sábado, 31 de maio de 2014

A ilegalidade das cláusulas de atraso nos contratos de compra e venda de imóvel na planta

Com a expansão imobiliária ocorrida nos grandes centros há pelo menos 10 anos, observou-se um visível aquecimento da economia deste setor, com o surgimento de incontáveis empresas voltadas à construção e incorporação de imóveis.

Este boom foi fomentado, em algumas cidades, pela elaboração e aprovação dos Planos Diretores de Desenvolvimento Urbano (PDDUs), estes que se tornaram obrigatórios com a edição da Lei n° 10.257/2001 (o Estatuto das Cidades), diploma normativo regulamentador dos arts. 182 e 183 da Constituição Federal.

Essa lei, de 2001, previu o seguinte no seu art. 41:

Art. 41. O plano diretor é obrigatório para cidades:

I – com mais de vinte mil habitantes;

II – integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas;

III – onde o Poder Público municipal pretenda utilizar os instrumentos previstos no § 4o do art. 182 da Constituição Federal;

IV – integrantes de áreas de especial interesse turístico;

V – inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional.

VI - incluídas no cadastro nacional de Municípios com áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos. (Incluído pela Lei nº 12.608, de 2012)

§ 1o No caso da realização de empreendimentos ou atividades enquadrados no inciso V do caput, os recursos técnicos e financeiros para a elaboração do plano diretor estarão inseridos entre as medidas de compensação adotadas.

§ 2o No caso de cidades com mais de quinhentos mil habitantes, deverá ser elaborado um plano de transporte urbano integrado, compatível com o plano diretor ou nele inserido. A partir de então, quase todos os municípios com economia significativa começaram o processo de elaboração, às vezes longo, do seu respectivo Plano Diretor, a ser constituído sob a forma de Lei Municipal.

Em conseqüência disso, os segmentos da sociedade passíveis de ser afetados pelas referidas leis, organizaram-se com o fim de exercer todo o “poder de barganha” possível em benefício dos seus representados, dada a importância das definições a cargo dos PDDUs, inclusive as referentes ao zoneamento do solo, e à definição de gabaritos de construção.

Um destes seguimentos – aliás, o mais forte -, é o apropriadamente chamado de “especuladores imobiliários”, que são investidores proprietários de terrenos nos grandes centros urbanos, adquiridos a baixo custo, que deixaram de lhes dar a destinação econômica adequada por longos anos, apenas para aguardar o dia em que estas áreas fossem super valorizadas.

Pela ação de alguns destes especuladores, grandes cidades amargaram uma imagem suja e sucateada, uma verdadeira “favelização”, muitas vezes à sombra do poder público que, conivente com os especuladores, fez vistas grossas ao descaso urbanístico causado, deixando de aplicar as penalidades legais aos especuladores - tais como o IPTU progressivo ou mesmo a despropriação-sanção.

E os especuladores resistiram, livres e soltos nas principais cidades do país, até o início do processo de elaboração dos Planos Diretores, quando exerceram todo o lobby que puderam nas Câmaras Municipais, para possibilitar uma normatização que favorecesse a valorização dos seus terrenos até então abandonados.

As histórias dos lobbys dos especuladores imobiliários junto a vereadores e até mesmo prefeitos são tão escabrosas, que basta uma simples busca na Internet para se constatar o grande número de notícias publicadas pela mídia sobre esse assunto. E isso não é de se estranhar, estando no Brasil, um país onde a iniciativa privada anda de mãos dadas com a política, e onde a atividade de “lobista”, que em tese poderia ser criminosa, é amplamente tolerada.  

Mas voltando ao tema, os especuladores tiveram sucesso na influência de muitos Planos Diretores aprovados no Brasil, e isso fomentou o boom das empresas ligadas ao seguimento imobiliário.

Muitos deles – os donos de terrenos - entraram no ramo da construção civil, e outros venderam seus terrenos a construtoras e incorporadoras criadas a partir deste aquecimento de mercado.

O mencionado fenômeno resultou no surgimento de inúmeras novas empresas, muitas sem qualquer know how ou planejamento na atividade de construção, verdadeiras aventureiras no setor.

Outras empresas, já tradicionais do ramo, também ampliaram seus negócios, de forma que seu crescimento desordenado e irresponsável as fez ficar equiparadas às companhias amadoras, igualmente desprovidas de planejamento nas ações de construção civil.

No entanto, a aventura tem um preço. E esse preço, no Brasil, ordinariamente, não é pago pelos aventureiros, e sim pelo consumidor.

Neste caso, a conta do crescimento desenfreado do mercado imobiliário foi justamente o atraso na entrega de quase a totalidade das unidades residenciais em construção. E foi aí que surgiu a idéia de repassar essa conta aos consumidores, com a criação da “cláusula de atraso” ou “cláusula de tolerância”.

A CLÁUSULA CONTRATUAL DE ATRASO OU DE TOLERÂNCIA.

Com os grandes centros urbanos parecendo verdadeiros canteiros de obra, com empresas de todo o tipo construindo e comercializando unidades imobiliárias na planta, o que se viu foi um verdadeiro descalabro de atrasos na entrega dos empreendimentos.

A grande maioria das construtoras não conseguia entregar as obras no prazo avençado e, ao mesmo tempo, não podia, quando da montagem do stand de vendas, divulgar maiores prazos de entrega aos consumidores, pois outras construtoras divulgariam prazos menores (correndo os riscos de arcar com multas contratuais, ou mesmo dando golpes na praça - fechando as portas e deixando os consumidores desamparados), e assim acabariam perdendo mercado. Portanto, o prazo usual de entrega de imóveis adquiridos na planta não deveria fugir à regra praticada, que variava entre 2 e 3 anos – do lançamento até o “habite-se”.

Foi aí que começaram a surgir as ditas “cláusulas de tolerância”, que, freqüentemente, permitem às construtoras e incorporadoras dilatarem, por mais 180 a 360 dias, a entrega dos empreendimentos o prazo de entrega contratualmente previsto. A referida cláusula, presente em quase a totalidade dos contratos, inaugurou um enorme conforto ao empresário e uma verdadeira armadilha ao consumidor.

A construtoras e incorporadoras continuavam a divulgar o prazo usual de entrega de 2 a 3 anos no material publicitário, mas começavam a utilizar a dilação de mais 180/360 dias para a efetiva conclusão das obras. E cabe observar que a utilização do prazo de tolerância nunca foi e ainda não é uma exceção. A argüição desta cláusula é fato já ordinário no mercado imobiliário.

No entanto, a referida imposição contratual – assim dita porque os contratos de compra de imóvel são todos de adesão – é totalmente ilegal e merece forte repressão do Poder Judiciário.

A ampla jurisprudência do país tem reconhecido que a imposição de “direito de atraso” ou “cláusula de tolerância”, colocada nos contratos de adesão pelas incorporadoras e construtoras constitui patente violação ao Código de Defesa do Consumidor.

Nesse sentido, colaciona-se abaixo recente e uníssona jurisprudência:

Imposição de um novo paradigma de boa-fé objetiva, equidade contratual e proibição da vantagem excessiva nos contratos de consumo (art. 51, IV)” (STJ, REsp.437.607, rel. Min. Hélio Quáglia Barbosa, 4ª T., j. 15/05/07, DJ 04/06/07). NÃO PODE A ESTIPULAÇÃO CONTRATUAL OFENDER O PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE, E SE O FAZ, COMETE A ABUSIVIDADE VEDADA PELO ART. 51, IV,  DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ANOTE-SE QUE A REGRA  PROTETIVA, EXPRESSAMENTE, REFERE-SE A UMA DESVANTAGEM EXAGERADA DO CONSUMIDOR, E AINDA, COM OBRIGAÇÕES INCOMPATÍVEIS COM A BOA-FÉ E A EQUIDADE”

(STJ, RESP 158,728, REL. MIN. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, 3ª T., J. 16/03/99, P.DJ 17/05/99) PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – ATRASO NA ENTREGA DA OBRA – INDENIZAÇÃO POR LUCROS CESSANTES – TEORIA DA IMPREVISÃO – INAPLICABILIDADE PRORROGAÇÃO DO PRAZO DE TOLERÂNCIA – CLÁUSULA ABUSIVA – CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. (...) 3. A cláusula que faculta à construtora o adiamento da entrega da obra por doze meses após o prazo previsto, sem qualquer justificativa para tanto, é abusiva e nula de pleno direito, por configurar nítido desequilíbrio contratual, rechaçado pelo Código de Proteção e Defesa do Consumidor.4. Recurso do autor provido parcialmente. Recurso da ré improvido. Decisão unânime.

(TJ/DF – 5ª T. Cív., Ap.Cív. nº48245/1998, Rel. Des. Adelith de Carvalho Lopes, julg.08.03.1999)EMENTA – COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL A PRESTAÇÃO PRAZO DE ENTREGA DO IMÓVEL COMPROMISSADO. INADIMPLÊNCIA DA COMPROMISSÁRIA VENDEDORA. PRAZO DE TOLERÊNCIA PRVISTO NO CONTRATO.Considera-se inadimplente a construtora e compromissária vendedora quando não faz entrega do bem compromissado no prazo previsto no contrato, autorizando o acolhimento do pedido de rescisão feito pelo compromissário comprador, com devolução de todas as parcelas pagas, devidamente corrigidas, mais juros de mora e outras penalidades previstas em contrato.O prazo de tolerância previsto em contrato somente é justificativa para a prorrogação do prazo contratual de entrega do imóvel compromissado quando ocorrer caso fortuito ou força maior devidamente comprovado nos autos.

(TJ/MJ – 7ª C. Cív., Ap. Cív. Nº361743-8, Rel. Des. José Afonso da Costa Côrtes, julg. 06.06.2002).REsp 331496/MG RECURSO ESPECIAL 2001/0086594-7:RESPONSABILIDADE CIVIL, CONSTRUTORA, DESCUMPRIMENTO, PRAZO, ENTREGA, IMÓVEL, INDEPENDÊNCIA, ALEGAÇÃO, ATRASO, MOTIVO, CORREÇÃO, DEFEITO, TERRENO, COMPROVAÇÃO, PROVA PERICIAL, EXISTÊNCIA, PRESUNÇÃO, EMPRESA, CONHECIMENTO, FATO, MOMENTO, CELEBRAÇÃO, CONTRATO, NÃO CARACTERIZAÇÃO, CASO FORTUITO, FORÇA MAIOR.TERMO FINAL, UTILIZAÇÃO, VALOR, ALUGUEL, BASE DE CALCULO, INDENIZAÇÃO, DATA, ENTREGA DAS CHAVES, JUÍZO, CARACTERIZAÇÃO, DATA, DISPONIBILIDADE, POSSE, IMÓVEL, AUTOR.

Assim, de acordo com o referido diploma, é nula de pleno direito toda e qualquer cláusula contratual abusiva, em contrato de adesão, aqui entendida como aquela que proporcione um desequilíbrio entre os sujeitos do negócio jurídico.

Neste ínterim, a “tolerância” em favor das construtoras ou incorporadoras, sem que tenha sido comprovado motivo de força maior ou caso fortuito, e sem que haja qualquer penalidade pelo atraso injustificado, é considerada ilegal, principalmente porque, via de regra, os contatos fixam altíssimas multas, juros e correções monetárias – e até mesmo a perda do imóvel pago – para o caso de inadimplemento de obrigações por parte dos consumidores.

E estas penalidades fixadas aos consumidores têm que guardar total correspondência às penalidades que devem, também, ser aplicadas às empresas para o caso de descumprimento contratual.

Vale dizer: todo contrato que fixa obrigações bilaterais, pressupõe uma relação sinalagmática. É uma “via de mão dupla”. E é nela que se manifesta o sinalágma inerente à própria bilateralidade característica dos contratos.

A relação sinalagmática, fundamentada na própria existência da obrigação da outra parte, nada mais é do que aquela que prevê que para a prestação de um contratante, deverá haver a contra-prestação do outro.

