Íntegra
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
RECURSO ESPECIAL Nº 1.324.222 - DF (2012/0104237-9)
RELATOR: MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
RECORRENTE: JANAINA HONÓRIO FAGUNDES
ADVOGADO: OSCAR ORTIZ JAYME E OUTRO(S)
RECORRIDO: SIRLEI EVANGELISTA DE ASSIS E OUTROS
ADVOGADO: MARIA CUSTODIA SERMOUD FONSECA E OUTRO(S)
EMENTA: RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. COMPANHEIRA SOBREVIVENTE. DIREITO À
MEAÇÃO DO BEM. IMÓVEL NÃO ADQUIRIDO NA CONSTÂNCIA DA UNIÃO ESTÁVEL.
IMPOSSIBILIDADE.
1. É incomunicável imóvel adquirido anteriormente à união estável, ainda que a transcrição no registro
imobiliário ocorra na constância desta. Precedentes.
2. Antes da presunção de mútua assistência para a divisão igualitária do patrimônio adquirido durante a
união estável, reconhecida pela Lei nº 9.278/1996, havia necessidade de prova da participação do
companheiro.
3. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Terceira Turma, por
unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs.
Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha e Paulo de Tarso Sanseverino
votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 06 de outubro de 2015 (Data do Julgamento)
Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Relator
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator): Trata-se de recurso especial
interposto contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios assim
ementado:
"DIREITO CIVIL - INVENTÁRIO - DIREITO DA COMPANHEIRA SOBREVIVENTE À MEAÇÃO DE
IMÓVEL - BEM ADQUIRIDO NA CONSTÂNCIA DA UNIÃO ESTÁVEL - DATA DA AQUISIÇÃO -
TRANSCRIÇÃO DO TÍTULO TRANSLATIVO NO REGISTRO IMOBILIÁRIO - SENTENÇA MANTIDA.
1. O compromisso de compra e venda configura contrato preliminar pelo qual os poderes inerentes ao
domínio são transferidos ao compromissário comprador, permanecendo o promitente vendedor com a nuapropriedade
até que o preço seja pago na sua integralidade.
2. A legislação pátria exige a transcrição do título aquisitivo no registro imobiliário, isto é, exige a escritura
definitiva da compra e venda no Cartório de Registro de Imóveis, para fins de transferência e aquisição da
propriedade plena do imóvel (artigos 1.227 e 1.245, §10 do Código Civil).
3. No caso dos autos, o imóvel passou a integrar o patrimônio do autor da herança à época em que já
convivia em união estável, de modo que a companheira sobrevivente faz jus à meação do bem em
discussão (arts. 1725 e 1790 do Código Civil).
4. Recurso não provido" (fl. 657, e-STJ).
A recorrente sustenta, além de divergência jurisprudencial, violação do art. 1.790 do Código Civil.
Alega que a ex-companheira de seu falecido pai não tem direito à meação da residência localizada na
Ceilândia/DF, porquanto o imóvel foi adquirido em 1974 (a escritura de promessa de compra e venda foi
registrada naquele mesmo ano), em 60 (sessenta) parcelas, e sua quitação ocorreu em 1979. A união
estável em questão, por sua vez, teve início somente em outubro de 1978. Acrescenta que em 2004
houve apenas o registro da escritura definitiva de compra e venda da casa.
Requer, ao final, a reforma
"(...) da decisão do E.TJDFT, declarando-se que o imóvel caracterizado como casa residencial situada na
QNM 22, Conjunto M, Casa 27, Ceilândia, deverá ser partilhado somente entre os filhos herdeiros
necessários do Sr. Mário Honório Fagundes, afastada assim a participação como meeira da Sra. Sirlei
Evangelista de Assis" (fl. 373, e-STJ).
Contrarrazões apresentadas às fls. 714-718 (e-STJ).
