEMPRESA
ADVOGADO : CARLOS A DEZOTTI E OUTRO(S)
INTERES. : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO - "AMICUS CURIAE"
ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
INTERES. : CONFEDERACAO NACIONAL DO COMERCIO DE BENS, SERVICOS E TURISMO - CNC - "AMICUS CURIAE"
ADVOGADO : CÁCITO AUGUSTO FREITAS ESTEVES E OUTRO(S)
INTERES. : ANDRÉ APPOLARI
INTERES. : ANFAC - ASSOCIAÇÃO NACIONAL DAS SOCIEDADES DE FOMENTO MERCANTIL - FACTORING - "AMICUS CURIAE"
ADVOGADOS : JOSÉ LUÍS DIAS DA SILVA E OUTRO(S)
LUIZ LEMOS LEITE
INTERES. : FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE BANCOS FEBRABAN - "AMICUS CURIAE"
ADVOGADOS : LUIZ CARLOS STURZENEGGER E OUTRO(S)
LUCIANO CORREA GOMES
THIAGO LUIZ BLUNDI STURZENEGGER
EMENTA
CANCELAMENTO DE PROTESTO EXTRAJUDICIAL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. ÔNUS DO CANCELAMENTO DO PROTESTO LEGITIMAMENTE EFETUADO. DEVEDOR. CONFORME DISPÕE O ART. 2º DA LEI N. 9.492⁄1997, OS SERVIÇOS CONCERNENTES AO PROTESTO FICAM SUJEITOS AO REGIME ESTABELECIDO NESTA LEI. ALEGAÇÃO DE O DÉBITO TER SIDO CONTRAÍDO EM RELAÇÃO DE CONSUMO. IRRELEVÂNCIA, POR SE TRATAR DE PROCEDIMENTO SUBMETIDO A REGRAMENTO ESPECÍFICO.
1. Para fins do art. 543-C do Código de Processo Civil: "No regime próprio da Lei n. 9.492⁄1997, legitimamente protestado o título de crédito ou outro documento de dívida, salvo inequívoca pactuação em sentido contrário, incumbe ao devedor, após a quitação da dívida, providenciar o cancelamento do protesto.
2. Recurso especial não provido.
VOTO
O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):
2. Não caracteriza, por si só, omissão, contradição ou obscuridade quando o tribunal adota outro fundamento que não aquele defendido pela parte.
Logo, não há falar em violação ao artigo 535 do Código de Processo Civil, pois o Tribunal de origem dirimiu as questões pertinentes ao litígio, afigurando-se dispensável que tivesse examinado uma a uma as alegações e fundamentos expendidos pelas partes.
Note-se:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ART. 535 DO CPC. VIOLAÇÃO. INOCORRÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO. FATO NOVO. MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 7 DO STJ.
1. "Tendo o Acórdão recorrido decidido as questões debatidas no recurso especial, ainda que não tenham sido apontados expressamente os dispositivos nos quais se fundamentou o aresto, reconhece-se o prequestionamento implícito da matéria, conforme admitido pela jurisprudência desta Corte" (AgRg no REsp 1.039.457⁄RS, 3ª Turma, Min. Sindei Beneti, DJe de 23⁄09⁄2008).
2. O Tribunal de origem manifestou-se expressamente sobre o tema, entendendo, no entanto, não haver qualquer fato novo a ensejar a modificação do julgado. Não se deve confundir, portanto, omissão com decisão contrária aos interesses da parte.
[...]
4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no Ag 1047725⁄SP, Rel. Ministro CARLOS FERNANDO MATHIAS (JUIZ FEDERAL CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO), QUARTA TURMA, julgado em 28⁄10⁄2008, DJe 10⁄11⁄2008)
3. Quanto ao mérito, o acórdão recorrido dispôs:
Dentre uma das teses de defesa, o apelante admite como praxe no comércio a devolução do titulo e a entrega de carta de anuência após a quitação da dívida, possibilitando ao protestado tomar providências quanto ao cancelamento do protesto.
A seguir, todavia, contesta também o pagamento, alegando que "não há prova da efetiva quitação do título." (fls. 54) A r. sentença julgou improcedente a ação porque o autor não trouxe para os autos comprovação documental do pagamento.
A negativação do nome do autor no 20 Tabelião de Protesto de Araras decorreu da não-compensação de um cheque emitido pelo autor e entregue ao requerido no dia 3 de abril de 2004. (fls. 08⁄09)
O documento de fls. 217 emitido pelo Banco Bradesco comprova que foi excluída a restrição do cheque no Banco Bradesco, com a via original entregue ao autor em 07 de julho de 2005.
Dessa forma, resta comprovado que houve pagamento da dívida, mas depois de protestado o título.
A negativação do nome do autor junto aos órgãos de proteção ao crédito ocorreu de forma lícita, em razão do inadimplemento do devedor.
Quanto ao apontamento, basta ao devedor, com a prova da quitação, requerer a retificação nos cadastros de inadimplência, pagando as custas do cancelamento conforme observação feita no título protestado às fls. 08.
[...]
Essa norma, por seu turno, guarda consonância com o artigo 26 da Lei n. 9.492⁄97 que atribui a qualquer interessado o ônus de requerer o cancelamento.
O atual Código Civil (art. 325), por sua vez, dispõe claramente que as despesas com o pagamento e a quitação do débito presumem-se a cargo do devedor, na verdade o maior interessado.
Nesse sentido, posição desta Câmara:
"Bem móvel⁄semovente - Ação de Indenização - Protesto - Manutenção do nome do devedor no cartório de protesto - Cancelamento que competia também ao devedor - Danos morais não configurados - Exegese do artigo 26, § 1º da Lei nº 9.492⁄97 - Recurso da autora improvido. Recurso da instituição financeira provido.
Cabe a qualquer dos interessados constantes do titulo o pedido extrajudicial tendente ao cancelamento do protesto, nos termos da lei. Se o credor não se opôs abusivamente a tal cancelamento, a cuja formalização o devedor é o maior interessado, não há danos morais passíveis de reconhecimento." (Ap. c⁄ rev. n0' 1. 192.222.00⁄3, Rei. REINALDO CALDAS, J. 21.08.2009). (fls. 299-302)
Assim, a questão controvertida consiste em saber se, regularmente efetuado o protesto extrajudicial, após o pagamento do débito concernente ao documento de dívida a que alude o art. 1º da Lei n. 9.492⁄1997, a teor do art. 26 do mesmo diploma legal, ordinariamente incumbe ao devedor ou ao credor providenciar o cancelamento.
4. O art. 26 Lei n. 9.492⁄1997 dispõe:
Art. 26. O cancelamento do registro do protesto será solicitado diretamente no Tabelionato de Protesto de Títulos, por qualquer interessado, mediante apresentação do documento protestado, cuja cópia ficará arquivada.