No caso concreto, tendo o consumidor quitado o valor dentro do prazo avençado, a empresa deveria efetuar sua contra-prestação (entrega do imóvel) também dentro do prazo avençado. Mas tal não ocorre porque ela tem “imunidade” quanto ao direito de descumprir o prazo. Isso é ilógico e, como já vimos, completamente ilegal!

Portanto, a permanecer válida este tipo de cláusula, resta configurado um patente desequilíbrio contratual.

Aliás, o raciocínio da necessidade da manutenção do equilíbrio contratual pode e deve ser aplicado a toda e qualquer cláusula do ajuste, daí porque não se pode impor multa, juros ou quaisquer outras penalidades ao consumidor, sem que a outra parte possua punição proporcionalmente correlata.

E nem se invoque o princípio do pacta sunt servanda (respeito aos pactos) para estes casos, pois já não cabe nem mais gastarmos tempo com dissertações sobre a relativização deste postulado quando se trata de contrato de adesão, que é aquele ajuste bilateral onde a outra parte não pode alterar e nem discutir as cláusulas que lhes são impostas. Esta é uma teoria amplamente superada e rechaçada pela doutrina e pela jurisprudência pátria.

Assim, a vista do que foi exposto, não há fundamento, seja ele legal ou mesmo doutrinário, para a aceitação de qualquer cláusula, em contrato de adesão de compra e venda de imóvel, que autorize a construtora ou incorporadora a descumprir o prazo de conclusão da obra que constar do seu material publicitário ou que for, de alguma forma, informado ao consumidor como data limite para a entrega do bem.

Tal violação deve ser convertida em perdas e danos e pode abranger não somente os danos morais decorrentes da expectativa frustrada, como também os materiais relativos ao proveito econômico que o consumidor deixou de perceber com o imóvel que não foi entregue no prazo avençado.

Em paralelo, devem os órgãos do Poder Executivo protetivos dos direitos do consumidor (PROCONS, CODECONS, etc.) zelar, com a aplicação de sanções, para que as empresas não utilizem este tipo de cláusula nos contratos de adesão de compra e venda de imóveis, bem como o Ministério Público com a atribuição temática na área de defesa dos consumidores, manejar os instrumentos aptos a responsabilizar aquele que, a seu critério, descumprir a legislação de consumo correlata.


LUNELLI, Rômulo Gabriel M.. A ilegalidade das cláusulas de atraso nos contratos de compra e venda de imóvel na plantaJus Navigandi, Teresina, ano 19n. 394621 abr. 2014. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/27785>. Acesso em: 29 maio 2014.

Leia mais: http://jus.com.br/artigos/27785/a-ilegalidade-das-clausulas-de-atraso-nos-contratos-de-compra-e-venda-de-imovel-na-planta#ixzz33K8m0ihW

Entendimento do STJ diz que é possível inventariar direito sobre imóvel adquirido por promessa de compra e venda ainda não registrada


A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) permitiu a inclusão em inventário dos direitos oriundos de um contrato de promessa de compra e venda de lote, ainda que sem registro imobiliário.
Seguindo o voto do relator, ministro Luis Felipe Salomão, a Turma reconheceu que a promessa de compra e venda identificada como direito real ocorre quando o instrumento público ou particular é registrado no cartório de imóveis, o que não significa que a ausência do registro retire a validade do contrato.
Em seu voto, o ministro relator observou que compromisso de compra e venda de um imóvel é suscetível de apreciação econômica e transmissível a título inter vivos ou causa mortis, independentemente de registro. Trata-se de um negócio jurídico irretratável, tal qual afirma a Lei 6.766/79.
Da mesma forma como ocorre nessa lei, o Código Civil classifica como um direito real o contrato de promessa de compra e venda registrado em cartório. Entretanto, "a ausência de registro da promessa de compra e venda não retira a validade da avença".
Outras instâncias
No caso, a mãe do falecido, herdeira, pediu o arrolamento dos direitos sobre um lote em condomínio, objeto de contrato de promessa de compra e venda, nos autos de inventário de bens deixados pelo filho. O pedido foi negado. Ela interpôs agravo de instrumento, mas o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) negou o recurso.
O tribunal mineiro entendeu que, "estando o bem imóvel de forma irregular, em nome de terceiro, não há que se falar em arrolamento de direitos, ainda que decorrentes de contrato de promessa de compra e venda; vez que o imóvel somente se transmite em propriedade por escritura/registro, para, só então, proceder-se ao arrolamento/inventário para transmiti-Ia aos herdeiros, em partilha".
A herdeira recorreu ao STJ sustentando que o Código Civil atribuiu ao contrato de promessa de compra e venda caráter de direito real. Também invocou o Código de Processo Civil, na parte em que diz que deverá constar das primeiras declarações a relação completa de todos os bens e direitos do espólio. Sustentou que os direitos decorrentes de um contrato de promessa de compra e venda de bem imóvel se incluem no conceito de direitos a serem inventariados.
Equívoco
O ministro Salomão afirmou que o TJMG equivocou-se ao desprezar a validade do contrato de promessa de compra e venda, negando o pedido de inclusão dos direitos oriundos dele. Esclareceu que "é facultado ao promitente comprador adjudicar compulsoriamente imóvel objeto de contrato de promessa de compra e venda não registrado".
Além disso, afirmou, a Lei 6.766 admite a transmissão de propriedade de lote tão somente em decorrência de averbação da quitação do contrato preliminar, independentemente de celebração de contrato definitivo, por isso que deve ser inventariado o direito daí decorrente.
Esta notícia se refere ao processo: REsp 1185383

Formas de cessão de direitos hereditários


Íntegra do acórdão:
Acórdão: Apelação Cível n. 1.0016.10.009330-7/001, de Alfenas.
Relator: Des. Rogério Medeiros.
Data da decisão: 09.02.2012.                      
EMENTA: APELAÇÃO - AÇÃO DE OBRIGAÇAO DE FAZER - OUTORGA DE ESCRITURA - CONTRATO PARTICULAR DE PROMESSA DE CESSÃO DE DIREITOS - BEM EM NOME DO FALECIDO - AUSENCIA DE FORMA PÚBLICA - DEMAIS HERDEIROS - PRESSUPOSTO VÁLIDO DE CONSTITUIÇÃO DO PROCESSO - CARENCIA DA AÇÃO. O negócio jurídico firmado entres as parte intitula-se "instrumento particular de promessa cessão de direitos e ação à herança". Tal entabulação foi feita sem a concordância dos demais herdeiros, uma vez que inexiste assinatura dos mesmos no contrato. Ademais o imóvel objeto da pretensão outorga de escritura esta registrado em nome do de cujus. A carência de ação do autor está evidenciada nos autos, pois de acordo certidão cartorária, fls.80/81, o imóvel encontra-se registrado em nome do falecido. A pretensão contida na inicial só seria razoável caso o bem estivesse sobejamente individualizado dentre a universalidade dos bens que compõem a entidade despersonalizada, qual seja, o espólio. Além disso, seria necessária a concordância de todos e herdeiros e interessados e a forma pública do ato.
APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0016.10.009330-7/001 - COMARCA DE ALFENAS - APELANTE(S): MARIA APARECIDA ZAULI - APELADO(A)(S): LANDRE E CASTRO LTDA - RELATOR: EXMO. SR. DES. ROGÉRIO MEDEIROS
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 14ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador VALDEZ LEITE MACHADO , incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM ACOLHER PRELIMINAR E JULGAR EXTINTO O PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO.
Belo Horizonte, 09 de fevereiro de 2012.
DES. ROGÉRIO MEDEIROS - Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O SR. DES. ROGÉRIO MEDEIROS:
VOTO
LANDRE E CASTRO LTDA ajuizou ação de obrigação de fazer em face de MARIA APARECIDA ZAULI.
As súplicas do autor visam que a ré seja forçada a promover os meios necessários para formalizar a transferência definitiva do imóvel no Cartório de Registro de Imóveis de Alfenas e, ou, lavrar e firmar a competente Escritura Pública de Cessão de direitos hereditários, sob pena de multa. O referido imóvel se encontra situado na rua Juscelino Barbosa, 974, Alfenas, MG.
Citada, a ré apresentou peça de defesa, arguindo preliminares de ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, bem como carência de ação por falta de interesse de agir. No mérito, refutou as alegações da parte autora e rogou pela improcedência dos pedidos.
Impugnação à contestação constante as fls. 117/126.
As fls. 327, tem-se decisão do juiz a quo concedendo vista às partes para especificarem provas.
As partes suplicaram pela produção pelo depoimento pessoal, bem como pela oitiva de testemunhas e, ainda, pela juntada de novos documentos que entendem úteis para o deslinde do feito.
O magistrado de primeiro grau rejeitou as preliminares e autorizou o depósito judicial pleiteado pelo autor, conforme fls. 130.
Audiência de tentativa de conciliação restou frustrada, conforme ata de fls. 134.
Sobreveio o julgamento antecipado da lide as fls. 134/137, em que o ilustre julgador de primeiro grau entendeu pela procedência do pedido constante na peça vestibular. Sendo assim, a ré foi condenada a outorgar, em favor da autora, escritura definitiva de venda e compra do imóvel objeto da lide, de modo a possibilitar a transmissão domínio, no prazo de trinta dias, contados a partir do trânsito em julgado, independente de qualquer outra formalidade, sob pena de incorrer em multa diária de R$ 3.000,00 (três mil reais). A ré foi condenada ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes arbitrados em R$ 2.000,00 (dois mil reais), corrigidos pela tabela da Corregedoria Geral de Justiça a partir da data da sentença. Igualmente, foi registrado que a quantia depositada nos autos será liberada para a ré após o cumprimento da sentença e o pagamento das verbas sucumbências, salvo se a ré incidir em multa diária, quando o numerário amortizará essa verba.
Inconformada a ré apresentou recurso de apelação as fls.140/148. Em sede de preliminar, discorreu sobre ausência de pressuposto válido do processo pela falta do espólio de Ivo Zauli no pólo passivo da lide. Ademais, salientou que o negócio jurídico firmado entre as partes traz a data em que a autora deveria ter feito o pagamento e não o fez. Discorreu, ainda, que a cláusula décima terceira do instrumento particular de promessa de cessão de direito à herança estabelece não deixa dúvida de que a transcrição da compra e venda e cessão ocorrerá somente após o registro do formal de partilha.
Preparo regular.
A autora apresentou contrarrazões as fls. 167/176, pugnando pela manutenção da sentença.
PASSO A DECIDIR.
Preliminar - ausência de pressuposto válido do processo e carência de ação
Primeiramente, destaco que o negócio jurídico firmado entres as parte intitula-se "instrumento particular de promessa cessão de direitos e ação à herança". O negócio jurídico foi firmado após a morte do proprietário do imóvel. Ademais, tal entabulação foi feita sem a concordância dos demais herdeiros, uma vez que inexiste assinatura dos mesmos no contrato.
Enfatizo que o imóvel objeto da lide esta registrado em nome do de cujus Ivo Zauli, certidão de fls. 80/81.
No caso em julgamento, face as nuances apresentadas, tenho pela impossibilidade de cessão de direitos hereditários recaindo sobre um bem determinado pertencente à herança.
O Código Civil de 2002 prevê em seu artigo 1.793 que "o direito à sucessão aberta, bem como o quinhão de que disponha o co-herdeiro, pode ser objeto de cessão por escritura pública".
Por sua vez, o §2º do citado artigo dispõe ser "ineficaz a cessão, pelo co-herdeiro, de seu direito hereditário sobre qualquer bem da herança considerado singularmente".
Como cediço, cessão de direitos hereditários trata-se de negócio jurídico inter vivos, entre o herdeiro (cedente) e outro indivíduo, herdeiro ou não (cessionário), podendo ocorrer, tão somente, após a abertura da sucessão.
Por meio do referido negócio jurídico, o cedente transfere ao cessionário, por escritura pública, a título oneroso ou gratuito, parcial ou integralmente, o quinhão que lhe cabe na herança.
Sobre o tema, trago à baila a lição da ilustre doutrinadora Maria Helena Diniz, in Direito Civil Brasileiro, 6º volume, Direito das Sucessões, Saraiva, 16ª ed., 2002, São Paulo:
A herança é um valor patrimonial, mesmo que os bens que a constituam não estejam individualizados na quota dos herdeiros; daí a possibilidade de sua transmissão por ato inter vivos, independentemente de estar concluído o inventário. É a hipótese em que se configura a cessão da herança, gratuita ou onerosa, consistindo na transferência que o herdeiro, legítimo ou testamentário, faz a outrem de todo o quinhão hereditário ou de parte dele, que lhe compete após a abertura da sucessão (RT, 613:95, 528:110, 513:76, 462:209, 461:107).
Duas são as formas de cessão de direitos hereditários: uma a título universal, quando um ou mais de um herdeiro cede, no todo ou em parte, seus quinhões hereditário, incidindo a cessão sobre a totalidade dos bens; outra a título singular, melhor dizendo, sobre um bem certo e determinado.
A carência de ação do autor está evidenciada nos autos, pois de acordo certidão cartorária, fls.80/81, o imóvel encontra-se registrado em nome do falecido.
O Código Civil disciplina em seu art. 1.245 que a propriedade imóvel é transferida mediante o registro na matrícula do Imóvel, e somente aquele que detém a propriedade pode conceder a transferência do domínio, não sendo este o caso dos autos.
Além disso, os documentos constantes no caderno processual não comprovam que a ré, ora apelante, em algum momento, detinha o domínio sobre o imóvel objeto do litígio, portanto, não pode figurar no pólo passivo em relação à obrigação de fazer (outorga de escritura pública).
Coligi jurisprudência:
"AÇÃO DE OUTORGA DE ESCRITURA C/C RESSARCITÓRIA. BEM IMÓVEL. CONTRATO PARTICULAR DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. TÍTULO DE AQUISIÇÃO EM NOME DOS PROMITENTES VENDEDORES INEXISTENTE. TRANSCRIÇÃO NO REGISTRO IMOBILIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. EXTINÇÃO DO DO FEITO SEM EXAME DO MÉRITO.
Tratando-se de imóveis, para que se processe a aquisição, o título aquisitivo, ou seja, o documento que materializa a alienação, como a escritura (contrato) de compra e venda, deverá ser inscrito no Registro Imobiliário. A partir deste momento, o adquirente torna-se proprietário; antes não". (TJMG, Apelação nº 2.0000.00.403117-0, Rel. Des. Unias Silva, j. 27/11/2003).
Ademais, a cessão de direitos não constitui modo de adquirir propriedade, visto que os herdeiros só podem transferir o domínio da herança após o registro do formal de partilha, pois a universalidade de bens que adquiriram é indeterminada, deixando de ser indefinida somente após a partilha.
Ora, trata-se de instrumento particular de promessa de cessão de direitos hereditários, configurando apenas obrigação de fazer (art. 639 do CPC) e não de venda do imóvel.
Como já dito, o art. 1.793 do Código Civil permite que o herdeiro disponha de seu quinhão por escritura pública. A meus sentir, quem pode o mais (cessão por escritura pública) pode o menos (cessão por instrumento particular):
Note-se que a exigência de ser feita a cessão por escritura pública não impede a cessão por instrumento particular, apenas os efeitos são diferentes, pois enquanto aquela confere o direito real, com direito de seqüela, esta confere apenas um direito pessoal, que se converte em perdas e danos se não cumprida a obrigação.
Aqui, importante destacar que a autora, ora apelada, ao interpor a ação em epígrafe, visou a transferência definitiva de imóvel pertencente ao falecido.
Além disso, chamo a atenção para a exigência feita pela lei, especificamente no art. 1.794 do Código Civil, que dispõe que "O co-herdeiro não poderá ceder a sua quota hereditária a pessoa estranha à sucessão, se outro co-herdeiro a quiser, tanto por tanto",
No ensinamento de Clóvis Bevilaqua, "a propriedade a posse da herança transmitem-se, desde o momento da morte do de cujus, aos herdeiros legítimos e testamentários, sem necessidade de ato algum da parte dele'' (Código Civil Comentado, Comentários ao art. 1572, Editoria Rio, l975, vol. V, pág. 744),
Além do mais, a manifestação de vontade externada pelos herdeiros podia ser feita por promessa de cessão de direito hereditários, o que não ocorreu no caso voga. Ressalto, ainda, que inexistiu a forma pública do ato.
Dessa forma, a legislação determinou forma para validar a cessão de direito, qual seja, a forma pública.
A meu sentir, a pretensão contida na inicial só seria razoável caso o bem estivesse sobejamente individualizado dentre a universalidade dos bens que compõem a entidade despersonalizada, qual seja, o espólio. Além disso, seria necessária a concordância de todos e herdeiros e interessados.
O contrato como apresentado é ineficaz para a pretensão almejada na exordial. Contudo, ressalvo que poderá a autora, em ação própria, discutir a não realização do contrato, com as devidas perdas e danos, cláusula penal, dentre outros.
Pelo exposto, a despeito do brilhantismo do julgador de primeiro grau, ACOLHO A PRELIMINAR, para julgar o feito extinto sem julgamento do mérito, nos termos do artigo 267, IV, do Estatuto Processual Civil. Condeno a autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.000,00, nos termos do artigo 20, § 4º, do CPC.
Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): ESTEVÃO LUCCHESI e VALDEZ LEITE MACHADO.
SÚMULA : ACOLHERAM PRELIMINAR E JULGARAM EXTINTO O PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO.