O Ministério Público Federal opinou pelo provimento do recurso, em parecer que recebeu a seguinte
ementa:
"RECURSO ESPECIAL PELAS ALÍNEAS 'A' E 'C' DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL. SUCESSÃO E
PARTILHA. BEM IMÓVEL ADQUIRIDO PELO DE CUJUS MEDIANTE COMPROMISSO DE COMPRA E
VENDA EM MOMENTO ANTERIOR À UNIÃO ESTÁVEL. TRANSCRIÇÃO DO TÍTULO IMOBILIÁRIO
NA CONSTÂNCIA DA CONVIVÊNCIA. INCOMUNICABILIDADE DO BEM. PRECEDENTES DESTE STJ.
PARECER PELO PROVIMENTO DO RECURSO" (fl. 769, e-STJ).
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator): A tese recursal é de que bem
imóvel adquirido por um dos companheiros mediante celebração de compromisso de compra e venda, em
momento anterior ao início da união estável, não se comunicaria ao outro companheiro somente porque o
registro definitivo foi levado a efeito na constância da convivência uxória.
Inicialmente, vale anotar que "na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às
relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens" (AgRg no AREsp nº
228.629/PR, Relator Ministro Raul Araújo, DJe 24/06/2015), no qual, segundo o art. 1.661 do Código Civil,
"são incomunicáveis os bens cuja aquisição tiver por título uma causa anterior ao casamento".
Anota-se, ainda, o disposto no art. 1.790 do Código Civil:
"Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens
adquiridos onerosamente na vigência da união estável (...)".
Nesse contexto, destaca-se o entendimento do Tribunal de origem quanto ao imóvel em questão:
"(...)
Nas razões recursais, ao reiterar o agravo retido de fls. 88/90, a recorrente questiona a data de
07.10.2004 informada na inicial como sendo aquela de aquisição do imóvel situado na Ceilândia. Alega
que a aquisição se dera na data de 27.01.1974, isto é, em data anterior ao início da união estável entre o
falecido e SIRILEI EVANGELISTA DE ASSIS no ano de 1978, de modo que esta - ex-companheira do de
cujos - não teria direito à meação do referido bem.
(...)
Com efeito, o compromisso de compra e venda, ainda que registrado no cartório imobiliário, não transfere
a propriedade do bem imóvel, eis que consubstancia um contrato preliminar pelo qual os poderes
inerentes ao domínio são transferidos ao compromissário comprador. No entanto, o promitente vendedor
permanece com a nua-propriedade até que o preço seja pago na sua integralidade, quando somente
então a propriedade plena é transferida ao comprador (...)
Na espécie, da análise da certidão exarada pelo 6º Ofício de Registro de Imóveis do Distrito Federal (fl.
26), constata-se que a aquisição do imóvel pelo de cujos se aperfeiçoou na data de 01.12.2004, na qual a
escritura pública de compra e venda definitiva do imóvel foi levada a registro.
Portanto, diverso da defesa recursal, conclui-se que a transferência da propriedade do imóvel em questão
não se deu no ano de 1974. 0 referido imóvel passou a integrar o patrimônio do autor da herança apenas
no ano de 2004, quando já convivia com a pessoa de SIRLEI EVANGELISTA DE ASSIS, em união
estável iniciada na data de 04.07.1978 e findada apenas com a sua morte em 09.08.2006.
Nesse contexto, a companheira sobrevivente faz jus à meação do bem em discussão, visto que adquirido
onerosamente na constância da união estável (arts. 1725 e 1790 do Código Civil)" (fls. 660-661, e-STJ).
Aquela Corte entendeu que o imóvel, a despeito de ter sido comprado em 1974, somente passou a fazer
parte do patrimônio do falecido em 2004, quando houve a lavratura da escritura pública de compra e
venda. Nessa época, a companheira sobrevivente, ora recorrida, já mantinha relacionamento estável com
o de cujus.
Nota-se, assim, que o Tribunal recorrido, ao manter a comunicabilidade do bem decretada em primeira
instância, levou em consideração simplesmente a data da aquisição do bem imóvel, que afirmou ser a do
registro do título aquisitivo no cartório imobiliário, ocorrido na constância da união estável.