§ 1º Na impossibilidade de apresentação do original do título ou documento de dívida protestado, será exigida a declaração de anuência, com identificação e firma reconhecida, daquele que figurou no registro de protesto como credor, originário ou por endosso translativo.
§ 2º Na hipótese de protesto em que tenha figurado apresentante por endosso-mandato, será suficiente a declaração de anuência passada pelo credor endossante.
§ 3º O cancelamento do registro do protesto, se fundado em outro motivo que não no pagamento do título ou documento de dívida, será efetivado por determinação judicial, pagos os emolumentos devidos ao Tabelião.
§ 4º Quando a extinção da obrigação decorrer de processo judicial, o cancelamento do registro do protesto poderá ser solicitado com a apresentação da certidão expedida pelo Juízo processante, com menção do trânsito em julgado, que substituirá o título ou o documento de dívida protestado.
§ 5º O cancelamento do registro do protesto será feito pelo Tabelião titular, por seus Substitutos ou por Escrevente autorizado.
§ 6º Quando o protesto lavrado for registrado sob forma de microfilme ou gravação eletrônica, o termo do cancelamento será lançado em documento apartado, que será arquivado juntamente com os documentos que instruíram o pedido, e anotado no índice respectivo.
Por um lado, a teor do art. 1º, caput, da Lei n. 9.492⁄1997 e das demais disposições legais, o protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação [ou a recusa do aceite] originada em títulos e outros documentos de dívida. Por outro lado, o art. 2º do mesmo diploma esclarece que os serviços concernentes ao protesto, garantidores da autenticidade, publicidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos, ficam sujeitos ao regime estabelecido na referida Lei.
A controvérsia instalada nos presentes autos foi recentemente apreciada no âmbito desta Corte, tendo as Turmas de Direito Privado se manifestado a respeito.
Refiro-me ao AgRg no Ag 1.383.686⁄MT, rel. Ministra Isabel Gallotti, Quarta Turma e ao AgRg no AREsp 493.196⁄RS, rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma.
Os precedentes têm a seguinte ementa:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO MANTIDA. RESPONSÁVEL SOLIDÁRIO. INOVAÇÃO. INADMISSIBILIDADE. PROTESTO REGULAR. BAIXA. RESPONSABILIDADE DO DEVEDOR. SÚMULA 7⁄STJ. ÓBICE. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. Não se admite a adição de teses não expostas no recurso especial em sede agravo regimental, por importar em inadmissível inovação recursal. Precedentes.
2. A responsabilidade pela baixa do protesto, quando regular, é do devedor, não havendo que se falar em obrigação não cumprida pela instituição financeira. Precedentes.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no Ag 1383686⁄MT, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 17⁄10⁄2013, DJe 28⁄10⁄2013)
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AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PROTESTO REGULAR. OBRIGAÇÃO DE BAIXA. DEVEDOR.
1.- A jurisprudência desta Corte se firmou no sentido de que, se o protesto ocorreu no exercício regular de direito, o credor não está obrigado a providenciar a baixa do protesto.
2.- Agravo Regimental improvido.
(AgRg no AREsp 493.196⁄RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 22⁄05⁄2014, DJe 09⁄06⁄2014)
Ambos os precedentes estão embasados em outros julgados do STJ, seguindo-se, em síntese, a tese de que, se o protesto foi regularmente efetuado, a responsabilidade⁄interesse, no tocante ao seu cancelamento, é do devedor.
Registro que, no REsp 1.195.668⁄RS. Rel. p⁄ acórdão Ministra Maria Isabel Gallotti, fiquei vencido quanto ao ponto. Todavia, é bem de ver que a dispersão jurisprudencial deve ser preocupação de todos e, exatamente por isso, tenho afirmado que, se a divergência de índole doutrinária é saudável e constitui importante combustível ao aprimoramento da ciência jurídica, todavia o dissídio jurisprudencial é absolutamente indesejável (REsp. n. 753.159⁄MT).
5. De fato, refletindo com mais profundidade sobre a questão, atento ao caminho tomado pela iterativa jurisprudência do STJ e ao que propugna a doutrina, após profunda reflexão, revejo meu posicionamento pessoal.
Como visto, o art. 2º da Lei n. 9.492⁄1997, textualmente cria um microrregime próprio para o protesto de títulos e outros documentos de dívida ao dispor que "os serviços concernentes ao protesto" "ficam sujeitos ao regime estabelecido nesta Lei".
A doutrina especializada anota acerca do mencionado dispositivo:
Por força de tal dispositivo legal, as questões atinentes ao protesto ficam sujeitas aos termos da Lei n. 9.492, de 10-9-97, desprezando-se outras disposições.
[...]
Serviços de protesto, são, pois, todos aqueles constantes da Lei n. 9.492, de 10-9-97, verbi gratia, a distribuição, a protocolização, a intimação, o recebimento, o registro do protesto, as averbações, o cancelamento, o fornecimento de certidões e informações do protesto, entre outras atividades que são exercidas no Tabelionato de Protesto e que contam agora com uma legislação específica sobre o tema. (PARIZATTO, João Roberto. Protesto de títulos de crédito: Lei n. 9.492, de 10-09-97. 2 ed. Ouro Fino: Edipa, 1999, p.14)
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O presente artigo faz com que nos reportemos ao elencado nas noções históricas, para novamente realçar o quão importante foi a criação desta lei, dado que, a partir desse momento, não há mais que se falar em leis esparsas para tratar dos assuntos concernentes a protesto de títulos e outros documentos de dívida. (OLIVEIRA, Eversio Donizete de; BARBOSA, Magno Luiz. Manual prático do protesto extrajudicial. Belo Horizonte: Del Rey, 2002, p. 9 e 10)