STJ. Art. 935 do CC/2002. Sentença penal condenatória. Principal efeito no juízo cível. Interpretação


"O principal efeito civil de uma sentença penal é produzido pela condenação criminal, pois a sentença penal condenatória faz coisa julgada no cível. O próprio Código Penal, em seu art. 91, I, diz que são efeitos extrapenais da condenação criminal tornar certa a obrigação de reparação dos danos. Do mesmo modo, o CPC, em seu atual art. 475-N, quando trata dos títulos executivos judiciais, coloca entre eles a sentença penal condenatória, atribuindo-lhe o condão de ensejar o cumprimento de sentença, apenas exigindo antes uma fase de liquidação de sentença. Reconhece, desse modo, que é título executivo judicial, não sendo necessária nova ação de conhecimento para o reconhecimento da responsabilidade. A regra do art. 63 do CPP vai exatamente na mesma linha, ao permitir que "transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução, no juízo cível, para o efeito de reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros". Esse conjunto de normas, que encontramos em vários pontos do nosso ordenamento jurídico, mostra que a relevância da sentença penal condenatória, que faz coisa julgada no cível, tornando certa a obrigação de reparação dos danos. Em 2008, o CPP sofreu importantes alterações pela Lei nº 11.719⁄2008, que acrescentou dois enunciados normativos relacionados à reparação dos danos causados pelo ato criminoso. De um lado, no art. 387, inciso IV, estabeleceu-se que, na sentença penal condenatória, o juiz fixará um valor mínimo para a reparação dos danos, considerando os prejuízos sofridos pela vítima (CPP, art. 387, IV - fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido). De outro lado, acrescentou-se um parágrafo único no art. 63, permitindo que, "transitada em julgado a sentença condenatória, a execução poderá ser efetuada pelo valor fixado nos termos do inciso IV do caput do art. 387 deste Código sem prejuízo da liquidação para a apuração do dano efetivamente sofrido". Em suma, o juiz poderá fixar, na sentença penal condenatória, um valor mínimo a título de indenização pelos danos causados pelo evento criminoso, em face das provas produzidas no processo penal, que poderá ser objeto, desde logo, de execução. Ademais, a vítima, que não foi parte no processo-crime, poderá postular, na esfera cível, a ampliação do montante da indenização, demonstrando que os prejuízos sofridos foram mais amplos do que aqueles contemplados pela indenização mínima arbitrada pela sentença penal condenatória. Além dessa eficácia mais conhecida da sentença penal condenatória, existem também situações em que a sentença absolutória criminal também faz coisa julgada no cível, sendo bastante clara a regra do art. 65 do Código de Processo Penal, já aludida, ao estatuir que "faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de um direito". Essa regra compreende as causas excludentes da antijuridicidade. Com isso, não apenas se houver condenação criminal, mas também se houver absolvição criminal, reconhecendo uma excludente da ilicitude, essa decisão fará coisa julgada no cível. Desse modo, a independência entre as instâncias é apenas relativa, valendo a regra não apenas para a hipótese de condenação criminal, mas também para algumas situações de absolvição criminal. A independência efetiva entre os juízos cível e criminal aparece nas hipóteses previstas pelos arts. 66 e 67, que indicam as situações em que ela ocorre. A principal é a absolvição por falta de provas, que é o caso mais comum, o famoso art. 386, inciso VI, do CPP. Frequentemente, o juiz adota esse fundamento para a absolvição criminal exatamente para não fechar a porta da discussão cível em torno do fato. Além disso, têm-se o arquivamento do inquérito policial, a decisão que julga extinta a punibilidade, especialmente pela prescrição (arts. 107 e 108 do Código Penal) e a sentença absolutória que reconhece que o fato não constitui crime. Os artigos 66 e 67 do CPP, pois, indicam as hipóteses em que é possível a rediscussão da matéria na esfera cível, embora não tenha havido condenação criminal na esfera penal".

Acórdão: Recurso Especial n. 1.180.237 - MT.
Relator: Min. Paulo de Tarso Sanseverino.
Data da decisão: 19.06.2012.

sexta-feira, 30 de maio de 2014

1ª VRP/SP: Dúvida – Registro de Imóveis – 14º Oficial de Registro de Imóveis – Samambaia Participações e Representações Ltda – Registro de imóveis – dúvida – imóvel cujo domínio está indisponível por ordem judicial – possibilidade de locação, mas não da inscrição (lato sensu) de cláusula de vigência ou de cláusula de preferência em caso de alienação do imóvel – a averbação de indisponibilidade, decorrente de ordem legalmente expedida e inscrita anteriormente, retira da propriedade imobiliária a sua disponibilidade – dúvida procedente.