Tal fundamento, contudo, não está em consonância com a orientação desta Corte.
O Ministro Eduardo Ribeiro, em 9/3/1999, ao analisar causa semelhante, concluiu pela exclusão do
regime de comunhão parcial de bens o imóvel (bem incomunicável) adquirido pela recorrente antes do
casamento, por força de contrato de promessa de compra e venda regularmente inscrito no registro de
imóveis. Conforme o art. 272 do Código Civil de 1916 não cabia a inclusão do referido imóvel na partilha,
visto que a escritura de compra e venda, feita após o casamento, traduziu o cumprimento da promessa
anterior às núpcias e a parcela paga naquele ato o foi por doação de terceiro.
Eis a ementa do referido julgado:
"Promessa de compra e venda. Bem inalienável.
Sendo possível afastar a inalienabilidade, mediante sub-rogação judicialmente autorizada, não se há de
ter como nula a promessa.
Dever-se-á entender que o promitente vendedor obrigou-se a diligenciar o afastamento do óbice. Hipótese
em que isso efetivamente se fez.
Incomunicabilidade do bem, em virtude da norma contida no artigo 272 do Código Civil, uma vez que a
escritura de venda, feita após o casamento, traduziu o cumprimento da promessa a ele anterior e a
parcela paga naquele ato o foi por doação de terceiro e os bens assim havidos não se comunicam.
Doação antenupcial.
A regra do artigo 312 do Código Civil não é de ser entendida como significando que qualquer doação
entre pessoas que pretendam casar-se deva fazer-se por instrumento público. Haverá de ser observada
nas doações 'propter nuptias', que se sujeitam à regulamentação dos pactos antenupciais, de tal modo
que se consideram desfeitas não sobrevindo o casamento."
(REsp nº 62.605/MG, DJ 3/5/1999)
No mesmo sentido:
"Direito civil. Família. Imóvel cuja aquisição tem causa anterior ao casamento. Transcrição na constância
da sociedade conjugal.
Incomunicabilidade.
- Imóvel cuja aquisição tenha causa anterior ao casamento realizado sob o regime de comunhão parcial
de bens, com transcrição no registro imobiliário na constância deste, é incomunicável.
Inteligência do art. 272 do CC/16 (correspondência: art. 1.661 do CC/02).
- A jurisprudência deste Tribunal tem abrandado a cogência da regra jurídica que sobreleva a formalidade
em detrimento do direito subjetivo perseguido. Para tal temperamento, contudo, é necessário que a forma
imposta esteja sobrepujando arealização da Justiça.
Recurso especial não conhecido."
(REsp 707.092/DF, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/6/2005, DJ
1º/8/2005 - grifou-se)
"PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. ITCMD.
IMÓVEL ADQUIRIDO ANTES DO CASAMENTO MAS LEVADO A REGISTRO NA CONSTÂNCIA
DESTE. REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. BEM PERTENCENTE AO CÔNJUGE
SUPÉRSTITE E INCOMUNICÁVEL. EXAÇÃO INDEVIDA.
1. Inexiste violação do art. 535 do CPC quando o Tribunal de origem resolve a controvérsia de maneira
sólida e fundamentada, apenas não adotando a tese da recorrente.
2. A jurisprudência desta Corte 'tem abrandado a cogência da regra jurídica que sobreleva a formalidade
em detrimento do direito subjetivo perseguido. Para tal temperamento, contudo, é necessário que a forma
imposta esteja sobrepujando a realização da Justiça. É o exemplo da Súmula 84 do STJ que admite a
oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda de compromisso de compra e
venda de imóvel, ainda que desprovido de registro' (REsp 707.092/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ
1º.8.2005).
3. Bens imóveis adquiridos pelo cônjuge supérstite em data bem anterior ao casamento, ainda que
levados a registro na constância deste, escapam à cobrança do imposto sobre transmissão causa mortis
por não terem adentrado no patrimônio da esposa falecida.