Nesse passo, em vista da ênfase do declinado dispositivo de lei especial, é bem de ver que, consoante o abalizado magistério de Carlos Maximiliano, "[a]s disposições excepcionais são estabelecidas por motivos ou considerações particulares, contra outras normas jurídicas, ou contra o Direito comum", por isso que se diz que "a exceção confirma a regra nos casos não excetuados". (MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 20 ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2011, p. 69, 184, 191 e 192)
Com efeito, em vista dos critérios hermenêuticos de especialidade e cronologia, a solução para o caso deve ser buscada, em primeira linha, no Diploma especial que cuida dos serviços de protesto.
Ademais, em reforço de argumento, é bem de ver que, do cotejo entre os diplomas - consumerista e da Lei n. 9.492⁄1997 -, inequivocamente, a Lei excepcional adota um regime nitidamente diferenciado. Nesse passo, v.g., salta aos olhos o fato de que, enquanto o CDC estabelece, no art. 43, que os bancos de dados de cadastros de consumidores não podem conter informações negativas referentes a período superior a 5 anos e que, consumada a prescrição, não serão fornecidas informações pelos sistemas de proteção ao crédito que possam dificultar novo acesso ao crédito junto aos fornecedores; o art. 27 da Lei especial dispõe que o tabelião de protesto expedirá certidões, "que abrangerão o período mínimo dos cinco anos anteriores, contados da data do pedido".
A interpretação sistemática do ordenamento jurídico também conduz à interpretação de que, ordinariamente, incumbe ao devedor, após a quitação do débito, proceder ao cancelamento.
Embora o título de crédito, com a sua emissão, liberte-se da relação fundamental, em vista do princípio da incorporação, o adimplemento da obrigação cambial tem por consequência extinguir a obrigação subjacente que ensejou a sua emissão, sendo, em regra, pro solvendo; de modo que, salvo pactuação em contrário, só extingue a dívida, isto é, a obrigação que o título visa satisfazer consubstanciada em pagamento de importância em dinheiro, com o seu efetivo pagamento.
Dessarte, como bem observado pela Corte local, tendo em vista que o protesto regular é efetuado por decorrência de descumprimento da obrigação - ou recusa do aceite -, o art. 325 do CC estabelece que as despesas com o pagamento e quitação presumem-se a cargo do devedor.
Outrossim, não se pode ignorar que a quitação do débito estampado em título de crédito implica a devolução da cártula ao devedor (o art. 324 do CC, inclusive, dispõe que a entrega do título ao devedor firma a presunção de pagamento).
Com efeito, como o art. 26, caput, da Lei n. 9.492⁄1997 disciplina que o cancelamento do registro do protesto será solicitado mediante a apresentação do documento protestado (conforme o parágrafo 1º, apenas na impossibilidade de apresentação do original do título ou do documento de dívida protestado é que será exigida a declaração de anuência), é possível inferir que o ônus do cancelamento é mesmo do devedor, pois, a interpretação de que a lei especial estivesse dispondo que, mesmo com a quitação da dívida, o título de crédito devesse permanecer em posse do credor, seria temerária para com os interesses do devedor e eventuais coobrigados.
Nessa linha de intelecção, é bem de ver também que a documentação exigida para o cancelamento do protesto (título de crédito ou outro documento de dívida protestado, ou declaração de anuência daquele que figurou no registro de protesto como credor) também permite concluir que, ordinariamente, não é o credor que providenciará o cancelamento do protesto.
Por fim, arrematando, é bem de ver que o art. 19 da Lei n. 9.492⁄1997 estabelece que o pagamento do título ou do documento de dívida apresentado para protesto será feito diretamente no tabelionato competente, no valor igual ao declarado pelo apresentante, acrescido dos emolumentos e demais despesas - isto é, incumbe ao devedor que realizar o pagamento do débito antes do registro do protesto pagar emolumentos -; assim, não é razoável imaginar que, para o cancelamento após a quitação do débito, tivesse o credor da obrigação extinta que arcar com o respectivo montante, acrescido de tributos, que devem ser pagos por ocasião do requerimento de cancelamento.
6. Igualmente, não se ignora, à luz da realidade econômica e social, a relevância dos cadastros de inadimplentes, que, a par de servir como um legítimo instrumento de que se vale o credor para compelir o devedor a adimplir a obrigação, propicia de modo reflexo, a dinamização das relações econômicas e que um número maior de consumidores - que não estão em situação de inadimplência - tenha acesso ao crédito, pois torna prescindível "o conhecimento pessoal entre quem dá e quem recebe o crédito" (TOMAZETTE, Marlon. Tílulos de crédito. São Paulo: Atlas, 2009. v. 2, p. 161).
No entanto, cumpre observar que o protesto contempla espectro mais amplo de efeitos bastante relevantes, pois, v.g., faz prova da falta de pagamento, devolução ou aceite do título, é necessário ao pedido de falência por impontualidade injustificada, comprova a mora em contrato de alienação fiduciária em garantia e, na vigência do CC⁄2002 (art. 202, III), interrompe a prescrição para a execução cambial, tanto no que diz respeito ao devedor principal quanto a coobrigados.
Outrossim, o protesto, além de igualmente propiciar que os devedores sejam oportunamente alertados acerca de débitos vencidos e legitimamente compeli-los ao adimplemento, é bem de ver que dirime plenamente litígios, pois, a teor do art. 19 da Lei n. 9.492⁄1997, cabe também ao tabelião o recebimento do crédito devido, acrescido dos emolumentos e demais despesas, sendo também dever do delegatário do serviço público dar a respectiva quitação.
Ademais, o art. 2º do mesmo diploma esclarece que os serviços concernentes ao protesto são garantidores da autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos.
