quarta-feira, 13 de novembro de 2013

É necessária a lavratura de escritura pública para prática de ato de disposição da meação da viúva em favor dos herdeiros

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou o Recurso Especial nº 1.196.992 – MS (REsp), onde se discutiu a necessidade de lavratura de escritura pública para prática de ato de disposição da meação da viúva em favor dos herdeiros. O acórdão teve como Relatora a Ministra Nancy Andrighi e foi, à unanimidade, improvido.

No caso em tela, a recorrente interpôs o REsp em face de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS), que manteve o indeferimento do ato de disposição da integralidade da meação pela viúva, por entender necessária a lavratura de escritura pública para sua efetivação. Para o TJMS, não se trata de herança, mas de patrimônio particular da meeira, não podendo ser realizado por termo nos autos de inventário. A recorrente, por sua vez, afirmou não ter condições de arcar com o pagamento dos emolumentos cartorários necessários à lavratura da escritura pública para dispor da meação em favor dos herdeiros e alegou a existência de jurisprudência do Tribunal de Justiça paulista admitindo a cessão da meação por termo nos autos.

Ao analisar o recurso, a Relatora observou que o acórdão recorrido decidiu pela necessidade de lavratura de escritura pública, uma vez que, a disposição da meação do cônjuge supérstite é ato inter vivos, não se confundindo com a sucessão causa mortis. Ademais, a escritura pública é condição essencial para validade de alguns atos, conforme art. 108 do Código Civil. Desta forma, a Ministra entendeu que, embora o art. 1.806 do Código Civil admita que a renúncia à herança possa ser formalizada mediante escritura pública ou termo judicial, é necessário apontar a diferença entre os institutos: na herança, a posse ou a propriedade dos bens do de cujus transmite-se aos herdeiros quando da abertura da sucessão; na meação, o patrimônio é de propriedade da viúva em decorrência do regime de bens do casamento, independendo da abertura da sucessão, podendo ser objeto de ato de disposição pela viúva a qualquer tempo, seja em favor de herdeiros ou terceiros.

Diante do exposto, a Relatora concluiu que o ato de disposição patrimonial da recorrente, caracterizado como a renúncia da sua meação em favor dos herdeiros, não pode ser equiparada à renúncia da herança, tampouco pode ser confundido com a cessão de direitos hereditários, configurando-se como uma verdadeira doação, inclusive, para fins tributários. Assim, a doação, nos termos do art. 541 c/c art. 108, ambos do Código Civil, deve ser formalizada por escritura pública, ainda que a recorrente não possua recursos financeiros para arcar com o pagamento dos emolumentos.

Íntegra da decisão

Dados Básicos
Fonte: 1.196.992
Tipo: Acórdão STJ
Data de Julgamento: 06/08/2013
Data de Aprovação Data não disponível
Data de Publicação:22/08/2013
Estado: Mato Grosso do Sul
Cidade:
Relator: Nancy Andrighi
Legislação: Arts. 108, 541, 1.793 e 1.806 do Código Civil.

Ementa
SUCESSÕES. RECURSO ESPECIAL. MEAÇÃO. ATO DE DISPOSIÇÃO EM FAVOR DOS HERDEIROS. DOAÇÃO.
ATO INTER VIVOS. FORMA. ESCRITURA PÚBLICA. 1. Discussão relativa à necessidade de lavratura de
escritura pública para prática de ato de disposição da meação da viúva em favor dos herdeiros. 2. O ato
para dispor da meação não se equipara à cessão de direitos hereditários, prevista no art. 1.793 do
Código Civil, porque esta pressupõe a condição de herdeiro para que possa ser efetivada. 3. Embora o
art. 1.806 do Código Civil admita que a renúncia à herança possa ser efetivada por instrumento público
ou termo judicial, a meação não se confunde com a herança. 4. A renúncia da herança pressupõe a
abertura da sucessão e só pode ser realizada por aqueles que ostentam a condição de herdeiro. 5. O ato
de disposição patrimonial representado pela cessão gratuita da meação em favor dos herdeiros
configura uma verdadeira doação, a qual, nos termos do art. 541 do Código Civil, far-se-á por Escritura
Pública ou instrumento particular, sendo que, na hipótese, deve ser adotado o instrumento público, por
conta do disposto no art. 108 do Código Civil. 6. Recurso especial desprovido.