4. Recurso especial não provido."
(REsp 1.304.116/PR, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 25/9/2012, DJe
4/10/2012 - grifou-se)
Igualmente, a respeito do tema, Maria Berenice Dias alude que
"(...) igualmente, não se comunicam os bens cujo título de aquisição é anterior à celebração do
casamento (CC 1.661). Os exemplos são vários: créditos ou indenizações referentes a fatos
pretéritos; recebimento de escritura definitiva de bem adquirido em momento anterior ao casamento
mediante promessa de compra e venda etc." (Manual de Direito das Famílias, 9ª ed., Revista dos
Tribunais, pág. 246).
Ademais, vale registrar outra questão relevante ao deslinde da controvérsia.
O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios expressamente apontou o ano de 1978 como o
termo inicial da união estável (fl. 661, e-STJ).
A recorrente, na petição do recurso especial, anotou que o preço total do imóvel foi quitado em 1979,
porque financiado em 60 (sessenta) prestações mensais, conforme se afere do trecho a seguir transcrito:
"(...)
ANTES QUE SE INICIASSE ESSE RELACIONAMENTO, MAIS PRECISAMENTE EM JANEIRO DE
1974, O SR. MARIO HONORIO ADQUIRIU DA TERRACAP, VIA ESCRITURA PUBLICA DE PROMESSA
DE COMPRA E VENDA, UM LOTE DE TERRAS, SOBRE O QUAL CONSTRUIU CASA RESIDENCIAL,
A QUAL ASSIM HOJE SE SITUA NA QNM 22, CONJUNTO M, CASA 27, CEILÂNDIA NORTE.
COMO SE DESSUME PELO EXAME DO DOCUMENTO ÀS FLS. 94/94V., A ESCRITURA DE
PROMESSA DE COMPRA E VENDA FOI LEVADA A REGISTRO NO 6º OFICIO DE REGISTRO DE
IMÓVEIS DE BRASÍLIA, SOB NUMERO R-1/29.1 11, DATADO DE 27.01.1974.
COM O FALECIMENTO DO SR. MARIO HONORIO E ABERTURA DO INVENTARIO DOS BENS POR
ELE DEIXADOS, ESSE IMÓVEL ESPECIFICO FOI ARROLADO, DENTRE OUTROS, COMO PASSÍVEL
DE MEAÇÃO COM A SUA COMPANHEIRA, AQUI APELADA, RESSALTANDO-SE QUE A
ESCRITURA DEFINITIVA DE COMPRA E VENDA DESSE IMÓVEL ESPECÍFICO FOI LEVADO A
REGISTRO IMOBILIÁRIO EM OUTUBRO DE 2004, A DESPEITO DE SEU PREÇO TOTAL TER SIDO
QUITADO EM 1979, JÁ QUE FINANCIADO EM 60 (SESSENTA) PRESTAÇÕES MENSAIS" (fl. 669, eSTJ
- grifou-se).
Portanto, se o bem foi comprado em 1974 e o pagamento foi parcelado em 5 (cinco) anos (fls. 120-121, eSTJ),
o falecido quitou as últimas parcelas do imóvel em 1979, época em que a recorrida já convivia com
o pai da recorrente.
Contudo, não há referência nos autos de que a ex-companheira tenha contribuído para a aquisição do
imóvel nesse último ano de pagamento, a fim de que sustentasse direito à meação proporcional ao
esforço comprovado.
Segundo a doutrina especializada, "(...) como a presunção de mútua assistência para a divisão igualitária
do patrimônio adquirido durante a união só foi reconhecida pela L. 9.278/96, a tendência é admitir
que, antes de sua vigência, aplicava-se a Súmula 380, havendo a necessidade de prova da participação".