Processo 0074228-83.2013.8.26.0100 – Dúvida – Registro de Imóveis – 14º Oficial de Registro de Imóveis – Samambaia Participações e Representações Ltda – Registro de imóveis – dúvida – imóvel cujo domínio está indisponível por ordem judicial – possibilidade de locação, mas não da inscrição (lato sensu) de cláusula de vigência ou de cláusula de preferência em caso de alienação do imóvel – a averbação de indisponibilidade, decorrente de ordem legalmente expedida e inscrita anteriormente, retira da propriedade imobiliária a sua disponibilidade – dúvida procedente. CP 428 O 14º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo suscitou dúvida (fls. 02/05), a requerimento de Samambaia Participações e Representações Ltda., que teve negada sua pretensão de registro de instrumento particular de locação para fins não-residenciais do imóvel objeto da matrícula 98.904 (fls. 10/18). Informa o suscitante que o título recebeu qualificação negativa por estar o imóvel indisponível (mat. 98.904 – indisponibilidade Av.10 – extraído dos autos nº 0009844-30.2004.8.19.0001- 18ª Vara Cível do Rio de Janeiro/ RJ), o que impede registro de contrato de locação com cláusula de vigência e a averbação de direito de preferência, em caso de alienação do imóvel locado (Conselho Superior da Magistratura – CSM, Apelação Cível – Apel. Cív 100.237-0/0 – São José dos Campos), uma vez que a indisponibilidade tem plena eficácia nos casos de alienação voluntária (CSM, Apel. Cív. 0902966-77.2012.8.26.0037), a que poderá conduzir o registro da locação, quando houver, eventualmente, o exercício do direito de preferência ; além disso, a exceção prevista no Provimento CG 13, de 11 de maio de 2012, art. 22, só se aplica a alienações, onerações e constrições judiciais, o que não é o caso da locação. Sustenta a interessada que a indisponibilidade não impede que o titular de domínio contrate a locação do bem e, portanto, não obsta o registro do contrato para fins de vigência em caso de alienação (Lei 8.245, de 18 de outubro de 1991 – LL91, art. 8º, caput). O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida (fls. 66/67). É o relatório. DECIDO. Conforme precedentes desta Vara de Registros Públicos (autos 100.09.348422-3, Juiz Gustavo Henrique Bretas Marzagão, j. 23.02.2010, DJe 09.03.2010), do Colendo Conselho Superior da Magistratura (Apel. Cív. 100.237-0/0 – São José dos Campos, Rel. Des. Luiz Tâmbara, j. 10.12.2003) e da E. Corregedoria Geral da Justiça (Processo CG 55381/2009, parecer do juiz Álvaro Augusto Valery Mirra, j. 03.09.2009, DJe 17.09.2009), a indisponibilidade do bem, inclusive aquela que resulta de penhora, conforme a Lei n. 8.212, de 24 de julho de 1991, art. 52, § 1º, impede a inscrição de cláusula de vigência ou de preferência estipuladas em contrato de locação de imóvel urbano, para a hipótese de alienação. De acordo com a doutrina do professor Luiz Guilherme Loureiro: “A indisponibilidade de bens é forma especial de inalienabilidade e impenhorabilidade, impedindo o acesso de títulos de disposição ou oneração, ainda que formalizados anteriormente à decretação da inalienabilidade (Ap 029.886-0/4, SP,j. 04.06.1996)” (Registros Públicos – Teoria e Prática, 2ª ed revista e atualizada, editora Método) Portanto, se a locação não se contrapõe à indisponibilidade (uma e outra estão em planos diferentes), o mesmo não se dá com essas inscrições (lato sensu), que vão ao plano real – e, portanto, não podem ser admitidas, enquanto indisponibilidade houver. Não vislumbro qualquer irregularidade cometida pelo Oficial de Registros de Imóveis. A averbação de indisponibilidade, decorrente de ordem legalmente expedida e inscrita anteriormente, retira da propriedade imobiliária a sua disponibilidade. As indisponibilidades em questão foram averbadas regularmente e por determinação de autoridade competente. Se do titular dominial se retira o poder de dispor da coisa que, como no caso, ficou à disposição do Juízo, nenhum título tendente a onerar ou transmitir a propriedade imobiliária pode ser admitido no Registro de Imóveis. O entrave deverá ser mantido sobre o imóvel até a decisão definitiva da pendência judicial que o originou. O cancelamento se dará diretamente pela autoridade responsável pela constrição, encaminhada ao 14º RISP. Não é competência de Juízo Corregedor Permanente, no âmbito administrativo, emitir decisão capaz de cancelar a indisponibilidade ou relativiza-la. Conforme o Provimento CG nº 13/2012 Artigo 4º – As indisponibilidades de bens decretadas por Juízos de outros Tribunais e por Órgãos Administrativos que detenham essa competência legal poderão ser incluídas por seus respectivos emissores na Central de Indisponibilidade de Bens na forma prevista neste Provimento. Parágrafo 1º – As comunicações de indisponibilidades recebidas até a data da publicação do presente Provimento serão inseridas na Central de Indisponibilidade pela Diretoria da Corregedoria Geral da Justiça (DICOGE 1.2). Após essa data, as solicitações encaminhadas para comunicações genéricas de indisponibilidade de bens a oficiais registradores de imóveis, oriundas de autoridades judiciárias e administrativas deste e de outros Estados da Federação, serão devolvidas aos respectivos remetentes com a informação de que, para tal desiderato, podem utilizar o sistema ora instituído ou fazê-lo de forma específica, diretamente à serventia de competência registral, indicando o nome do titular de domínio ou direitos reais atingidos, o endereço do imóvel e o número da matrícula. Do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida suscitada pelo 14º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo, a requerimento Samambaia Participações e Representações Ltda. Não há custas, despesas processuais nem honorários advocatícios. Oportunamente arquivem-se os autos. P.R.I.C. São Paulo, 27 de março de 2014. Tânia Mara Ahualli JUÍZA DE DIREITO (CP 428) – ADV: CARLOS CORREIA DE SOUZA (OAB 125375/SP) (D.J.E. de 07.04.2014 – SP)

Fonte: DJE/SP | 07/04/2014.

Questão esclarece acerca da irrevogabilidade do mandato conferido ao incorporador nos termos do art. 31, § 1º da Lei nº 4.591/64.

Pergunta: Considerando o art. 31, § 1º da Lei nº 4.591/64, pergunto: o mandato conferido ao incorporador para que este conclua todos os negócios tendentes à alienação das frações ideais de terreno pode ser revogado?

Resposta: Mario Pazutti Mezzari, com maestria, assim explica:

"O mandato outorgado para essa finalidade – incorporação imobiliária – é irrevogável. Apesar de não constar expressamente no texto do § 1º do artigo 31 da Lei nº 4.591, de 1964, a irrevogabilidade dessa procuração vem das regras gerais consignadas no Código Civil, especialmente no parágrafo único do artigo 686, que dispõe:

'É irrevogável o mandato que contenha poderes de cumprimento ou confirmação de negócios encetados, aos quais se ache vinculado'.

Há, entre o proprietário do terreno e o incorporador, uma relação bilateral, um contrato que define obrigações e direitos, inclusive pecuniários, de cada partícipe. Com base no mandato outorgado pelo proprietário do terreno, o incorporador poderá gestionar junto às autoridades públicas, contratar profissionais e, muito especialmente, contratar a alienação das futuras unidades autônomas e sua fração ideal de terreno. Ora, como poderia se imaginar que, 'ad nutum' do mandante, pudesse ser revogada a procuração?

Em se tratando de mandato irrevogável, não se extingue nem mesmo com a morte do mandante. Seus sucessores sub-rogar-se-ão em seus direitos e obrigações, mas o mandato permanecerá gerando os efeitos necessários à efetivação da incorporação e de todos os negócios, atos e contratos a ela inerentes. O registro da incorporação imobiliária, com arquivamento de documentos, projetos, memoriais etc., foi criado para proteger os futuros adquirentes de unidades autônomas, e estes não podem ser prejudicados pela morte do mandante proprietário do terreno. O incorporador e os compradores não ficarão à mercê dos herdeiros ou sucessores do mandante, nem participará de suas eventuais brigas ou discordâncias quanto à partilha dos bens.

Concordo com o brocardo latino que diz 'quod abundam non nocit' e creio mesmo que o legislador poderia ter incluído no citado § 1º do artigo 31 da Lei nº 4.591, de 1964, que o incorporador será investido de mandato 'irrevogável', chamando a atenção para esse fato e obrigando que o mesmo constasse, como cláusula expressa, no instrumento a ser lavrado pelo Notário. Dessa maneira, deixaria inequívoca a natureza do mandato outorgado, espancaria dúvidas e eliminaria o risco de que alguém, desavisadamente, venha a tentar revogar tal tipo de procuração. Mas, mesmo não constando na lei especial, obedece à regra geral do parágrafo único do artigo 606 Código Civil e é, portanto, um mandato irrevogável. (MEZZARI, Mario Pazutti. "Condomínio e Incorporação no Registro de Imóveis", 3ª ed., Norton Editor, Porto Alegre, 2010, p. 133-134).

Finalizando, recomendamos sejam consultadas as Normas de Serviço da Corregedoria-Geral da Justiça de seu Estado, para que não se verifique entendimento contrário ao nosso. Havendo divergência, proceda aos ditames das referidas Normas, bem como a orientação jurisprudencial local.

Fonte: IRIB (www.irib.org.br) | 08/04/2014.

STJ: Cooperativa de crédito pode ter taxa de juros fixada por conselho de administração



Não é abusiva a previsão estabelecida no estatuto de cooperativa de crédito de que a taxa de juros remuneratória seja fixada pelo conselho de administração, contanto que se mantenha dentro dos limites da média praticada pelo mercado. Este foi o entendimento da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar recurso de uma cooperativa de crédito, relatado pelo ministro Luis Felipe Salomão.

Em 2003, um cooperado ajuizou ação contra a Cooperativa de Economia e Crédito Mútuo dos Funcionários da Secretaria da Fazenda de Minas Gerais (Coopsef). Disse que em 1999 tomou empréstimo de R$ 54 mil, a ser pago em 48 parcelas, porém “não foi contratada qualquer taxa de juro".

Posteriormente, apurou em extrato que a cooperativa acresceu ao saldo devedor R$ 12.870,70. Contestou que as parcelas pagas não foram suficientes nem para amortizar os encargos cobrados, e que, de maio de 1999 até novembro de 2002, pagou R$ 87.219,48 e mesmo assim continuou devendo R$ 70.548,54.

Juros

O cooperado afirmou na ação que, como não havia estipulação de juros contratuais, a taxa aplicável seria a legal, de acordo com o Código Civil de 1916, limitada a 6% ao ano, ao contrário dos valores praticados (entre 47,98% e 71,94% ao ano).

Em primeiro grau, a ação foi julgada improcedente. Ao julgar a apelação, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) deu razão ao cooperado, por entender que a taxa de juros remuneratórios, quando não contratada, deve ser a legalmente prevista para os casos em que as partes não convencionaram.

A cooperativa, então, recorreu ao STJ. O relator iniciou seu voto reconhecendo que as cooperativas de crédito, de acordo com a Lei 4.595/64, são instituições financeiras, embora não se confundam com bancos. Assim, está correto o entendimento do TJMG de não haver submissão dos juros remuneratórios cobrados pelas cooperativas de crédito às limitações da Lei de Usura.

O ministro Salomão destacou que o contrato de mútuo pactuado pelas partes constitui ato cooperativo, que não caracteriza operação de mercado praticada por entidades bancárias. Ele lembrou que o juiz, ao julgar a ação improcedente, baseou-se em laudo pericial para concluir que “o mercado pratica taxas médias de juros bem superiores às constatadas”.

Estatuto

No caso, a estipulação dos juros remuneratórios pelo conselho de administração da cooperativa, conforme previsão estatutária, foi feita antes mesmo de o cooperado integrar a cooperativa, também não constando no contrato de mútuo a taxa de juros cobrada.

O relator ressaltou que a adesão ao estatuto social das cooperativas é automática pelos cooperados e que os juros são uma das formas pelas quais a entidade arrecada contribuições de seus associados e lhes propicia vantagem em relação aos custos de mercado. Conforme o ministro, a Lei 5.764/71 estabelece que pode haver o rateio de despesas na razão direta dos serviços usufruídos.

Por isso, Salomão não considerou desarrazoada e abusiva, por si só, a previsão estatutária de que a taxa de juros remuneratória seja fixada pelo conselho de administração e amplamente divulgada, “inclusive pelo jornal da cooperativa”, desde que se mantenha dentro dos limites da média praticada pelo mercado.

A notícia refere-se ao seguinte processo: REsp 1141219.

Fonte: STJ | 07/04/2014.

quinta-feira, 29 de maio de 2014

DIREITO CIVIL. IMPOSSIBILIDADE DE PURGAÇÃO DA MORA EM CONTRATOS DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA FIRMADOS APÓS A VIGÊNCIA DA LEI 10.931/2004. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).