Dessarte, como observado em recente precedente da Quarta Turma do STJ, REsp 1.124.709⁄TO, como o art. 1º da Lei n. 9.492⁄1997 admite o protesto de títulos e outros "documentos de dívida" (entenda-se: prova escrita a demonstrar a existência de obrigação pecuniária, líquida, certa e exigível), a medida é bem menos severa ao devedor se comparada à execução, pois não envolve atos de agressão ao patrimônio, sendo certo que os órgãos de proteção ao crédito também fazem uso de dados de caráter público da distribuição do Judiciário, referentes a ações executivas, para "negativação" do nome dos executados.
O precedente tem a seguinte ementa:
TÍTULO DE CRÉDITO E PROTESTO CAMBIAL. RECURSO ESPECIAL. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. REEXAME DE PROVAS EM RECURSO ESPECIAL. INVIABILIDADE. INSCRIÇÃO EM CADASTRO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO ORIUNDA DE INFORMAÇÃO EXTRAÍDA DE BANCO DE DADO PÚBLICO, PERTENCENTE A CARTÓRIO DE PROTESTO. PRÉVIA NOTIFICAÇÃO. DESCABIMENTO. CHEQUE. PRAZO DE APRESENTAÇÃO. OBSERVÂNCIA À DATA DE EMISSÃO DA CÁRTULA. ENDOSSATÁRIO TERCEIRO DE BOA-FÉ. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INOPONIBILIDADE DAS EXCEÇÕES PESSOAIS. PROTESTO DE CHEQUE À ORDEM, AINDA QUE APÓS O PRAZO DE APRESENTAÇÃO, MAS DENTRO DO PERÍODO PARA AJUIZAMENTO DE AÇÃO CAMBIAL DE EXECUÇÃO. POSSIBILIDADE. PROTESTO CAMBIAL. NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 2002, INTERROMPE O PRAZO PRESCRICIONAL PARA AJUIZAMENTO DA AÇÃO CAMBIAL EXECUTIVA. SUPERAÇÃO, COM O ADVENTO DO NOVEL DIPLOMA CIVILISTA, DA SÚMULA 153⁄STF.
[...]
5. Tomadas essas cautelas, caracterizando o cheque levado a protesto título executivo extrajudicial, dotado de inequívoca certeza e exigibilidade, não se concebe possam os credores de boa-fé verem-se tolhidos quanto ao seu lídimo direito de resguardarem-se quanto à prescrição, tanto no que tange ao devedor principal quanto a coobrigados; visto que, conforme disposto no art. 202, III, do Código Civil de 2002, o protesto cambial interrompe o prazo prescricional para ajuizamento de ação cambial de execução, ficando, com a vigência do novel Diploma, superada a Súmula 153⁄STF.
6. Como o cheque levado a protesto ainda possuía executividade, a medida é bem menos severa ao emitente se comparada à execução do título de crédito, pois não envolve atos de agressão ao patrimônio do executado, sendo certo que os órgãos de proteção ao crédito também fazem uso de dados de caráter público da distribuição do Judiciário, referentes a ações executivas, para "negativação" do nome dos executados. Dessarte, como o art. 1º da Lei 9.492⁄1997, em cláusula aberta, admite o protesto de outros "documentos de dívida" (entenda-se: prova escrita a demonstrar a existência de obrigação pecuniária, líquida, certa e exigível), não há razoabilidade em entender que o protesto, instituto desde a sua origem concebido para protesto cambial, seja imprestável para o protesto facultativo de título de crédito.
7. Recurso especial não provido.
(REsp 1124709⁄TO, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 18⁄06⁄2013, DJe 01⁄07⁄2013)
7. Por último, cumpre observar que, como o próprio art. 26 da Lei n. 9.492⁄1997 estabelece que o cancelamento do registro do protesto poderá ser solicitado por qualquer interessado, não se está a dizer que não possam as partes pactuar que o cancelamento do protesto incumbirá ao credor (que passará a ter essa obrigação, não por decorrência da lei de regência, mas contratual).
De todo modo, a impossibilidade de retenção do documento protestado ressai clara, pois, quitado o débito, notadamente em se tratando de título de crédito, incumbe ao credor cambial simultaneamente devolver o título.
Com efeito, é entendimento consolidado nesta Corte Superior que, no tocante ao cancelamento do protesto regularmente efetuado, não obstante o artigo 26 da Lei n. 9.492⁄97 (Lei de Protestos) faça referência a "qualquer interessado", a melhor interpretação é a de que este é o devedor, de modo a pesar, ordinariamente, sobre sua pessoa o ônus do cancelamento.
Esse entendimento foi sufragado em inúmeros e recentes precedentes das duas Turmas que compõem a Segunda Seção. Confiram-se os julgados:
PROTESTO EXTRAJUDICIAL DE DUPLICATAS. RECURSO ESPECIAL. LOCAL A SER TIRADO PROTESTO DE DUPLICATA. PRAÇA DE PAGAMENTO CONSTANTE DO TÍTULO. ÔNUS DO CANCELAMENTO DO PROTESTO. DEVEDOR. REEXAME DE PROVAS, EM SEDE DE RECURSO [...]
2. Embora o artigo 26 da Lei 9.492⁄97 disponha que o cancelamento do registro do protesto será solicitado diretamente ao Tabelionato de Protesto de Títulos, por "qualquer interessado", conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a melhor interpretação é a de que o maior interessado é o devedor, de modo a pesar sobre ele o ônus do cancelamento.
3. Orienta a Súmula 7⁄STJ que a pretensão de reexame de provas não enseja recurso especial.
4. Recurso especial não provido.
(REsp 1015152⁄RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 09⁄10⁄2012, DJe 30⁄10⁄2012)
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PROTESTO REGULAR. PAGAMENTO POSTERIOR DO TÍTULO. OBRIGAÇÃO DE CANCELAMENTO DO PROTESTO. ART. 26 DA LEI Nº 9.492⁄97. PRECEDENTES DA CORTE.
"As turmas que compõem a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça já se manifestaram no sentido de que cabe ao devedor promover o cancelamento do protesto regularmente lavrado quando de posse do título protestado ou da carta de anuência do credor nos termos do que artigo 26 da Lei nº 9.492⁄97".
Agravo Regimental a que se nega provimento.
(AgRg no Ag 768.161⁄RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 17⁄02⁄2009, DJe 09⁄03⁄2009)
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RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. PROTESTO REALIZADO NO EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO. CANCELAMENTO APÓS A QUITAÇÃO DA DÍVIDA. INCUMBÊNCIA DO DEVEDOR. ART. 26, §§ 1º E 2º, DA LEI N. 9.294⁄97.
Protestado o título pelo credor, em exercício regular de direito, incumbe ao devedor, principal interessado, promover o cancelamento do protesto após a quitação da dívida.