(Manual de Direito das Famílias, Maria Berenice Dias, Revista dos Tribunais, 10ª edição, pág. 268)
Nesse sentido também é a jurisprudência do STJ:
"CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE UNIÃO ESTÁVEL
COM PARTILHA DE BENS. FILHO DO COMPANHEIRO FALECIDO CONTRA A COMPANHEIRA
SUPÉRSTITE. OMISSÕES NÃO VERIFICADAS. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO.
ESPÓLIO. DESCARACTERIZAÇÃO. BENS ADQUIRIDOS ANTES DA LEI N. 9.278/1996. ESFORÇO
COMUM E BENS RESERVADOS. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA.
1. Violação do art. 535 do CPC inexistente, tendo em vista que o Tribunal de origem enfrentou e decidiu,
fundamentadamente, todas as questões vinculadas aos dispositivos referidos, o que satisfaz o
indispensável prequestionamento e afasta qualquer omissão acerca dos mencionados temas.
2. Quanto ao art. 46 do CPC, tal dispositivo refere-se a litisconsórcio facultativo, não a litisconsórcio
passivo necessário.
Por isso, sua eventual ausência não implica nulidade processual.
Ademais, o inciso I do art. 46 do CPC impõe que haja 'comunhão de direitos ou de obrigações
relativamente à lide', o que não ocorre neste processo entre a ré e o espólio. Ao contrário, o espólio tem
direitos, obrigações e interesses antagônicos aos da ré, ora recorrente, que não deseja partilhar
determinados bens, ou seja, não admite que tais bens integrem o espólio nem que sejam partilhados no
inventário.
3. Relativamente ao art. 47 do CPC, tal norma dispõe que haverá litisconsórcio necessário 'quando, por
disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para
todas as partes'. Esse requisito, entretanto, não se encontra caracterizado nos presentes autos,
cabendo destacar que a postulação inicial dirige-se, exclusivamente, contra a recorrente, ré, tendo em
vista que ela é quem supostamente estaria omitindo bens partilháveis. A condenação, assim, nunca se
dará contra o espólio, mas, apenas, em desfavor da ré, que, reitere-se, possui direitos, obrigações e
interesses contrários aos daquele. Não há falar, portanto, em decisão 'de modo uniforme' para a ré e para
o espólio nos presentes autos.
4. Segundo a jurisprudência firmada na QUARTA TURMA, 'a presunção legal de esforço comum na
aquisição do patrimônio dos conviventes foi introduzida pela Lei 9.278/96, devendo os bens amealhados
no período anterior a sua vigência, portanto, serem divididos proporcionalmente ao esforço comprovado,
direto ou indireto, de cada convivente, conforme disciplinado pelo ordenamento jurídico vigente quando da
respectiva aquisição (Súmula 380/STF)'. Isso porque 'os bens adquiridos anteriormente à Lei 9.278/96
têm a propriedade - e, consequentemente, a partilha ao cabo da união - disciplinada pelo
ordenamento jurídico vigente quando respectiva aquisição, que ocorre no momento em que
se aperfeiçoam os requisitos legais para tanto e, por conseguinte, sua titularidade não pode ser alterada
por lei posterior em prejuízo ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito (CF, art. 5, XXXVI e Lei de
Introdução ao Código Civil, art. 6º)' (REsp n. 959.213/PR, Rel. originário Ministro LUIS FELIPE
SALOMÃO, Rel. para acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, DJe de 10.9.2013).
Entendimento mantido pela Segunda Seção no REsp n. 1.124.859/MG, Rel. originário Ministro LUIS
FELIPE SALOMÃO, Rel. para acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, julgado em 26.11.2014.
5. No caso concreto, afastada a presunção disciplinada na Lei n. 9.278/1996, cabe ao autor comprovar
que a aquisição de bens antes da vigência do referido diploma decorreu de esforço comum, direto ou
indireto, entre seu genitor e a ré durante a união estável, sendo vedada a inversão do ônus da prova, sob
pena de violação do art. 333, I, do CPC.