Nos contratos firmados na vigência da Lei 10.931/2004, que alterou o art. 3º, §§ 1º e 2º, do Decreto-lei 911/1969, compete ao devedor, no prazo de cinco dias após a execução da liminar na ação de busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida – entendida esta como os valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial –, sob pena de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária. De início, convém esclarecer que a Súmula 284 do STJ, anterior à Lei 10.931/2004, orienta que a purgação da mora, nos contratos de alienação fiduciária, só é permitida quando já pagos pelo menos 40% (quarenta por cento) do valor financiado. A referida súmula espelha a redação primitiva do § 1º do art. 3º do Decreto-lei 911/1969, que tinha a seguinte redação: “Despachada a inicial e executada a liminar, o réu será citado para, em três dias, apresentar contestação ou, se já houver pago 40% (quarenta por cento) do preço financiado, requerer a purgação de mora.”  Contudo, do cotejo entre a redação originária e a atual – conferida pela Lei 10.931/2004 –, fica límpido que a lei não faculta mais ao devedor a purgação da mora, expressão inclusive suprimida das disposições atuais, não se extraindo do texto legal a interpretação de que é possível o pagamento apenas da dívida vencida. Ademais, a redação vigente do art. 3º, §§ 1º e 2º, do Decreto-lei 911/1969 estabelece que o devedor fiduciante poderá pagar a integralidade da dívida pendente e, se assim o fizer, o bem lhe será restituído livre de ônus, não havendo, portanto, dúvida acerca de se tratar de pagamento de toda a dívida, isto é, de extinção da obrigação. Vale a pena ressaltar que é o legislador quem está devidamente aparelhado para apreciar as limitações necessárias à autonomia privada em face de outros valores e direitos constitucionais. A propósito, a normatização do direito privado desenvolveu-se de forma autônoma em relação à Constituição, tanto em perspectiva histórica quanto em conteúdo, haja vista que o direito privado, em regra, disponibiliza soluções muito mais diferenciadas para conflitos entre os seus sujeitos do que a Constituição poderia fazer. Por isso não se pode presumir a imprevidência do legislador que, sopesando as implicações sociais, jurídicas e econômicas da modificação do ordenamento jurídico, vedou para alienação fiduciária de bem móvel a purgação da mora, sendo, pois, a matéria insuscetível de controle jurisdicional infraconstitucional. Portanto, sob pena de se gerar insegurança jurídica e violar o princípio da tripartição dos poderes, não cabe ao Poder Judiciário, a pretexto de interpretar a Lei 10.931/2004, criar hipótese de purgação da mora não contemplada pela lei. Com efeito, é regra basilar de hermenêutica a prevalência da regra excepcional, quando há confronto entre as regras específicas e as demais do ordenamento jurídico. Assim, como o CDC não regula contratos específicos, em casos de incompatibilidade entre a norma consumerista e a aludida norma específica, deve prevalecer essa última, pois a lei especial traz novo regramento a par dos já existentes. Nessa direção, é evidente que as disposições previstas no CC e no CDC são aplicáveis à relação contratual envolvendo alienação fiduciária de bem móvel, quando houver compatibilidade entre elas. Saliente-se ainda que a alteração operada pela Lei 10.931/2004 não alcança os contratos de alienação fiduciária firmados anteriormente à sua vigência. De mais a mais, o STJ, em diversos precedentes, já afirmou que, após o advento da Lei 10.931/2004, que deu nova redação ao art. 3º do Decreto-lei 911/1969, não há falar em purgação da mora, haja vista que, sob a nova sistemática, após o decurso do prazo de 5 (cinco) dias contados da execução da liminar, a propriedade do bem fica consolidada em favor do credor fiduciário, devendo o devedor efetuar o pagamento da integralidade do débito remanescente a fim de obter a restituição do bem livre de ônus. Precedentes citados: AgRg no REsp 1.398.434-MG, Quarta Turma, DJe 11/2/2014; e AgRg no REsp 1.151.061-MS, Terceira Turma, DJe 12/4/2013. REsp 1.418.593-MS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 14/5/2014.

Fonte: Informativo nº. 0540 do STJ | Período: 28 de maio de 2014.

1ª VRP|SP: Reclamação – Pedido de redução de 50% sobre os valores relativos ao registro – O bem deve ser financiado pelo Sistema Financeiro de Habitação (SFH) – Parte do pagamento feito com saldo vinculado ao FGTS, o que não se confunde com financiamento gerado no âmbito de programas custeados com fundos do FGTS – Reclamação arquivada.

0027824-18.2013 Reclamação José Olímpio Rodrigues Batista Junior 10º Ofício de Registro de Imóveis da Capital – Vistos. Trata-se de reclamação proposta por José Olímpio Rodrigues Batista Junior em face da negativa do Oficial do 10º Registro de Imóveis da Capital em conceder o desconto de 50% (cinquenta por cento) sobre os emolumentos referentes ao registro de seu primeiro imóvel (matriculado sob nº 130.939). Alega o reclamante que ainda teve que pagar a quantia adicional de R$ 667,42 (seiscentos e sessenta e sete reais e quarenta e dois centavos), referente ao imposto ITBI. Relata que a aquisição do imóvel foi realizada através de financiamento junto à Caixa Econômica Federal (CEF), com a utilização do seu FGTS, em conformidade com as instruções pertinentes ao SFH. Requer o ressarcimento do valor de R$ 1.627,22 (um mil, seiscentos e vinte e sete reais e vinte e dois centavos), equivalente a 50% dos valores pagos pelos serviços, mais R$ 667,42 do imposto relativo ao ITBI. Segundo informações do Oficial do 10º Registro de Imóveis da Capital (fls. 35), o reclamante adquiriu o imóvel com recursos próprios, parte deles com saque da sua conta vinculada ao FGTS, sem qualquer financiamento, portanto não incide a redução dos emolumentos, bem como a isenção parcial do ITBI. Instado a se manifestar acerca das informações prestadas pelo Oficial registrador, o reclamante manteve-se inerte, conforme certidão de fl. 42. É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir. A reclamação posta contra o Oficial do 10º Registro de Imóveis da Capital não procede. De acordo com o artigo 290 da Lei 6.015/73 e a Tabela estipulada na Lei Estadual nº 11.331/02, para ser cabível a redução de 50% sobre os valores relativos ao registro, o bem deve ser financiado pelo Sistema Financeiro de Habitação (SFH). Todavia, ao que se denota do documento juntado às fls.22/24, intitulado “Contrato por instrumento particular de compra e venda de imóvel residencial urbano sem financiamento, com utilização dos recursos da conta vinculada do fundo de garantia do tempo de serviço FGTS”, mais especificamente da cláusula B – “Valor de Compra e Venda e Forma de Pagamento”, tem-se que: “… O preço da venda é de R$ 435.000,00 (quatrocentos e trinta e cinco mil reais) que o (s) VENDEDOR (ES), neste ato, declara (m) ter recebido do seguinte modo: R$ 350.806,68 (trezentos e cinquenta mil, oitocentos e seis reais e sessenta e oito centavos) diretamente do (s) comprador (es), em moeda corrente nacional e R$ 84.193,32 (oitenta e quatro mil, cento e noventa e tres reais e trinta e dois centavos) da CEF, por conta e ordem do (s) COMPRADOR (ES) correspondente ao valor debitado na conta vinculado do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço FGTS do (s) COMPRADOR (ES), por conta e ordem dos mesmo (s) COMPRADOR (ES), operação essa realizada em conformidade com as instruções pertinentes ao Sistema Financeiro da Habitação SFH”. (g.n). Neste diapasão, com razão o Oficial Registrador. Na presente hipótese o reclamante pagou com recursos próprios o valor de R$ 350.806,68, e apenas o saldo remanescente foi debitado da conta vinculada ao FGTS, o que não se confunde com financiamento gerado no âmbito de programas custeados com fundos do FGTS. Portanto, não houve qualquer financiamento pelo SFH, e consequentemente não incide o desconto de 50% previsto na Lei 6.015/73 e nem a isenção parcial do imposto relacionado ao ITBI. De qualquer modo, mesmo intimado para esclarecer e fundamentar o seu pedido, o reclamante demonstrou desinteresse (fl.42), deixando de embasar o seu pedido. Diante do exposto, INDEFIRO a reclamação proposta por José Olímpio Rodrigues Batista Junior em face do Oficial do 10º Registro de Imóveis da Capital e, consequentemente, julgo extinto o feito com resolução do mérito, nos termos do artigo 269, I do CPC. Oportunamente, ao arquivo. P.R.I.C. São Paulo, 26 de março de 2014. Tania Mara Ahualli Juíza de Direito (CP 303). (D.J.E. de 04.04.2014 – SP)

Fonte: DJE/SP | 04/04/2014.

TJ/SP: CONSTRUÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE DEVE SER DEMOLIDA

A 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão da Comarca de Ubatuba para determinar a demolição de uma construção em região de área de preservação permanente. Também condenou a proprietária do terreno e a Prefeitura, subsidiariamente, a providenciar a recuperação de vegetação suprimida e remoção de entulho do local.      

De acordo com o processo, foi construída uma pousada no loteamento Saloma, em Ubatuba, com autorização da Prefeitura, que aprovou o projeto e expediu alvará.  

O relator do recurso, desembargador Torres de Carvalho, afirmou em seu voto que a construção em área de preservação permanente exige autorização dos órgãos ambientais e não apenas a autorização do Município. “Sem a apresentação da licença ambiental, as construções devem ser desfeitas e a área deve ser recuperada. Não se admite o desrespeito à legislação ambiental; e a ela devem amoldar-se as atividades exercidas em seu entorno e não o contrário. É o respeito ao ambiente em que todos vivemos, inquilinos de um mundo que não é nosso e que devemos entregar aos nossos filhos, e eles aos filhos deles, sempre em melhores condições.”      

Os desembargadores João Negrini Filho e Moreira Viegas acompanharam o voto do relator.

A notícia refere-se a apelação: 0003734-61.2009.8.26.0642.

Fonte: TJ/SP | 04/04/2014.

DIREITO CIVIL. IMPOSSIBILIDADE DE PURGAÇÃO DA MORA EM CONTRATOS DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA FIRMADOS APÓS A VIGÊNCIA DA LEI 10.931/2004. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).

Nos contratos firmados na vigência da Lei 10.931/2004, que alterou o art. 3º, §§ 1º e 2º, do Decreto-lei 911/1969, compete ao devedor, no prazo de cinco dias após a execução da liminar na ação de busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida – entendida esta como os valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial –, sob pena de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária. De início, convém esclarecer que a Súmula 284 do STJ, anterior à Lei 10.931/2004, orienta que a purgação da mora, nos contratos de alienação fiduciária, só é permitida quando já pagos pelo menos 40% (quarenta por cento) do valor financiado. A referida súmula espelha a redação primitiva do § 1º do art. 3º do Decreto-lei 911/1969, que tinha a seguinte redação: “Despachada a inicial e executada a liminar, o réu será citado para, em três dias, apresentar contestação ou, se já houver pago 40% (quarenta por cento) do preço financiado, requerer a purgação de mora.”  Contudo, do cotejo entre a redação originária e a atual – conferida pela Lei 10.931/2004 –, fica límpido que a lei não faculta mais ao devedor a purgação da mora, expressão inclusive suprimida das disposições atuais, não se extraindo do texto legal a interpretação de que é possível o pagamento apenas da dívida vencida. Ademais, a redação vigente do art. 3º, §§ 1º e 2º, do Decreto-lei 911/1969 estabelece que o devedor fiduciante poderá pagar a integralidade da dívida pendente e, se assim o fizer, o bem lhe será restituído livre de ônus, não havendo, portanto, dúvida acerca de se tratar de pagamento de toda a dívida, isto é, de extinção da obrigação. Vale a pena ressaltar que é o legislador quem está devidamente aparelhado para apreciar as limitações necessárias à autonomia privada em face de outros valores e direitos constitucionais. A propósito, a normatização do direito privado desenvolveu-se de forma autônoma em relação à Constituição, tanto em perspectiva histórica quanto em conteúdo, haja vista que o direito privado, em regra, disponibiliza soluções muito mais diferenciadas para conflitos entre os seus sujeitos do que a Constituição poderia fazer. Por isso não se pode presumir a imprevidência do legislador que, sopesando as implicações sociais, jurídicas e econômicas da modificação do ordenamento jurídico, vedou para alienação fiduciária de bem móvel a purgação da mora, sendo, pois, a matéria insuscetível de controle jurisdicional infraconstitucional. Portanto, sob pena de se gerar insegurança jurídica e violar o princípio da tripartição dos poderes, não cabe ao Poder Judiciário, a pretexto de interpretar a Lei 10.931/2004, criar hipótese de purgação da mora não contemplada pela lei. Com efeito, é regra basilar de hermenêutica a prevalência da regra excepcional, quando há confronto entre as regras específicas e as demais do ordenamento jurídico. Assim, como o CDC não regula contratos específicos, em casos de incompatibilidade entre a norma consumerista e a aludida norma específica, deve prevalecer essa última, pois a lei especial traz novo regramento a par dos já existentes. Nessa direção, é evidente que as disposições previstas no CC e no CDC são aplicáveis à relação contratual envolvendo alienação fiduciária de bem móvel, quando houver compatibilidade entre elas. Saliente-se ainda que a alteração operada pela Lei 10.931/2004 não alcança os contratos de alienação fiduciária firmados anteriormente à sua vigência. De mais a mais, o STJ, em diversos precedentes, já afirmou que, após o advento da Lei 10.931/2004, que deu nova redação ao art. 3º do Decreto-lei 911/1969, não há falar em purgação da mora, haja vista que, sob a nova sistemática, após o decurso do prazo de 5 (cinco) dias contados da execução da liminar, a propriedade do bem fica consolidada em favor do credor fiduciário, devendo o devedor efetuar o pagamento da integralidade do débito remanescente a fim de obter a restituição do bem livre de ônus. Precedentes citados: AgRg no REsp 1.398.434-MG, Quarta Turma, DJe 11/2/2014; e AgRg no REsp 1.151.061-MS, Terceira Turma, DJe 12/4/2013. REsp 1.418.593-MS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 14/5/2014.