Recurso especial não conhecido.
(REsp 842.092⁄MG, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, QUARTA TURMA, julgado em 27⁄03⁄2007, DJ 28⁄05⁄2007, p. 360)
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Protesto. Pagamento efetuado com atraso. Obrigação de cancelamento do protesto. Art. 26 da Lei nº 9.492⁄97. Precedente da Corte.
1. Como assentado em precedente da Corte, quando o protesto "foi realizado em exercício regular de direito (protesto devido), o posterior pagamento do título pelo devedor, diretamente ao credor, não retira o ônus daquele em proceder ao cancelamento do registro junto ao cartório competente" (REsp nº 442.641⁄PB, Relatora a Ministra Nancy Andrighi, DJ de 22⁄9⁄03).
2. Recurso especial conhecido e provido.
(REsp 665.311⁄RS, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em 21⁄06⁄2005, DJ 03⁄10⁄2005, p. 247)
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Civil. Agravo no agravo no recurso especial. Ação de compensação por danos morais. Protesto devido de duplicata. Posterior demora na baixa do protesto. Responsabilidade conferida ao devedor.
- Se o protesto de duplicata é realizado em exercício regular de direito, a posterior devolução de mercadorias pelo devedor não retira dele o ônus de proceder ao cancelamento do registro junto ao cartório competente. Precedentes.
Agravo não provido.
(AgRg no AgRg no REsp 799.600⁄SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 06⁄04⁄2006, DJ 02⁄05⁄2006, p. 326)
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EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. TÍTULO PROTESTADO. POSTERIOR QUITAÇÃO. CANCELAMENTO. ÔNUS DO DEVEDOR. INTERESSADO. RELAÇÃO DE CONSUMO. IRRELEVÂNCIA. DANOS MORAIS E DEVER DE INDENIZAR. AUSÊNCIA.
1. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental em face do nítido caráter infringente das razões recursais. Aplicação dos princípios da fungibilidade recursal e da economia processual.
2. Consoante jurisprudência desta Corte, é ônus do devedor, principal interessado, providenciar, após o pagamento da obrigação, o cancelamento do protesto legitimamente efetuado pelo credor, sendo irrelevante a circunstância de tratar-se de relação de consumo.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(EDcl no Ag 1414906⁄SC, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 07⁄02⁄2013, DJe 11⁄03⁄2013)
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PROCESSO CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL. CANCELAMENTO DO PROTESTO. ÔNUS DO DEVEDOR. RESSALVA DO RELATOR.
1. "Legitimamente protestado o título de crédito, cabe ao devedor que paga posteriormente a dívida o ônus de providenciar a baixa do protesto em cartório (Lei 9.294⁄97, art. 26), sendo irrelevante se a relação era de consumo, pelo que não se há falar em dano moral pela manutenção do apontamento" (REsp 1.195.668⁄RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Rel. p⁄ Acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 11⁄9⁄2012, DJe 17⁄10⁄2012). Ressalva do Relator.
2. Recurso especial provido.
(REsp 959.114⁄MS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 18⁄12⁄2012, DJe 13⁄02⁄2013)
8. Assim, a tese a ser firmada para efeitos do art. 543-C do Código de Processo Civil, que ora encaminho, é a seguinte:
"No regime próprio da Lei n. 9.492⁄1997, legitimamente protestado o título de crédito ou outro documento de dívida, salvo inequívoca pactuação em sentido contrário, incumbe ao devedor, após a quitação da dívida, providenciar o cancelamento do protesto".
9. No caso concreto, nego provimento ao recurso especial.
É como voto.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
SEGUNDA SEÇÃO
Número Registro: 2012⁄0172838-0
PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.339.436 ⁄ SP
Números Origem: 105105 10512005 11600230 116002300 1160023001 116002301 1957559286 380120050090321 5108234400 9294418122008826 92944181220088260000 992080038823
PAUTA: 10⁄09⁄2014 JULGADO: 10⁄09⁄2014
Relator
Exmo. Sr. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro RAUL ARAÚJO
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. PEDRO HENRIQUE TÁVORA NIESS
Secretária
Bela. ANA ELISA DE ALMEIDA KIRJNER
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : GETULIO FONSECA CARVALHO
ADVOGADO : LUÍS ROBERTO OLÍMPIO E OUTRO(S)
RECORRIDO : VAREJÃO CASA DA MAÇÃ LTDA - MICROEMPRESA
ADVOGADO : CARLOS A DEZOTTI E OUTRO(S)
INTERES. : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO - "AMICUS CURIAE"
ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
INTERES. : CONFEDERACAO NACIONAL DO COMERCIO DE BENS, SERVICOS E TURISMO - CNC - "AMICUS CURIAE"
ADVOGADO : CÁCITO AUGUSTO FREITAS ESTEVES E OUTRO(S)
INTERES. : ANDRÉ APPOLARI
INTERES. : ANFAC - ASSOCIAÇÃO NACIONAL DAS SOCIEDADES DE FOMENTO MERCANTIL - FACTORING - "AMICUS CURIAE"
ADVOGADOS : JOSÉ LUÍS DIAS DA SILVA E OUTRO(S)
LUIZ LEMOS LEITE
INTERES. : FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE BANCOS FEBRABAN - "AMICUS CURIAE"
ADVOGADOS : LUIZ CARLOS STURZENEGGER E OUTRO(S)
LUCIANO CORREA GOMES
THIAGO LUIZ BLUNDI STURZENEGGER
ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Obrigações - Espécies de Títulos de Crédito - Cheque
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia SEGUNDA SEÇÃO, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Seção, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Para os efeitos do artigo 543-C, do Código de Processo Civil, foi aprovada a seguinte tese: "No regime próprio da Lei nº 9.492⁄1997, legitimamente protestado o título de crédito ou outro documento de dívida, salvo inequívoca pactuação em sentido contrário, incumbe ao devedor, após a quitação da dívida, providenciar o cancelamento do protesto".
Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Buzzi, Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro e João Otávio de Noronha votaram com o Sr. Ministro Relator.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Raul Araújo.

