sábado, 14 de setembro de 2013

Equiparação da transferência do controle acionário do locatário à cessão da locação


Sempre se entendeu, com fundamento no atual art. 13 da Lei 8.245/1991, que a cessão da locação depende de anuência do locador.

Aliás, a redação do referido dispositivo legal não deixa qualquer margem de interpretação: “Art. 13. A cessão da locação, a sublocação e o empréstimo do imóvel, total ou parcialmente, dependem do consentimento prévio e escrito do locador. § 1.º Não se presume o consentimento pela simples demora do locador em manifestar formalmente a sua oposição. § 2.º Desde que notificado por escrito pelo locatário, de ocorrência de uma das hipóteses deste artigo, o locador terá o prazo de 30 (trinta) dias para manifestar formalmente a sua oposição.”

A jurisprudência, inclusive, em respeito ao requisito legal, exige que a cessão do fundo de comércio seja precedida da anuência do locador sob pena de ineficácia e conseguinte infração contratual:

“TJSP, Ap. sem Revisão 962280800, 35.ª Câm., j. 16.04.2007, rel. Des. Clóvis Castelo, registro 18.04.2007: “Locação comercial. Cessão. Fundo de comércio. Anuência. Locador. A ausência de consentimento expresso do locador, pactuado no contrato, implica na clandestinidade da sublocação da cessão do fundo de comércio celebrada entre locatárias-cedentes e cessionários, portanto, não gera efeitos jurídicos em relação ao locador (LI, art. 13)”.

Sabendo disto, expediente muito comum utilizado por locatários que buscam burlar a proibição de cessão do contrato de locação sem a anuência do locador é a cessão das quotas ou do controle da sociedade locatária.

Para evitar tais situações a Lei 12.112/2009 continha previsão de acréscimo do § 3º ao art. 13 da Lei do Inquilinato, para equiparar a cessão de cotas à cessão da locação, tornando, também nesta hipótese, necessária a anuência do locador sob pena de infração legal e despejo, o que faria nos seguintes termos: “§ 3.º Nas locações não residenciais, equipara-se à cessão da locação qualquer negócio jurídico que importe na transferência do controle societário do locatário pessoa jurídica. (vetado).”

De acordo com a justificação do projeto: “O texto inserido no novo § 3.º do art. 13 reforça o caráter personalíssimo também das locações não residenciais, usualmente celebradas com pessoas jurídicas. Busca-se evitar que manobras societárias permitam ao locatário transferir, indiretamente, a locação a terceiros, burlando o legítimo direito de o locador escolher a quem deseja locar seu imóvel. Observe-se que já é da tradição do direito brasileiro que a cessão da locação só é possível quando autorizada pelo locador, conforme estabelece o caput do artigo.”

Em resumo, caso fosse mantida a redação aprovada no Senado Federal, o expediente astucioso para embair a média argúcia seria considerado expressamente como cessão da locação.

Todavia, a alteração proposta foi vetada. Eis as razões do veto: “Não é possível confundir a estruturação societária da pessoa jurídica, que, independentemente da formação do quadro de sócios, tem personalidade jurídica própria, com o contrato de locação havido entre o locador e a própria pessoa jurídica. Ou seja, em outras palavras, o contrato de locação firmado entre locador e pessoa jurídica não guarda qualquer relação de dependência com a estruturação societária de pessoa jurídica locatária, considerando, essencialmente, a distinção da personalidade jurídica de cada um (sócios e a própria pessoa jurídica), conferida pelo ordenamento jurídico pátrio para cada um dos entes. Além do mais, cabe registrar que exigências assim impediriam ou dificultariam sobremaneira operações societárias de transferência de cotas sociais ou ações de sociedades empresárias, tal como, exemplificativamente, a incorporação, fusão ou aquisição da participação majoritária de grandes empresas.”

Nada obstante o veto, caso o locador pretenda regular a questão, entendo que deverá fazê-lo por cláusula contratual que disporá sobre a equiparação da cessão das quotas sociais à cessão da locação, de tal sorte a demandar a autorização do locador.

Sugiro a seguinte redação: “A cessão de quotas da sociedade locatária é equiparada, pela vontade das partes contratantes, à cessão da locação, obrigando-se a locatária, sob pena de infração contratual e despejo, a colher a anuência expressa e por escrito do locador para continuidade da locação com a nova composição societária.”

Nesta eventualidade, com a previsão no contrato, caso não haja a anuência do locador, tratar-se-á de infração contratual pela locatária e permitirá o despejo.

Em outras palavras, a cessão das quotas será, em razão de previsão contratual, cessão da locação por equiparação. Com isso, por se tratar propriamente de infração contratual (art. 9.º, II), ensejará ação de despejo que deve ser dirigida ao locatário original que, constituindo pessoa jurídica, será citada na pessoa de seus representantes legais atuais.

Qualquer direito da sociedade locatária em face dos anteriores sócios será resolvida em ação autônoma, não cabendo discussão na ação de despejo por infração contratual movida pelo locador em face da sociedade locatária.

Outrossim, é preciso observar, nos termos do art. 51, § 1.º da Lei do Inquilinato, que o direito assegurado aos locatários de propor ação renovatória, quando cabível, poderá ser exercido pelos seus cessionários ou sucessores.

Na verdade, o titular clássico da ação renovatória é o locatário, titular do fundo de comércio, seja ele pessoa física (empresário individual) ou jurídica.

Todavia, a pretensão renovatória poderá também ser exercida pelo cessionário, que é aquele a quem o locatário transfere a locação.

Mas de que cessão está tratando a lei, quando trata da ação renovatória e da legitimidade para sua propositura?
Cediço que a cessão poderá ser do fundo de comércio, que não está abarcada pela restrição do art. 13 – e nem poderia sê-lo –, inexigindo anuência do locador.

Hipótese diversa é a cessão da locação, que exige anuência expressa do locador. Neste sentido: “Sucessão. Fundo de comércio. Distingue-se sucessão na titularidade do fundo de comércio da sucessão na posição do contratante locatário. São negócios jurídicos diferentes, não se confundem nem são interdependentes. Para a primeira, dispensável a concordância expressa do locador. Para a segunda, a anuência é obrigatória. Não havendo consentimento expresso do locador na cessão da locação, ela não se presume” (2.º TAC-SP, Ap s/ revisão 574938000, São José dos Campos, 10.ª Câm., j. 05.04.2000, rel. Des. Irineu Pedrotti, registro 07.04.2000).

É verdade que a cessão pode ser autorizada no contrato e, nessa hipótese, por evidente, autorizada estará.

Entretanto, mister se faz acentuar que, na cessão da locação desprovida da cessão do fundo de comércio, o locatário não poderá pleitear a renovação, na exata medida em que não dispõe de fundo de comércio a ser protegido.

Igualmente, o cessionário apenas do fundo de comércio não poderá exercer a renovatória sem que tenha obtido a cessão da locação, vez que não é locatário, posto que não se reconhece a cessão.

Destarte, aí está mais um motivo para que o titular de fundo de comércio e locação protegida pela possibilidade de ação renovatória tome a cautela de colher a anuência do locador antes de operar a cessão da locação, ainda que seja previamente por cláusula contratual.

Autor: LUIZ ANTONIO SCAVONE JUNIOR
Fonte: http://www.scavone.adv.br/index.php?Equiparacao-da-transferencia-do-controle-acionario-do-locatario-a-cessao-da-locacao

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