Fonte: Informativo nº. 0540 do STJ | Período: 28 de maio de 2014.

STJ: Não é nula nem anulável a fiança prestada por fiador convivente em união estável sem a outorga uxória do outro companheiro. Não incidência da Súmula nº 332/STJ à união estável

Direito civil/constitucional – Direito de família – Contrato de locação – Fiança – Fiadora que convivia em união estável – Inexistência de outorga uxória – Dispensa – Validade da garantia – Inaplicabilidade da Súmula nº 332/STJ – 1. Mostra-se de extrema relevância para a construção de uma jurisprudência consistente acerca da disciplina do casamento e da união estável saber, diante das naturais diferenças entre os dois institutos, quais os limites e possibilidades de tratamento jurídico diferenciado entre eles – 2. Toda e qualquer diferença entre casamento e união estável deve ser analisada a partir da dupla concepção do que seja casamento, por um lado, ato jurídico solene do qual decorre uma relação jurídica com efeitos tipificados pelo ordenamento jurídico, e, por outro, uma entidade familiar, dentre várias outras protegidas pela Constituição – 3. Assim, o casamento, tido por entidade familiar, não se difere em nenhum aspecto da união estável, também uma entidade familiar, porquanto não há famílias timbradas como de "segunda classe" pela Constituição Federal de 1988, diferentemente do que ocorria nos diplomas constitucionais e legais superados. Apenas quando se analisa o casamento como ato jurídico formal e solene é que as diferenças entre este e a união estável se fazem visíveis, e somente em razão dessas diferenças entre casamento (ato jurídico) e união estável é que o tratamento legal ou jurisprudencial diferenciado se justifica – 4. A exigência de outorga uxória a determinados negócios jurídicos transita exatamente por este aspecto em que o tratamento diferenciado entre casamento e união estável é justificável. É por intermédio do ato jurídico cartorário e solene do casamento que se presume a publicidade do estado civil dos contratantes, de modo que, em sendo eles conviventes em união estável, hão de ser dispensadas as vênias conjugais para a concessão de fiança – 5. Desse modo, não é nula nem anulável a fiança prestada por fiador convivente em união estável sem a outorga uxória do outro companheiro. Não incidência da Súmula nº 332/STJ à união estável – 6. Recurso especial provido.

EMENTA

DIREITO CIVIL-CONSTITUCIONAL. DIREITO DE FAMÍLIA. CONTRATO DE LOCAÇÃO. FIANÇA. FIADORA QUE CONVIVIA EM UNIÃO ESTÁVEL. INEXISTÊNCIA DE OUTORGA UXÓRIA. DISPENSA. VALIDADE DA GARANTIA. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA N. 332/STJ. 1. Mostra-se de extrema relevância para a construção de uma jurisprudência consistente acerca da disciplina do casamento e da união estável saber, diante das naturais diferenças entre os dois institutos, quais os limites e possibilidades de tratamento jurídico diferenciado entre eles. 2. Toda e qualquer diferença entre casamento e união estável deve ser analisada a partir da dupla concepção do que seja casamento – por um lado, ato jurídico solene do qual decorre uma relação jurídica com efeitos tipificados pelo ordenamento jurídico, e, por outro, uma entidade familiar, dentre várias outras protegidas pela Constituição. 3. Assim, o casamento, tido por entidade familiar, não se difere em nenhum aspecto da união estável – também uma entidade familiar -, porquanto não há famílias timbradas como de "segunda classe" pela Constituição Federal de 1988, diferentemente do que ocorria nos diplomas constitucionais e legais superados. Apenas quando se analisa o casamento como ato jurídico formal e solene é que as diferenças entre este e a união estável se fazem visíveis, e somente em razão dessas diferenças entre casamento – ato jurídico – e união estável é que o tratamento legal ou jurisprudencial diferenciado se justifica. 4. A exigência de outorga uxória a determinados negócios jurídicos transita exatamente por este aspecto em que o tratamento diferenciado entre casamento e união estável é justificável. É por intermédio do ato jurídico cartorário e solene do casamento que se presume a publicidade do estado civil dos contratantes, de modo que, em sendo eles conviventes em união estável, hão de ser dispensadas as vênias conjugais para a concessão de fiança. 5. Desse modo, não é nula nem anulável a fiança prestada por fiador convivente em união estável sem a outorga uxória do outro companheiro. Não incidência da Súmula n. 332/STJ à união estável. 6. Recurso especial provido. (STJ – REsp nº 1.299.894 – Distrito Federal – 4ª Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJ 28.03.2014)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da QUARTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Raul Araújo (Presidente), Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 25 de fevereiro de 2014 (data do julgamento).

MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO – Relator

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

1. Esther Costa Rebello opôs embargos do devedor em face de Linea G Empreendimentos de Engenharia, aduzindo que a embargada/exequente firmara contrato de locação de imóvel comercial com Valdemir Ribeiro Martins, figurando como fiadora do mencionado contrato. Diante do inadimplemento das parcelas mensais relativas a dezembro de 2006 a novembro de 2007, a embargada/exequente ajuizou execução contra a fiadora, tendo sido o imóvel residencial desta penhorado como garantia do juízo.

Nos embargos do devedor, a fiadora alegou, fundamentalmente, nulidade da fiança em razão da falta de outorga uxória, pois convivia em união estável com Carlos Levino Vilanova desde 1975.

O Juízo de Direito da 11º Vara Cível da Circunscrição Especial Judiciária de Brasília/DF rejeitou os embargos, afastando todas as teses de defesa da executada (fls. 159-162).

Porém, a sentença foi reformada em grau de apelação, em razão da falta de outorga do companheiro da executada à fiança por ela prestada:

PROCESSO CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE TITULO EXTRAJUDICIAL. ENCARGOS LOCATÍCIOS. FIADOR. OUTORGA UXÓRIA. AUSÊNCIA. 1. Tendo sido acatados os embargos de terceiro opostos pelo companheiro da embargante, para declarar nula a fiança por ela prestada, eis que realizada sem a necessária outorga uxória, há de se julgar procedentes os embargos do devedor ora opostos pela fiadora, a fim de excluí-la da execução. 2. Em que pese o Superior Tribunal de Justiça entender não ser cabível à fiadora alegar a nulidade da fiança a que deu causa, ao companheiro é admitida a oposição de embargos de terceiro quando não prestou outorga uxória na fiança prestada por seu par. 3. É nula a fiança prestada sem a outorga uxória do cônjuge/companheiro da fiadora. 4. Recurso provido (fl. 214).

Opostos embargos de declaração (fls. 226-228), foram rejeitados (fls. 231-236).

Sobreveio recurso especial apoiado na alínea "c" do permissivo constitucional, no qual alegou a recorrente a validade da fiança recebida sem outorga uxória, porquanto seria impossível o credor saber que a fiadora vivia em união estável com seu companheiro.

A recorrente sustentou, ainda, que a fiadora, no contrato levado a juízo, deve responder pelas dívidas de locação até a efetiva entrega das chaves, tal como previsto no contrato.

Contra-arrazoado (fls. 284-304), o especial foi admitido (fls. 306-308).

É o relatório.

VOTO

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

2. A controvérsia analisada pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, e que foi devolvida a esta Corte, consiste em saber se é válida a fiança prestada durante união estável, sem a outorga do outro companheiro. Registro o teor da Súmula n. 332/STJ, editada depois de vários precedentes que analisaram a questão – sempre no âmbito do casamento:

Súmula n. 332: A fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total da garantia.

3. De fato, já é conhecida a posição defendida pela majoritária doutrina – e por mim abraçada em mais de uma oportunidade nesta Casa – acerca da inconstitucionalidade do art. 1.790 do Código Civil de 2002, seja porque confere tratamento diferenciado entre casamento e união estável em matéria na qual se mostra injustificável tal distinção, seja porque, a propósito de disciplinar de modo diverso os dois institutos, acaba, de forma canhestra, conferido tratamento discriminatório aos filhos, a depender se são nascidos de casamento ou de união estável, o que conflita frontalmente com o art. 227, § 6º, da Constituição Federal.

O tema já foi submetido à Corte Especial, mas esta não conheceu do incidente por questões formais de admissibilidade (AI no REsp 1135354/PB, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Rel. p/ Acórdão Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, CORTE ESPECIAL, julgado em 03/10/2012).

Posteriormente, outros dois recursos foram afetados para a Corte Especial: AI no REsp 1291636/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 11/06/2013; AI no REsp 1318249/GO, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 11/06/2013, que pendem de julgamento.

O tema recebeu crivo positivo de repercussão geral no Supremo Tribunal Federal:

UNIÃO ESTÁVEL – COMPANHEIROS – SUCESSÃO – ARTIGO 1.790 DO CÓDIGO CIVIL – COMPATIBILIDADE COM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL ASSENTADA NA ORIGEM – RECURSO EXTRAORDINÁRIO – REPERCUSSÃO GERAL CONFIGURADA. Possui repercussão geral a controvérsia acerca do alcance do artigo 226 da Constituição Federal, nas hipóteses de sucessão em união estável homoafetiva, ante a limitação contida no artigo 1.790 do Código Civil (RE 646721 RG, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, julgado em 10/11/2011).

3.1. Nessa esteira, cumpre para logo ressaltar, todavia, que nunca foi afirmada a completa e inexorável coincidência entre os institutos da união estável e do casamento.

Na verdade, apenas se afirmou que não há superioridade familiar do casamento ou predileção constitucional por este.

Nesse ponto, é bem verdade que, parte da doutrina – no que foi seguida, em alguma medida, pela jurisprudência – tenta justificar eventual tratamento diferenciado dado às uniões estáveis, comparativamente ao casamento, acionando-se a parte final do art. 226, § 3º, da Constituição Federal, verbis:

Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

Afirma-se que união estável e casamento são entidades distintas, pois, caso se tratassem de entidades idênticas, não teria a Constituição previsto a possibilidade de conversão da união estável em casamento.

O mencionado dispositivo constitucional, segundo penso, consubstancia apenas uma fórmula de facilitação da conversão. A união estável pode – se assim desejarem os conviventes – converter-se em casamento. Cuida-se de comando direcionado ao legislador ordinário e aos agentes públicos para que, se for o desejo dos companheiros, não embaracem a conversão da união estável em casamento.

Penso que a parte final do § 3º do art. 226 da CF/1988 é simples constatação de que, natural e faticamente, em razão da informalidade dos vínculos, a união estável é mais fragilizada que o casamento e, por isso mesmo, propicia menos segurança aos conviventes.

Assim, é tão somente em razão da natural insegurança e fragilidade dos vínculos existentes na união estável, que a lei deve facilitar sua conversão em casamento, ciente o constituinte originário que é pelo casamento que o Estado melhor protege a família.