sábado, 29 de novembro de 2014

Decisão da 1ª VRP/SP: Certidão de dados cadastrais (tributários) da Prefeitura não é documento hábil para averbação de construção.


Processo 1080525-55.2014.8.26.0100 – Dúvida – Registro de Imóveis – Iberinter Administração e Participações Ltda. – Pedido de providências pretensão de averbação de construção negada necessidade de apresentação de documento hábil pela PMSP (auto de conclusão da construção) certidão negativa de débitos da previdência insuficiente princípio da legalidade pedido indeferido

Vistos. Trata-se de pedido de providências formulado pelo 14º Oficial de Registro de Imóveis da Capital a requerimento de IBERINTER ADMINISTRAÇÃO E PARTICIPAÇÕES LTDA devido qualificação negativa de averbação da construção de imóvel situado à Rua Macarani, 43, matriculado sob nº 15.062. Aduz o Oficial (fls. 01/02) que o interessado requereu a supradita averbação sem apresentar documento hábil da PMSP para tanto, juntando apenas certidão dos dados cadastrais do imóvel e a Certidão Negativa de Débitos do INSS. Salienta que tal certidão diz respeito apenas à tributação e nada informa sobre o aspecto urbanístico, não informando se a construção é regular ou não. Juntou documentos (fls. 03/33). O interessado ofertou impugnação (fls. 34/36), informando constar no lançamento do IPTU a área construída de 190m2, igual à área constante na Certidão Negativa de Débitos da Previdência. Ademais, salienta não dispor de planta aprovada ou de auto de conclusão da construção, visto que ela é datada de 1983 e o antigo proprietário não os forneceu. O Ministério Público opinou pelo indeferimento do pedido (fls. 40). É o relatório. Decido. Com razão o Oficial e o Ministério Público. A exigência não configura excesso de burocracia ou formalismo, mas respeito ao princípio da legalidade estrita, que rege o direito registral. Segundo preleciona o desembargador Marco Aurélio Bezerra de Melo: “O atributo da legalidade impõe ao registrador que faça uma analise minuciosa sobre a legalidade do título e dos documentos apresentados, pois se encontrar proibição legal deverá recusar o registro. Se houver conflito entre a opinião do registrador e do interessado, deverá aquele suscitar o procedimento administrativo de dúvida.”. O registro de imóveis é fundamentalmente um instrumento de publicidade. Portanto, é necessário que as informações nele contidas coincidam com a realidade para que não se converta em elemento de difusão de inexatidões e fonte de insegurança jurídica, contrariando sua finalidade básica. Não se confundem o documento de que a construção é regular emitido pela PMSP (auto de conclusão ou regularização, habite-se, alvará de conservação ou planta aprovada, certificado de regularidade de edificação ou histórico da edificação) – e a Certidão Negativa de Débitos da Previdência. Pertencem a esferas diferentes, cada qual com seu âmbito de atribuição. A certidão tributária não se mostra suficiente, dado que o interesse fiscal nem sempre coincide com o interesse urbanístico. A questão não é nova e já foi objeto de análise, como se observa no parecer nº2014.00012438, que faz menção a outro, de nº 355/2008-E/ProcessoCG 2008-45342,da lavra do então Juiz Assessor Walter Rocha Barone, acolhido pelo Excelentíssimo Corregedor Geral da Justiça, Desembargador Ruy Pereira Camilo, no seguinte sentido: “Com efeito, o artigo 246, §1°, da Lei de Registros Públicos, estabelece que as averbações a que se referem os itens 4 e 5 do inciso II do artigo 167 – entre elas as averbações de construções – serão feitas a requerimento do interessado, com firma reconhecida, o qual deverá ser instruído com documento comprobatório fornecido pela autoridade competente. (grifei) No que concerne às averbações de construções, há a necessidade de que referido requerimento seja instruído, portanto, com documento comprobatório da regularidade da construção, expedido pela autoridade que seja competente para proceder a tal fiscalização, e que, como se sabe, não se confunde com a autoridade exclusivamente tributária que expediu a certidão de registro de lançamento de IPTU, cujo original foi juntado a fls.21/22, na medida em que os interesses tributários não coincidem, necessariamente, com os interesses urbanísticos. Para que seja cabível a averbação pretendida, o interessado deverá instruir seu requerimento, portanto, não só com a CND do INSS (fls.08), mas também com o ‘habite-se’ ou auto de conclusão, ou documento equivalente, que demonstre a regularidade da obra, como o alvará de regularização. A certidão de fls.21/22 não se presta, como visto, a demonstrar a regularidade da obra, já que diz respeito apenas à existência de lançamentos de IPTU a partir de 1993 sobre as áreas prediais ali indicadas, o que, porém, não permite concluir que a existência de tributação do imóvel, por si só, seja indicativa de que tenha sido realizada vistoria no prédio edificado, bem como que referida construção esteja de acordo com as posturas municipais. A questão não é nova no âmbito da Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, como se vê no parecer lançado no Processo CG nº1.043/06, da lavra do ilustre Juiz Auxiliar da Corregedoria, Dr. Roberto Maia Filho, aprovado pelo eminente Desembargador Gilberto Passos de Freitas, então Corregedor Geral da Justiça: ‘(…) No que concerne ao segundo pedido formulado, consistente na averbação de edificação realizada, não pode ele ser acolhido. Isto porque é mesmo indispensável a apresentação do Certificado de Conclusão ou do Auto de Regularização da Construção, expedidos pelo setor competente da municipalidade. Ao contrário do entendimento adotado pelo recorrente, tal formalidade não fica suprida pela existência de lançamento tributário, realizado por outro setor da administração pública local, ainda que este tenha considerado a existência da edificação em questão. Isto porque, como se sabe, cada órgão da administração pública só pode praticar atos dentro da sua esfera de atribuições e nos limites de sua competência funcional. Assim sendo, o eventual reconhecimento da edificação pela Secretaria Municipal de Finanças (fls. 48) tem fins exclusivamente tributários, não dispensando o formal pronunciamento do Departamento de Aprovação de Edificações (Aprov), integrante da Secretaria Municipal de Habitação, que é o órgão competente para reconhecer e certificar a regularidade da construção no caso concreto. Neste diapasão, reza o artigo 246 da Lei nº 6.015/73 (Lei dos Registros Públicos): Art. 246 – Além dos casos expressamente indicados no item II do artigo 167, serão averbados na matrícula as subrogações e outras ocorrências que, por qualquer modo, alterem o registro. § 1o As averbações a que se referem os itens 4 e 5 do inciso II do art. 167 serão as feitas a requerimento dos interessados, com firma reconhecida, instruído com documento comprobatório fornecido pela autoridade competente …. (Redação dada pela Lei n° 10.267, de 2001) – grifos não originais. No mesmo sentido dispõe o item 109 do Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça: 109. As averbações serão feitas a requerimento dos interessados, com firma reconhecida, instruído com documento comprobatório fornecido pela autoridade competente – grifos não originais.” Ante o exposto, julgo IMPROCEDENTE o presente pedido de providências, iniciado a requerimento de IBERINTER ADMINISTRAÇÃO E PARTICIPAÇÕES LTDA em face do 14º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA CAPITAL/SP, mantendo-se o entrave registrário. Não há custas, despesas processuais, nem honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. Oportunamente, arquivem-se os autos. P.R.I.C. – ADV: JOSE FERNANDES PEREIRA (OAB 66449/SP)