Íntegra
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
RECURSO ESPECIAL Nº 1.196.992 - MS (2010/0104911-6)
RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE: MARIA JOSÉ DE SOUZA ADVOGADO: OLGA LEMOS CARDOSO DE MARCO - DEFENSORA PÚBLICA
INTERES.: BIANOR ALVES PEREIRA - ESPÓLIO
REPR. POR: MARIA GIOVANNA MARANZANA - INVENTARIANTE E OUTRO
INTERES.: JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA CÍVEL DE TRÊS LAGOAS - MS
EMENTA: SUCESSÕES. RECURSO ESPECIAL. MEAÇÃO. ATO DE DISPOSIÇÃO EM FAVOR DOS HERDEIROS.
DOAÇÃO. ATO INTER VIVOS. FORMA. ESCRITURA PÚBLICA.
1. Discussão relativa à necessidade de lavratura de escritura pública para prática de ato de disposição da
meação da viúva em favor dos herdeiros.
2. O ato para dispor da meação não se equipara à cessão de direitos hereditários, prevista no art. 1.793
do Código Civil, porque esta pressupõe a condição de herdeiro para que possa ser efetivada.
3. Embora o art. 1.806 do Código Civil admita que a renúncia à herança possa ser efetivada por
instrumento público ou termo judicial, a meação não se confunde com a herança.
4. A renúncia da herança pressupõe a abertura da sucessão e só pode ser realizada por aqueles que
ostentam a condição de herdeiro.
5. O ato de disposição patrimonial representado pela cessão gratuita da meação em favor dos herdeiros
configura uma verdadeira doação, a qual, nos termos do art. 541 do Código Civil, far-se-á por Escritura
Pública ou instrumento particular, sendo que, na hipótese, deve ser adotado o instrumento público, por
conta do disposto no art. 108 do Código Civil.
6. Recurso especial desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA Turma do Superior
Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por
unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)
Relator(a). Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Sidnei Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e
Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 06 de agosto de 2013 (Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI, Relatora
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora): Cuida-se de Recurso Especial interposto por MARIA JOSÉ DE SOUZA, com base no art. 105, III, “c”, da
Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJ/MS).
Ação: arrolamento sumário dos bens deixados por BIANOR ALVES PEREIRA, em razão de seu
falecimento.
Decisão: indeferiu o ato de disposição da integralidade da meação pela viúva MARIA JOSÉ DE SOUZA,
nos autos do arrolamento, por entender que não se trata de herança, mas de patrimônio particular da
meeira, perfazendo ato não afeto ao juízo sucessório, sendo, portanto, necessária a lavratura
deescritura pública para sua efetivação.
Acórdão: manteve a decisão unipessoal que negou provimento ao recurso de agravo de instrumento
interposto por MARIA JOSÉ DE SOUZA, para reafirmar a necessidade de escritura pública que a viúva
disponha da sua meação em favor dos herdeiros, o que não pode ser feito por termo nos autos
doinventário, por se tratar de ato de disposição patrimonial inter vivos, nos termos da seguinte ementa
(e-STJ fls. 86/92):
EMENTA – AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO – DECISÃO QUE NEGOU SEGUIMENTO DE PLANO AO
RECURSO – AGRAVO REGIMENTAL QUE NENHUM ELEMENTO NOVO TROUXE QUE LEVASSE O RELATOR
A SE RETRATAR DA DECISÃO PROLATADA – RECURSO NÃO PROVIDO.
Mantém-se a decisão que nega seguimento de plano, se no agravo regimental o recorrente nenhum
elemento novo trouxe, que pudesse levar o relator a se retratar da decisão prolatada.
Recurso especial: interposto por MARIA JOSÉ DE SOUZA com base na alínea “c” do permissivo
constitucional (e-STJ fls. 97/105), alega a existência de dissídio jurisprudencial entre o acórdão recorrido
e o acórdão proferido pelo TJ/SP, no agravo de instrumento n.º 468.409-4/5-00, em sede do qual teria
sido reconhecida a possibilidade de renúncia à meação por termo dos autos, não se fazendo necessária
a lavratura de escritura pública perante o Tabelião.
Exame de admissibilidade: o recurso foi admitido na origem pelo TJ/MS (e-STJ fls. 118/120).
É o relatório.
VOTO
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora):
Cinge-se a controvérsia a analisar a possibilidade da viúva renunciar sua meação em favor dos herdeiros,
por termo nos autos de inventário, dispensando-se a lavratura de escritura pública.
I – Das formalidades relacionadas ao ato de disposição da meação do cônjuge em favor dos herdeiros. O acórdão recorrido afirma a necessidade de escritura pública porque a “disposição da meação do
cônjuge supérstite é ato de iniciativa inter vivos e não se confunde com a sucessão causa mortis.
Ademais, a escritura pública é a forma prescrita pela lei como condição essencial para validade de
alguns atos, e para tais, torna-se ele imprescindível, nos termos do art. 108 do CC” (e-STJ fl. 90).
Aduz a recorrente, todavia, que não tem condições de arcar com o pagamento dos emolumentos
cartorários necessários à lavratura de instrumento público para dispor da meação em favor dos