6. Recurso especial provido."
(REsp 1.118.937/DF, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em
24/2/2015, DJe 4/3/2015 - grifou-se)
"RECURSO ESPECIAL. UNIÃO ESTÁVEL. INÍCIO ANTERIOR E DISSOLUÇÃO POSTERIOR À EDIÇÃO
DA LEI 9.278/96. BENS ADQUIRIDOS ONEROSAMENTE ANTES DE SUA VIGÊNCIA.
1. Não ofende o art. 535 do CPC a decisão que examina, de forma fundamentada, todas as questões
submetidas à apreciação judicial.
2. A ofensa aos princípios do direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada encontra vedação em
dispositivo constitucional (art. 5º XXXVI), mas seus conceitos são estabelecidos em lei ordinária (LINDB,
art. 6º). Dessa forma, não havendo na Lei 9.278/96 comando que determine a sua retroatividade,
mas decisão judicial acerca da aplicação da lei nova a determinada relação jurídica existente quando de
sua entrada em vigor - hipótese dos autos - a questão será infraconstitucional, passível de exame
mediante recurso especial. Precedentes do STF e deste Tribunal.
3. A presunção legal de esforço comum na aquisição do patrimônio dos conviventes foi introduzida pela
Lei 9.278/96, devendo os bens amealhados no período anterior à sua vigência, portanto, ser divididos
proporcionalmente ao esforço comprovado, direito ou indireto, de cada convivente, conforme disciplinado
pelo ordenamento jurídico vigente quando da respectiva aquisição (Súmula 380/STF).
4. Os bens adquiridos anteriormente à Lei 9.278/96 têm a propriedade - e, consequentemente, a partilha
ao cabo da união - disciplinada pelo ordenamento jurídico vigente quando respectiva aquisição, que
ocorre no momento em que se aperfeiçoam os requisitos legais para tanto e, por conseguinte, sua
titularidade não pode ser alterada por lei posterior em prejuízo ao direito adquirido e ao ato jurídico
perfeito (CF, art. 5, XXXVI e Lei de Introdução ao Código Civil, art. 6º).
5. Os princípios legais que regem a sucessão e a partilha de bens não se confundem: a sucessão é
disciplinada pela lei em vigor na data do óbito; a partilha de bens, ao contrário, seja em razão do término,
em vida, do relacionamento, seja em decorrência do óbito do companheiro ou cônjuge, deve observar o
regime de bens e o ordenamento jurídico vigente ao tempo da aquisição de cada bem a partilhar.
6. A aplicação da lei vigente ao término do relacionamento a todo o período de união implicaria
expropriação do patrimônio adquirido segundo a disciplina da lei anterior, em manifesta ofensa ao direito
adquirido e ao ato jurídico perfeito.
7. Recurso especial parcialmente provido."
(REsp 1.124.859/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Rel. p/ Acórdão Ministra MARIA ISABEL
GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 26/11/2014, DJe 27/2/2015 - grifou-se)
Desse modo, merece reparo o acórdão de origem, que solucionou a lide em total dissonância com a
jurisprudência desta Corte.
Ante do exposto, dou provimento ao recurso especial.
É o voto.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA
Número Registro: 2012/0104237-9
PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.324.222/DF
Números Origem: 20070310411625 20070310411625RES 411625320078070003 8190575566
81905755660814
PAUTA: 06/10/2015 – JULGADO: 06/10/2015
Relator: Exmo. Sr. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. MÁRIO PIMENTEL ALBUQUERQUE
Secretária: Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA
AUTUAÇÃO
RECORRENTE: JANAINA HONÓRIO FAGUNDES
ADVOGADO: OSCAR ORTIZ JAYME E OUTRO(S)
RECORRIDO: SIRLEI EVANGELISTA DE ASSIS E OUTROS
ADVOGADO: MARIA CUSTODIA SERMOUD FONSECA E OUTRO(S)
ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Sucessões - Inventário e Partilha
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada
nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Terceira Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr.
Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha e Paulo de Tarso
Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator.
(DJe: 14/10/2015)