Fonte: DJE/SP | 03/10/2014.

sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Reconhecimento de Firma: Limites da Qualificação Notarial


Recentemente, um notário teve contra si a abertura de um Processo Administrativo Disciplinar por ter reconhecido firma num documento que exigia alvará judicial para a sua validade.

Além disso, tem-se notado o surgimento de diversas normas impondo dever de análise acurada do conteúdo documental para permitir o reconhecimento da firma pelo Tabelião de Notas. Isto precisa de um freio.

Por mais que o notário moderno esteja assumindo funções de guardião da estrita legalidade e da eficácia dos atos jurídicos, não se pode esquecer a natureza precípua do reconhecimento de firma bem como os limites da qualificação notarial para a prática do ato.

Algumas considerações são importantes acerca do que efetivamente é responsabilidade do Tabelião de Notas na prática do ato notarial de reconhecimento de firma.

Num primeiro momento, confecciona-se o cartão de autógrafos do usuário, para que fique arquivado na serventia seus padrões de assinatura. Aqui ocorre a primeira qualificação notarial que se consubstancia na análise do documento de identificação apresentado pela parte, bem como da sua capacidade natural.

Os documentos de identificação que podem ser aceitos estão em regra previstos em lei e incluem a cédula de identidade, as carteiras expedidas por órgãos controladores do exercício profissional (Art. 1º Lei 6206/75), a carteira de habilitação (Art. 159 da Lei 9503/97), a carteira de trabalho (Art. 40 CLT) e Passaporte. Ressalta-se que em alguns estados há disposição normativa expressa vedando o uso da carteira de trabalho e do passaporte para a abertura do cartão de autógrafos.

A higidez do documento apresentado deve ser analisada pelo Tabelião de Notas, podendo recusá-los quando contiver caracteres morfológicos geradores de insegurança, ou seja, quando estiverem replastificados, com foto muito antiga ou quando de qualquer forma não servirem para identificar o seu portador.

Estando hígido o documento de identificação, o notário deve proceder a analise da capacidade natural do usuário. Aqui a qualificação notarial incide somente sobre a vontade de entender e querer o reconhecimento de firma sem adentrar na manifestação de vontade constante do documento sobre o qual incidirá a assinatura reconhecida.

Não é crível exigir-se do notário uma análise detida do documento apresentado, uma vez que o ato a ser praticado é o de reconhecimento de firma, incidindo neste a qualificação e as responsabilidades.

Reconhecer significa admitir como certo, legítimo ou verdadeiro. Por seu turno, assinatura é o sinal gráfico produzido por uma pessoa para representar seu nome num documento, sendo em acepção notarial, sinônimo de firma.

Isto quer dizer que a qualificação notarial no reconhecimento de firma incide somente sobre os aspectos morfológicos da assinatura aposta no documento e não sobre o seu conteúdo.

Foge totalmente dos limites da qualificação notarial a verificação se o documento apresentado está sob a forma legal ou se contém alguma disposição ilícita.

Até mesmo porque o parágrafo único do artigo primeiro da Lei 10.169/2000 dispõe que os emolumentos são fixados em razão do efetivo custo e adequada e suficiente remuneração dos serviços prestados. Assim, para estender os limites da qualificação notarial no reconhecimento de firma devem-se levar em conta os custos de tais imposições.

Imagine-se que um funcionário tenha que ler todo o conteúdo de um contrato apresentado no balcão da serventia, cuidando para saber se não há forma prescrita em lei para o negócio, se alguma das partes precisa de representação ou assistência, ou ainda se há cláusula ilícita em seu conteúdo. Isso afetaria tanto a quantidade quanto a qualidade de funcionários que passariam a atender o balcão, bem como o tempo de atendimento e as filas em razão do alongamento no atendimento.

Por outro lado, ainda que o documento apresentado estivesse mesmo viciado pelas causas acima mencionadas o reconhecimento de firma não o validaria. Isto porque, como sobredito, o reconhecimento guarda relação apenas com o aspecto formal da assinatura.

Além disso, como ficariam os documentos redigidos em língua estrangeira? Não se exige tradução para o reconhecimento de firma em tais documentos. Então o Tabelião só poderia reconhecer se soubesse o idioma, pois teria que analisar todo o conteúdo do documento. Não se mostra lógica tal ilação.

Repita-se: a qualificação notarial no reconhecimento de firma guarda relação apenas com o aspecto morfológico da assinatura, não voltando sua eficácia ao teor do ato ou negócio jurídico nele constante.

Sendo o reconhecimento de firma uma análise formal da assinatura, impõe também uma análise formal do documento apresentado, justificando-se com isso a proibição de se reconhecer a assinatura em documentos sem data, incompletos ou que contenham demasiados espaços em branco. Isto para assegurar o mínimo de segurança ao próprio reconhecimento de firma e também em homenagem ao princípio da boa fé.

Portanto, deve-se limitar a qualificação notarial no ato de reconhecimento de firma, voltando-se apenas a aspectos morfológicos das assinaturas sem exigir do Tabelião de Notas o exame acurado do conteúdo do documento, sob pena de atribuir responsabilidades dissonantes à natureza do ato praticado.