3.2. Na verdade, o que se mostra relevante para a construção de uma jurisprudência consistente acerca do tema é saber, diante das naturais diferenças entre os dois institutos, quais os limites e possibilidades de tratamento jurídico diferenciado entre eles, o que já foi por mim manifestado em voto proferido na citada AI no REsp 1.135.354/PB.

Nesse passo, toda e qualquer diferença entre casamento e união estável deve ser analisada a partir da dupla concepção do que seja casamento - por um lado, ato jurídico solene do qual decorre uma relação jurídica com efeitos tipificados pelo cartorário chamado "casamento civil".

Portanto, o casamento, tido por entidade familiar, não se difere em nenhum aspecto da união estável – também uma entidade familiar -, porquanto não há famílias timbradas como de "segunda classe" pela Constituição Federal de 1988, diferentemente do que ocorria nos diplomas constitucionais e legais superados. Apenas quando se analisa o casamento como ato jurídico formal e solene é que as diferenças entre este e a união estável se fazem visíveis, e somente em razão dessas diferenças entre casamento – ato jurídico – e união estável é que o tratamento legal ou jurisprudencial diferenciado se justifica.

De fato – sem que se pretenda enumerar à exaustão -, são vários os casos em que os efeitos decorrentes do instrumento formal do casamento justificam o tratamento distinto entre ele e a união estável.

São hipóteses que decorrem diretamente da solenidade e da publicidade do ato jurídico, atributos que perecem ser, "aos olhos do legislador, a forma de assegurar a terceiros interessados a ciência quanto a regime de bens, estatuto pessoal, patrimônio sucessório e assim por diante" (TEPEDINO, Gustavo. Temas de direito civil. 4 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 409-410).

Assim, se alguém pretender negociar com pessoas casadas, é imperioso que saiba o regime de bens e, eventualmente, a projeção da negociação no patrimônio do consorte; a outorga uxória para a prestação de fiança também é hipótese que demanda "absoluta certeza, por parte dos interessados, quanto à disciplina dos bens vigente, segurança que só se obtém pelo ato solene do casamento" (TEPEDINO, Gustavo. Ibidem ).

4. Um dos paradigmas colacionados para o confronto – o qual, adiante-se, julgo apto à comprovação do dissídio – fornece bem a visão prática do que ora se afirma. Entendeu o julgado ser válida a hipoteca dada por um companheiro sem a outorga do outro (Resp 952141/RS, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/06/2007, DJ 01/08/2007).

O saudoso relator afirmou:

Era impossível que o banco exigisse do devedor a "outorga uxória", ou ato que o valha, pois não tinha como saber da existência da união estável.

Ora, garantir à recorrida o direito à meação é legitimar a atitude condenável de seu companheiro, que omitiu a existência da união estável.

A má-fé do devedor não pode prejudicar o credor, especialmente se este último não tem como se proteger.

[...]

A se admitir que a recorrida ponha a salvo sua meação, em prejuízo do banco recorrente, estaríamos estimulando a conduta desleal do devedor.

A possibilidade de fraudes seria enorme, até porque não é possível que o credor tenha ciência inequívoca da situação de fato em que se envolve o devedor.

A existência da união estável, embora tenha repercussão jurídica, é um fato da vida. Não há exigência de que seja registrada para que exista!

Com efeito, voltando ao exame do caso em julgamento, a exigência de outorga uxória a determinados negócios jurídicos transita exatamente por aquele aspecto em que o tratamento diferenciado entre casamento e união estável se justifica. É por intermédio do ato jurídico cartorário e solene do casamento que se presume a publicidade do estado civil dos contratantes, de modo que, em sendo eles conviventes em união estável, hão de ser dispensadas as vênias conjugais para a concessão de fiança.

Na mesma linha, não parece nula nem anulável a fiança prestada por fiador convivente em união estável, sem a outorga uxória do outro companheiro.

De resto, a celebração de escritura pública entre os consortes não afasta essa conclusão, porquanto não é ela própria o ato constitutivo da união estável. Presta-se apenas como prova relativa de uma união fática, que não se sabe ao certo quando começa nem quando termina.

Ademais, por não alterar o estado civil dos conviventes, para que dela tivesse conhecimento, o contratante deveria percorrer todos os cartórios de notas do Brasil, o que se mostra inviável e inexigível.

5. Diante do exposto, dou provimento ao recurso especial para, julgando válida a fiança prestada, rejeitar os embargos do devedor.

Por consequência, condeno o embargante/recorrida ao pagamento de custas processuais e honorários de advogado, os quais ora fixo em R$ 10.000,00 (dez mil reais), com base no art. 20, § 4º, do CPC.

É como voto.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA: Sr. Presidente, do mesmo modo, cumprimento o Sr. Ministro Relator e subscrevo integralmente o voto de S. Exa.

DOU PROVIMENTO ao recurso especial.

Fonte: STJ.

quarta-feira, 28 de maio de 2014

TRF/1ª Região: Carta de remição anterior à penhora comprova propriedade de imóvel mesmo sem registro em cartório



A carta de remição anterior à penhora comprova a propriedade do imóvel independentemente de registro no cartório de imóveis. Com essa fundamentação, a 8.ª Turma negou provimento à remessa oficial (revisão obrigatória da sentença).

Em sua decisão, a relatora, desembargadora federal Maria do Carmo Cardoso, esclareceu que, de acordo com o art. 1.227 do Código Civil de 2002, só se adquire o direito real sobre o imóvel quando efetuado o registro no cartório de registro de imóveis, que é a forma solene pela qual se arquivam os atos translativos da propriedade.

No entanto, é admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro (enunciado 84 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça).

Com essas considerações, a desembargadora Maria do Carmo Cardoso concluiu que, no presente caso, comprovada a propriedade do imóvel penhorado por meio de cópia de carta de remição, anterior à penhora realizada nos autos da execução fiscal, que se deu em 8/5/2005, esta deve prevalecer, não obstante a ausência de registro no cartório de registro de imóveis. Aplicação por analogia da Súmula 84 do STJ.

A decisão foi unânime.

A notícia refere-se ao seguinte processo: 0004113-59.2006.4.01.3803.

Decisão: 14/3/2014

Fonte: TRF/1ª Região | 31/03/2014.

1ªVRP/SP: anuente que não é detentor de domínio não pode gravar o imóvel e não pode revogar cláusulas restritivas



Processo 0049468-70.2013 Dúvida Renan Martins Sanches 18º oficial de Registro de Imóveis – Dúvida – escritura de doação com cláusulas de impenhorabilidade, incomunicabilidade e inalienabilidade – previsão para que terceiro anuente tenha poderes para revogar as cláusulas restritivas, quando do óbito dos doadores – anuente não é detentor de domínio, não pode gravar o imóvel e não pode revogar cláusulas restritivas necessidade de retificação da escritura de doação – dúvida procedente. CP 257 Vistos. 1. O 18º Ofício de Registro de Imóveis de São Paulo (RI) suscitou dúvida a requerimento de RENAN MARTINS SANCHES (RENAN). 1.1. Segundo narrado no termo de dúvida, RENAN pretende que seja registrada escritura de doação (fls. 05-11), em que ele figura como donatário do imóvel de matrícula 61.743 do 18º RI (fls. 26-29), imóvel este pertencente a RICARDO SANCHES (RICARDO) e MARIA DE FÁTIMA MARTINS DA SILVA (MARIA). 1.2. O título foi apresentado ao 18º RI (prenotação 607.357) e foi recusado. A qualificação negativa decorreu da presença, no título, de disposição que prevê a possibilidade de Adelaide Martins da Silva (mãe do donatário e esposa de RICARDO) revogar, em ocasião do falecimento dos doadores, cláusulas de impenhorabilidade, incomunicabilidade e alienabilidade, porém, com anuência do donatário. 1.2.1. Adelaide casou-se com RICARDO, no regime da comunhão parcial de bens, depois que ele adquiriu o imóvel. Logo, ela não possui direitos reais sobre o referido bem. Segundo entendimento do registrador, da mesma forma que ela não poderia impor cláusulas restritivas na doação, jamais poderia revogálas. Adelaide apenas surge na escritura como anuente, para fins de atendimento ao disposto no artigo 1.647 do Código Civil. 1.2.2. Por fim, o registrador asseverou que a possibilidade de terceiro revogar cláusulas restritivas é uma condição resolutiva puramente potestativa, já que, sobrevindo óbito dos doadores, o cancelamento das restrições ficaria ao livre arbítrio de Adelaide. 1.3. Inconformado com a recusa, RENAN requereu que fosse suscitada a presente dúvida (fls. 23-25). 1.4. O termo de dúvida foi instruído com documentos (fls. 05-29). 2. O suscitado apresentou impugnação (fls. 32-35). 3. O Ministério Público opinou pela improcedência da dúvida (fls. 42-44). 4. É o relatório. Passo a fundamentar e decidir. 5. RENAN pretende registrar escritura de doação com cláusulas restritivas de domínio e previsão para que uma anuente as revogue no caso de falecimento dos doadores. 6. Adelaide não é titular de domínio do imóvel de matrícula 61.743 do 18º RI. Ela não figurou como doadora (apenas com anuente) e, por decorrência lógica, ela não pode instituir nenhuma cláusula restritiva de domínio. Não se pode onerar, alienar ou restringir aquilo de que não se é proprietário: ostentar a condição de ‘titular de domínio’ é essencial para impor as restrições (Fioranelli, Ademar. Das cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 19, g. n.) 6.1. Se ela não pode clausular o bem imóvel, objeto da doação, por não ser proprietária, claramente ela também não poderá revogar cláusulas instituídas pelos doadores, mesmo após o falecimento destes. Isso porque as cláusulas restritivas se tornam irretratáveis depois do óbito do(s) doador(es): Os gravames de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade são instituídos em garantia do donatário, sendo possível o seu cancelamento pelo doador em vida, com anuência do donatário. Porém, após a morte do doador, as cláusulas tornam-se irretratáveis, perdurando até o falecimento do donatário, ou do último sobrevivente, se houver mais de um donatário, mesmo em se tratando de adiantamento de legítima (RT, 313/112, apud Fioranelli, Ademar. Das cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 71, g. n.) 7. Observa-se, então, que o vício da escritura de doação decorre não do fato de existir condição resolutiva potestativa, mas sim do fato de Adelaide simplesmente não ter poderes para dispor do imóvel e clausulá-lo com disposições restritivas de domínio. Supondo que ela pudesse levantar as cláusulas restritivas, mesmo assim tal ato não estaria sob seu livre arbítrio porque a própria escritura de doação prevê a necessidade de anuência do donatário e, logo, não há que se falar em potestatividade (fls. 07 in medio). 8. Apesar do acima exposto, nada impede que o tempo de vida de Adelaide seja considerado como condição resolutiva da cláusula de inalienabilidade temporária, afinal, trata-se de mera condição temporal, permitida pela lei por não ser impossível. 9. O título, da maneira como se apresenta, não poderá ingressar em fólio real. Necessária será sua retificação, por outra escritura, para que haja expressa previsão de que apenas os doadores possam levantar as cláusulas restritivas de impenhorabilidade, incomunicabilidade e alienabilidade, tudo com o necessário consentimento do donatário. 10. Do exposto, julgo procedente a dúvida suscitada pelo 18º Ofício de Registro de Imóveis de São Paulo (RI), a requerimento de RENAN MARTINS SANCHES. Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. Desta sentença cabe apelação, com efeito suspensivo e devolutivo, para o E. Conselho Superior da Magistratura, no prazo de quinze dias. Uma vez preclusa esta sentença, cumpra-se a Lei 6.015/73, artigo 203, I, e arquivem-se os autos se não for requerido mais nada. P. R. I. São Paulo, 1 de novembro de 2013. Josué Modesto Passos JUIZ DE DIREITO.

Fonte: DJE/SP | 28/03/2014.

Decisão da 1ªVRP/SP afasta necessidade de apresentação das CND’s.