herdeiros, e que há jurisprudência do TJ/SP admitindo a cessão da meação por termo judicial nos autos
do inventário.
O acórdão paradigma apontado pela recorrente, de fato, reconheceu a possibilidade da cessão da
meação se dar por termo nos autos, ao equipará-la, de certa maneira, à renúncia da herança.
Para corroborar sua conclusão, o TJ/SP faz remissão à lição de Euclides Benedito de Oliveira e Sebastião
Luiz Amorim, no sentido de que “embora inconfundível com a renúncia à herança, dela se aproxima ao
ponto em que implica efetiva cessão de direitos, de modo que utilizáveis os mesmo instrumentos para
sua formalização. Com efeito, o direito de cada herdeiro, a título de posse ou propriedade, sobre sua
parte ideal na herança, antes da partilha é juridicamente equivalente ao do cônjuge sobrevivo sobre a
metade ideal do patrimônio a partilhar” (Inventários e Partilhas – Direito das Sucessões, 16ª ed., Leud:
São Paulo, 2003, p. 64/65) (e-STJ fl. 19) (sem destaque no original).
Embora o art. 1.806 do Código Civil, de fato, admita que a renúncia à herança possa ser efetivada por
instrumento público ou termo judicial, é relevante apontar uma sensível diferença entre os institutos:
enquanto na herança, a posse ou propriedade dos bens do de cujus transmite-se aos herdeiros quando
e porque aberta a sucessão (princípio do saisine), na meação, o patrimônio é de propriedade da viúva
em decorrência do regime de bens do casamento, independe da abertura da sucessão, e pode ser
objeto de ato de disposição pela viúva a qualquer tempo, seja em favor dos herdeiros ou de terceiros.
Em síntese, a renúncia da herança pressupõe a abertura da sucessão e a condição de herdeiro, situações
que não se aplicam à viúva-meeira. Nas palavras de Francisco José Cahali e Giselda Maria Fernandes
Novaes Hironaka:
Representando abdicação do direito à herança, só se admite a renúncia quando da abertura da
sucessão, oportunidade em que nasce o direito hereditário. O repúdio prematuro, ou promessa de
renúncia, ainda que formal, promovidos antes do falecimento, não tem validade jurídica, até
porque implicariam em ilegal pacto sucessório” (Direito das Sucessões, 4ªed., São Paulo: RT, 2012, p.
89).
Assim, na hipótese, o ato de disposição patrimonial da recorrente, caracterizado como a renúncia da sua
meação em favor dos herdeiros, não pode ser equiparada renúncia da herança. Da mesma forma, ele não se confunde com a cessão de direitos hereditários, prevista no art. 1.793 do
Código Civil, porque esta também pressupõe a condição de herdeiro do cedente. Note-se, por oportuno,
que a própria cessão de direitos hereditários exige a lavratura de escritura pública para sua efetivação,
não havendo porque se prescindir dessa formalidade no que tange à cessão da meação.
Com efeito, verifica-se que ato de disposição patrimonial pretendido pela recorrente, representado pela
cessão gratuita da sua meação em favor dos herdeiros do falecido, configura uma verdadeira doação,
inclusive para fins tributários, como, aliás, já foi consignado por esta Corte, no Ag 1165370, Rel.Min. Luiz
Fux, DJe de 18.09.2009.
E a doação, por sua vez, nos termos do art. 541 do Código Civil, far-se-á por Escritura Pública ou
instrumento particular, sendo que, na hipótese, deve ser adotado o instrumento público, por conta do
disposto no art. 108 do Código Civil.
Embora seja compreensível a dificuldade da recorrente em arcar com o pagamento dos custos
necessários à lavratura de uma escritura pública, perante o Tabelião, para poder transferir aos seus
filhos a propriedade da metade do imóvel inventariado, que lhe pertence em razão da meação, não há
possibilidade de se prescindir das formalidades expressamente previstas na legislação civil.
Forte nestas razões, NEGO PROVIMENTO ao recurso especial.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA
Número Registro: 2010/0104911-6
PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.196.992/MS
Números Origem: 20090280306 20090280306000100 20090280306000101 21090051530
PAUTA: 06/08/2013 – JULGADO: 06/08/2013
Relatora: Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI
Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO
Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. JOSÉ BONIFÁCIO BORGES DE ANDRADA
Secretária: Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA
AUTUAÇÃO
RECORRENTE: MARIA JOSÉ DE SOUZA
ADVOGADO: OLGA LEMOS CARDOSO DE MARCO - DEFENSORA PÚBLICA INTERES.: BIANOR ALVES PEREIRA - ESPÓLIO
REPR. POR: MARIA GIOVANNA MARANZANA - INVENTARIANTE E OUTRO
INTERES.: JUÍZO DE DIREITO DA 1A VARA CÍVEL DE TRÊS LAGOAS - MS
ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Sucessões - Inventário e Partilha
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta
data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a).
Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Sidnei Beneti, Paulo de
Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com a Sra. Ministra Relatora.
(D.J.E. de 22.08.2013)
Fonte: Base de dados de Jurisprudência do IRIB

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