Fonte: Site Notariado | 03/10/2014.
Por Luis Flávio Fidelis Gonçalves

Homem é ressarcido pela construção de casa em lote alheio

Um homem que construiu uma casa num terreno, após “Cessão de Direito de Posse”, e sem oposição do antigo dono da área, deverá ser ressarcido em R$ 49 mil. FC teria adquirido os direitos de posse de um imóvel no bairro Enseada das Garças, em Belo Horizonte. Em 2011, ele foi destituído do imóvel, por força de decisão liminar, em favor do réu, que ficou com as benfeitorias realizadas na área. Na Justiça, F.C. pediu ressarcimento pelo valor gasto na construção da casa.

Em sua defesa, A.N. argumentou que F.C. teria agido de má-fé, pois teria ingressado na posse do lote de forma violenta, destruindo parte do muro e construindo precariamente um barracão ali, tanto que a ação de reintegração de posse do terreno foi julgada procedente.

Em Primeira Instância, o pedido de F.C. foi negado e ele recorreu. Sustentou ter agido de boa-fé, afirmando que teria adquirido a posse do lote por um contrato de cessão de direitos, e que por isso fazia jus ao ressarcimento da quantia referente às benfeitorias e ao acréscimo patrimonial agregado ao imóvel objeto da ação.

O desembargador relator, Marcos Lincoln, verificou que F.C. ingressou na posse do imóvel após celebrar “Cessão de Direito de Posse” com o antigo dono do lote, S.F.F., tendo constado no contrato que o imóvel estava ocupado desde junho de 2000 sem oposição do proprietário, de modo que não havia como presumir a má-fé de F.C.

Considerando que F.C. possuía o documento, e que adquiriu a posse do antigo dono do imóvel, o desembargador relator afirmou que caberia ao réu comprovar a má-fé do autor da ação, mas isso não foi feito.  Assim, o desembargador relator modificou a sentença, condenando o proprietário do terreno a pagar a F.C. a quantia de R$ 49 mil. Os desembargadores Wanderley Paiva e Alexandre Santiago votaram de acordo com o relator.

Fonte: iRegistradores – Com informações do TJ/MG | 07/10/2014.

Quarta Turma do STJ restabelece proteção a bem de família penhorado após fraude contra credores

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a recurso especial que pedia que um imóvel de família não fosse incluído na massa falida da empresa Plásticos CB Ltda., de São Paulo. O relator, ministro Luis Felipe Salomão, entendeu que a penhora dos bens da empresa, devido à quebra do negócio decretada em 1999, não poderia ser estendida a um imóvel de família adquirido dez anos antes por um dos sócios, mesmo tendo havido a desconsideração da personalidade jurídica sob o argumento de fraude contra os credores.

“A desconsideração da personalidade jurídica não pode ser uma pena de expropriação universal dos bens dos sócios ou administradores da empresa devedora, tampouco uma solução para que todos os credores, indiscriminadamente, satisfaçam seus créditos na hipótese de insolvência do devedor”, disse Salomão.

A 3ª Vara Cível da Comarca de Guarulhos havia acolhido o pedido formulado pelo Ministério Público em agosto de 2005 e desconsiderou a personalidade jurídica da empresa para que os bens dos sócios fossem arrecadados. Segundo o MP, após decretada a quebra, alguns sócios entraram no local onde a Plásticos CB funcionava e promoveram um “saque”, levando equipamentos que estavam nas dependências da empresa.

Nobre propósito

Para Salomão, a desconsideração da personalidade jurídica, por si só, não autoriza a penhora do bem de família, a menos que o caso se relacione a uma das exceções previstas no artigo 3º da Lei 8.009/90 (a lei trata da impenhorabilidade do único imóvel residencial da família, e o artigo ressalva as hipóteses em que ele pode ser penhorado).

A desconsideração – acrescentou o relator – é um mecanismo importante para o fortalecimento da segurança do mercado, ao aumentar as garantias aos credores, mas “esse nobre propósito não se sobrepõe aos valores legais e constitucionais subjacentes à proteção do bem de família, e é bem por isso que a fraude à execução não se encontra prevista como exceção legal à impenhorabilidade de bens dessa categoria”.

Divergências

Luis Felipe Salomão disse que a questão levantada no recurso não é pacífica no STJ, que tem precedentes contra e a favor da penhorabilidade do bem de família diante de fraude contra a execução.

Ele mencionou um caso analisado recentemente pela Terceira Turma em que se discutiu a possibilidade de penhora de imóvel de família que, dias depois de seus donos serem intimados a pagar a dívida, foi doado a um menor (REsp 1.364.509). A Terceira Turma, diferentemente do que foi decidido no caso da Plásticos CB, entendeu que uma vez reconhecida a fraude contra a execução, o bem de família do devedor não deve receber a proteção legal da impenhorabilidade, sob pena de prestigiar-se a má-fé.

Segundo Salomão, as exceções da Lei 8.009 devem ser consideradas restritivamente, ou seja, não é possível aplicar analogias ou esforços interpretativos para afastar a proteção legal em situações não previstas expressamente – como no caso julgado, em que o Tribunal de Justiça de São Paulo aceitou a penhora do imóvel em razão da fraude contra os credores e da desconsideração da pessoa jurídica.

Crime

O ministro reconheceu que a conduta de subtrair bens da empresa após a decretação da falência é crime, e uma das exceções da Lei 8.009 (inciso VI do artigo 3º) é justamente a hipótese de ressarcimento de dano causado por ato criminoso, “mas obviamente nos limites do prejuízo experimentado pela vítima”. No entanto, ele observou que o inquérito respectivo foi arquivado a pedido do próprio Ministério Público com base no princípio da insignificância, em razão do baixo valor dos bens.

O relator afirmou que a proteção legal dada ao bem de família não é apenas para o devedor, mas também para sua família. De acordo com seu voto, “a determinação judicial de que, mediante desconsideração da personalidade jurídica da empresa falida, fossem arrecadados bens protegidos pela Lei 8.009 se traduz em responsabilização não apenas dos sócios pela falência do negócio, mas da própria entidade familiar, que deve contar com especial proteção do estado segundo o que determina a Constituição”.

O voto do ministro relator foi acompanhado de forma unânime pelos demais ministros.

A notícia refere-se ao seguinte processo: REsp 1433636.

Fonte: STJ | 08/10/2014.