Processo 0076378-37.2013.8.26.0100 – Dúvida – Registro de Imóveis – 10º Oficial de Registro de Imoveis Comarca de São Paulo . – CONCLUSÃO Em faço estes autos conclusos a(o) MM(A). Juiz(a) de Direito Dra Tânia Mara Ahualli, da 1ª Vara de Registros Públicos. Eu, ________, Escrevente, digitei. Registro de imóveis – dúvida – apresentação de CND – entendimento atualdo E. Conselho Superior da Magistratura e da E. Corregedoria Geral da Justiça no sentido de que não são exigíveis as certidões negativas de débitos relativos às contribuições previdenciárias e de terceiros e de débitos relativos aos tributos federais e à dívida ativa da União (Lei 8.212/1991, art. 47, I, b) – dúvida improcedente CP 466 Vistos. O 10º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo suscitou dúvida, a requerimento de Rabone Negócios e Participações LTDA, que apresentou a registro Instrumento Particular de Constituição de Contrato Social, no qual passou o imóvel objeto da matrícula nº 32.739 a integrar o capital social da empresa. Segundo por ele relatado, o título recebeu qualificação negativa, em face da ausência das certidões negativas de débitos relativos às contribuições previdenciárias e de terceiros, bem como aos tributos federais e à dívida ativa da União (Lei 8.212, de 24 de julho de 1991, art. 47, I, b). Ressalta que o E. Tribunal de Justiça de São Paulo declarou inconstitucional a Lei 8.212, de 24 de julho de 1991, art. 47, I, d (autos 0139256-75.2011.8.26.0000), e que, por força disso, a redação atual das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça – NSCGJ, tomo II, capítulo XIV, item 59.2, faculta aos tabeliães dispensar, nos casos da Lei 8.212/1991, art. 47, I, b, do Decreto 3.048, de 6 de maio de 1999, art. 257, I, b, e do Decreto 6.106, de 30 de abril de 2007, art. 1º, a a exibição das certidões negativas de débitos emitidas pelo INSS e pela Secretaria da Receita Federal do Brasil e da certidão conjunta negativa de débitos relativos aos tributos federais e à dívida ativa da União emitida pela Secretaria da Receita Federal do Brasil e pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. Além disso, o C. Conselho Superior da Magistratura, por analogia, vem aplicando a declaração de inconstitucionalidade a outras alíneas da Lei 8.212/1991, art. 47, I, como se vê nos autos 9000004-83.2011.8.26.0296. Salienta o Registrador que não há decisão expressa e normativa nesse sentido, e por atender ao princípio da legalidade, não seria de competência administrativa a regulamentação da matéria. O Ministério Público opinou pela improcedência da dúvida (fls. 22/23). É o relatório. Decido. Cumpre, primeiramente, consignar que acompanho o entendimento do MM Juiz Josúe Modesto Passos, que em recente decisão proferida à frente desta 1ª Vara de Registros Públicos, declarou que, no que diz respeito à sua convicção pessoal, “no juízo administrativo não cabe aplicar a inconstitucionalidade declarada sobre a Lei 7.711, de 22 de setembro de 1988, art. 1º, I, III e IV, e §§ 11º-3º (cf. ações diretas de inconstitucionalidade 173-6 e 394-1) para, por identidade de razão, dar por inconstitucional a Lei 8.212/1991, art. 47, I, b. Além disso, na arguição 0139256-75.2011.8.26.0000 foi declarada apenas a inconstitucionalidade da Lei 8.212/1991, art. 47, I, d, e – repita-se – na via administrativa não há estender a eficácia dessa decisão também para o art. 47, I, b. Finalmente, as NSCGJ, II, XIV, 59.2, são de alcance algo duvidoso, porque dispensam os tabelionatos (frise-se) de exigir as certidões para a lavratura de escrituras públicas de negócios jurídicos concernentes a direitos reais imobiliários, é verdade; porém, as próprias NSCGJ não puseram dispensa semelhante em favor dos ofícios de registro de imóveis, mesmo na redação dada pelo Provimento CG 37, de 26 de novembro de 2013, em vigor a partir de 28 de janeiro de 2014. De resto, já decidiu o E. Tribunal de Justiça (apelação 0015621-88.2011.8.26.0604 – Sumaré, 11ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Ricardo Dip, j. 22.01.2013): Nesse quadro, avista-se, com efeito, que a exigência, na espécie, de apresentação de certidões negativas para que a carta de adjudicação acedesse ao fólio real tem por fundamento a Lei nº 8.212/1991, e, embora a Lei nº 7.711/1988 também verse a necessidade de apresentação das aludidas certidões, o fato é que a Registradora imobiliária, na qualificação do título apresentado a registro, adstrita ao princípio da legalidade, tomou amparo na Lei nº 8.212. À falta de declaração judicial expressa de que a Lei nº 8.212/1991 padeça de inconstitucionalidade, não pode o Registrador de imóveis estender-lhe a fulminação que afligiu a Lei nº 7.711/1988. Frise-se, além disso, que o art. 48 da Lei nº 8.212, de 1991, enuncia que o registrador é solidariamente responsável pela prática de atos com inobservância de seu art. 47: “Art. 48. A prática de ato com inobservância do disposto no artigo anterior, ou o seu registro, acarretará a responsabilidade solidária dos contratantes e do oficial que lavrar ou registrar o instrumento, sendo o ato nulo para todos os efeitos. (…) § 3º O servidor, o serventuário da Justiça, o titular de serventia extrajudicial e a autoridade ou órgão que infringirem o disposto no artigo anterior incorrerão em multa aplicada na forma estabelecida no art. 92, sem prejuízo da responsabilidade administrativa e penal cabível.” Note-se que nesse aresto ficou aventada a possibilidade de a corregedoria permanente (e, por maior força de razão, a Corregedoria Geral) dispensar as certidões, mas somente nos casos de difficultas praestandi, de absoluta impossibilidade de satisfazer a exigência (Lei 6.015, de 31 de dezembro de 1973 – LRP/1973, art. 198, verbis “ou não a podendo satisfazer”) – e não de modo geral e abstrato.” Feitas essas ressalvas, é necessário porém observar que, justamente porque aqui se trata de um juízo administrativo, não há liberdade senão para cumprir o que tenham decidido as autoridades superiores, i. e., a Corregedoria Geral da Justiça (CGJ) e o Conselho Superior da Magistratura (CSM) – as quais, é bom ver, desde o julgamento da Apel. Cív. 0003435-42.2011.8.26.0116, em 13.12.2012 (DJ 30.01.2013), mandam que sejam dispensadas as certidões negativas de dívidas tributárias federais e previdenciárias federais. Nesse sentido, confiram-se: (a) para a CGJ: Proc. 62.779/2013, j. 30/07/2013, DJ 07/08/2013; e Proc. 100.270/2012, j. 14/01/2013 (b) para o CSM: as Ap. Cív. 0015705-56.2012.8.26.0248, j. 06.11.2013, DJ 06.11.2013; 9000004-83.2011.8.26.0296, j. 26.09.2013, DJ 14.11.2013; 0006907-12.2012.8.26.0344, 23.05.2013, DJ 26.06.2013; 0013693-47.2012.8.26.0320, j 18.04.2013, DJ 24.05.2013; 0019260-93.2011.8.26.0223, j. 18.04.2013, DJ 24.05.2013; 0021311-24.2012.8.26.0100, j. 17.01.2013, DJ 21.03.2013; 0013759-77.2012.8.26.0562, j. 17.01.2013, DJ 21.03.2013; 0018870-06.2011.8.26.0068, j. 13.12.2012, DJ 26.02.2013; 9000003-22.2009.8.26.0441, j. 13.12.2012, DJ 27.02.2013; 0003611-12.2012.8.26.0625, j. 13.12.2012, DJ 01.03.2013; e 0013479-23.2011.8.26.0019, j. 13.12.2012, DJ 30.01.2013. Assim, esta corregedoria permanente não pode senão afastar o óbice levantado pelo 10º Registrador de Imóveis de São Paulo, para que se proceda ao registro. Do exposto, julgo improcedente a dúvida suscitada pelo 10º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo, a requerimento de Rabone Negócios e Participações LTDA. Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Desta sentença cabe apelação, dentro em quinze dias, com efeito suspensivo, para o E. Conselho Superior da Magistratura. Oportunamente, arquivem-se os autos. P.R.I.C. São Paulo, 26 de fevereiro de 2014. Tânia Mara Ahualli JUÍZA DE DIREITO – ADV: FERNANDO CALZA DE SALLES FREIRE (OAB 115479/ SP).

Fonte: DJE/SP | 28/03/2014.

terça-feira, 27 de maio de 2014

CSM/SP: Promessa de compra e venda. Imóvel adquirido na constância do casamento. Regime de bens – separação obrigatória. Formal de partilha – registro – necessidade.

É necessário o prévio registro de formal de partilha, com atribuição da totalidade do bem ao viúvo promitente vendedor, para o posterior registro de instrumento particular de promessa de compra e venda de imóvel adquirido na constância do casamento celebrado sob o regime da separação obrigatória de bens  O Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (CSM/SP) julgou a Apelação Cível nº 0002335-32.2013.8.26.0100, que decidiu pela necessidade do prévio registro de formal de partilha, com atribuição da totalidade do bem ao viúvo promitente vendedor, para o posterior registro de instrumento particular de promessa de compra e venda de imóvel adquirido na constância do casamento celebrado sob o regime da separação obrigatória de bens. O acórdão teve como Relator o Desembargador Elliot Akel e foi, à unanimidade, julgado improvido. No caso apresentado, o MM. Juiz Corregedor Permanente julgou procedente a dúvida suscitada, mantendo os óbices apontados pelo Oficial Registrador. O apelante, em suas razões, argumentou que a exigência do prévio registro do formal de partilha, pelo fato de o imóvel ter sido adquirido pelo promitente vendedor na constância do casamento sob o regime da separação obrigatória de bens é indevida, porque o Oficial Registrador pretende decidir acerca da comunicabilidade ou não do bem imóvel em questão, extrapolando sua função. Afirmou, ainda, que o formal de partilha instruído com a impugnação apresentada demonstra que os aquestos foram inventariados, sem que tenha havido qualquer impugnação dos herdeiros, e que a sentença, ao afirmar que a demonstração de incomunicabilidade não foi feita no momento oportuno, faz pressupor que embora tardia, foi feita, e deixou de se pronunciar sobre o ponto fulcral da dúvida. Ao analisar o recurso, o Relator entendeu que a exigência de prévio registro do formal de partilha dos bens deixados pela falecida esposa do interessado é devida, conforme apontou o Oficial Registrador. Afirmou, também, que uma vez legalmente estabelecida a comunicabilidade (Súmula nº 377 do Supremo Tribunal Federal), o imóvel em questão deveria ter sido inventariado e partilhado, no caso, mediante atribuição da parte ideal de propriedade do cônjuge falecido integralmente ao viúvo, que passaria a ser proprietário da totalidade do imóvel, possibilitando o registro da promessa de compra e venda posteriormente. Uma vez que o registro prévio do formal de partilha não foi realizado, admitir-se o registro da promessa de compra e venda violaria o Princípio da Continuidade. Além disso, ao Oficial Registrador incumbe o dever de proceder ao exame da legalidade do título e apreciar as formalidades extrínsecas da ordem e à conexão de seus dados com o registro e sua formalização instrumental. Posto isto, o Relator entendeu que o registro do título comprometeria o exato encadeamento subjetivo das sucessivas transmissões e aquisições de direitos reais imobiliários, já que o imóvel foi adquirido pelo interessado casado com sua esposa, cuja comunicabilidade do bem é inconteste, sendo, de acordo com o título apresentado, transmitido em sua totalidade pelo interessado, o qual não é o único titular dominial. Desta forma, o Relator concluiu que é indispensável a observância do art. 225, § 2º da Lei de Registros Públicos, que consagra o Princípio da Continuidade, corolário do Princípio da Especialidade. Diante do exposto, o Relator votou pelo improvimento do recurso.